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Cadê meu par ideal?

A busca pelo amor no mundo dos millennials envolve aplicativos de relacionamento, idealização e questionamentos

Quanto mais eu pesquiso, leio e ouço sobre o amor, menos eu sinto ter certeza de qualquer coisa a respeito dele. Mas isso eu posso afirmar: as pessoas, mesmo não entendendo direito o que ele é, ou como funciona, ou qualquer coisa específica, buscam o amor. A promessa de felicidade é empolgante, mas a procura por um sentimento que corresponda às expectativas pode se mostrar frustrante. Em meio à pressão da sociedade e às construções psicológicas do amor ideal, os jovens procuram lidar com esse turbilhão por meio da ferramenta que dominam: a internet.

Porém, as dúvidas e inseguranças não diminuem quando abrem o aplicativo. Dou like? Será que essa pessoa está mentindo? Eu sou bom o suficiente? Será que queremos a mesma coisa? Estou perdendo meu tempo? E o principal: dá mesmo para encontrar o amor num aplicativo?

Marco Aurélio Dias, de 30 anos, queria conhecer gente. Depois de assumir sua sexualidade para a família, o jovem percebeu que isso não era o suficiente: ele sabia bem quem era, mas não tinha um círculo de amigos com quem compartilhasse muito em comum. O ponto era: como conhecer gente nova e diferente sem deixar de ser quem ele é um cara caseiro, tranquilo, que gosta de sair para comer e ir no cinema? Então surgem os aplicativos, não especificamente para um relacionamento romântico de início, mas para conversar com pessoas.

E funcionou. Marco conheceu gente com quem fez amizade, saiu com alguns meninos e fez bons amigos. Porém, chegou uma hora em que não estava mais dando certo, e Marco queria tentar um romance, mas os aplicativos não pareciam ser o que procurava. “É como se fosse um cardápio, é bem assim: você se interessa em um primeiro momento pela foto inicial. Só que isso dá abertura para outras pessoas fazerem coisas que não são legais. A maioria geralmente já tem um envolvimento, ou não está afim de conversar como era meu objetivo”.

Então veio o Tinder. “Por que eu não entrei no Tinder de cara? Porque é muito exposto, você vincula suas redes sociais.” Marco deixa bem claro que seu perfil era diferente: um texto “muito chato”, poético, engraçado, e sua foto não o expunha tanto. “É isso e pronto. Quem quiser que me aceite do jeito que eu sou.” Dessa vez, ele vinculou sua conta do Instagram, e vários caras vieram falar com ele pela rede social. Marco descobriu que tinham “dado match”, nome dado no aplicativo para quando ambos se interessam um pelo outro. No Tinder, ele  não tinha gostado dos perfis, contudo, no Instagram, acabaram conversando. “Existem algumas coisas no perfil que te distanciam. É como uma primeira impressão mesmo. Muitas vezes isso [julgamento a primeira vista] gera uma coisa negativa!”

“Bom, eu contei tudo isso para chegar no Tiago”. O Tiago apareceu e a história é das boas: o pai dele sofreu um infarto e foi levado a um hospital na rua onde Marco trabalhava. Quando o aplicativo atualizou a localização, lá estava o perfil, no celular do Tiago. Eles deram match e começaram a conversar conversaram muito, mas a piada não morreu: “o seu pai estava infartando e você estava procurando namoro? Fala sério, né!”

Marco gostou das fotos do Tiago, mas o que mais o encantou foi a sinceridade. Eles conversaram sobre vários assuntos, desde experiências, família, trabalho, da vida, até de ETs e universo quântico. E aí, bateu. Se encontraram uma, duas vezes. Ficaram. Conversaram mais. Estão namorando há dois anos.

Quando perguntado sobre as diferenças entre começar um relacionamento por aplicativo ou pessoalmente, Marco é direto: “Eu demoraria bem mais [pessoalmente]. Esse monte de caras diferentes faz com que você forme a sua opinião sobre o que quer.” Com o aplicativo, ele conheceu o Tiago, que mora longe. Sem, para Marco, você fica restrito aos vínculos mais próximos, ao seu círculo de amigos.

Para obter um panorama maior sobre o imaginário em torno dos aplicativos de relacionamento, fiz uma pesquisa com noventa pessoas. Quando perguntados sobre os problemas ou limitações enfrentados, as respostas foram variadas, mas convergentes em muitos pontos.

“A maior parte das pessoas não quer o mesmo tipo de relacionamento que eu.” “Eram muito superficiais e o fato das pessoas só conversarem comigo ou não por causa da minha aparência me deixava desconfortável.” “Conhecer no app cria a expectativa de que é só mais uma pessoa querendo algo rápido, e não uma relação que tem potencial para ser legal.” “Não saber as verdadeira intenções das pessoas e nem se elas eram daquele jeito que diziam ser.” “Julgamento excessivo.” “Falta de momentos físicos na relação.” “Manter uma conversa on-line.”

Superficialidade, possibilidade de mentiras, desconforto. A quantidade de obstáculos enfrentados pelos usuários ainda restringe o uso das ferramentas e contribui para o estigma que possuem na sociedade.

 

 

Gabriela Torres, de 19 anos, começou a usar aplicativos de namoro no segundo semestre de 2017. Pouco tempo depois, conheceu um cara e marcou de sair com ele. O encontro foi ótimo, como se o tivesse conhecido através de um amigo, mas depois acabou não dando certo.

Porém, ela não desistiu. Continuou no app e conheceu o Guilherme, com quem começou a conversar. Depois de um mês, se encontraram e começaram a sair. No início, o contato era pelo aplicativo, mas depois mudaram para o WhatsApp. Estudaram no mesmo lugar em 2018 e começaram a se ver todos os dias. Depois de um tempo, virou namoro.

Quando indagada sobre a interferência do aplicativo no início do relacionamento, a jovem foi rápida: “não interferiu, de verdade. Eu achei bem tranquilo. É como qualquer outro começo de relacionamento, porque você tem aquela parte meio estranha de não saber como conversar com a pessoa.”

 

Não é tão novo assim

A tecnologia dos aplicativos pode ser recente, mas a ideia por trás não. Desde que os relacionamentos existem, há também a presença de locais onde as pessoas buscam por parceiros de uma maneira mais direta e pragmática. Na Inglaterra do século 19, os bailes da nobreza onde as jovens buscavam maridos eram tradicionais e o padrão. Os livros de romance de Jane Austin, como Orgulho e Preconceito, tal como os de Julia Quinn, famosa pela série Os Bridgertons, ilustram muito bem o fenômeno. Mesmo que inicialmente não tivessem como premissa a busca por companheiros, era clara a intenção dos bailes para a alta sociedade.

Depois, houve o surgimento das agências casamenteiras e dos anúncios de relacionamentos em jornais, onde as pessoas colocavam suas características e o que queriam em um parceiro, com o objetivo de encontrar um namoro ou casamento.  Com a internet, essas situações migraram para a rede, e os chats, fóruns e sites de relacionamentos se tornaram comuns. Atualmente, inclusive, é recorrente encontrar pessoas que iniciaram seus relacionamentos de forma totalmente digital, e assim fizeram por meses e até anos. A figura do catfish, alguém que finge ser quem não é na rede, emergiu com força nesse contexto, gerando essa sensação de insegurança ainda presente nos aplicativos.

As redes sociais entraram no século 21 com força, e foi só questão de tempo até serem utilizadas para a busca por romance. Daí, juntar rede social com site de relacionamento foi natural, originando os apps de namoro.

Carlos Henrique entrou nos aplicativos através da indicação de alguns amigos, pois ele mesmo não gostava muito da ideia, sempre preferiu conhecer gente nova pessoalmente. Acabou cedendo pela facilidade do contato nas ferramentas. “Porém, ao mesmo tempo que é fácil, é difícil, porque as pessoas são complicadas, enrolam muito para sair, depende muito do que cada um quer.” E, segundo Henri, como prefere ser chamado, cada aplicativo é diferente do outro. Em alguns, as pessoas buscam mais por sexo, enquanto em outros a busca por relacionamentos sérios é mais marcante. “É mais comum coisas do tipo: vamos sair, vamos ficar e… tchau!”

Para ele, ainda é um pouco diferente conhecer as pessoas on-line. Henri acha que, quando conhecemos alguém através de amigos, o contato é mais natural, porque já faz parte do seu círculo. Já nos aplicativos, você conversa com um “estranho, e reza para não ser um assassino!”, brinca.

O jovem está buscando um relacionamento sério, mas enquanto isso também aproveita para conhecer pessoas quem sabe um desses caras é o cara que ele está procurando? Ele diz que usa vários aplicativos para encontrar possíveis candidatos, e inclusive se encontrou com vários deles, desenvolvendo algumas amizades que valeram a pena. Porém, ainda é difícil achar alguém que realmente dê certo, por diversos fatores.

Segundo Henri, é difícil encontrar quem queira o mesmo que ele. Enquanto alguns buscam um namoro, outros muitos querem relações mais passageiras, e outros ainda não são verdadeiros sobre o que procuram. Além disso, sempre tem o medo de a pessoa do outro lado não ser quem diz que é. Henri diz que costuma tomar muito cuidado, conversar bastante antes, pesquisar nas redes sociais e, principalmente, falar no telefone, o que passa muita segurança para ele.

Quando conhece alguém no aplicativo, o jovem gosta de marcar rápido um encontro pessoalmente. Senão, acaba virando um ciclo onde as pessoas conversam por um tempo, não saem para se encontrar, a conversa morre e acaba aí ou então saem uma vez e só. Esse modelo não funciona para ele, já que está procurando um relacionamento duradouro.

“A vantagem é que você consegue encontrar pessoas muito diferentes e que curtem outras coisas. Mas isso também complica um pouco, porque você acaba demorando para conhecer a pessoa de verdade. Mesmo assim, eu acho que é possível, já vi casos em que começaram assim, ficaram e deu certo.”

 

 

Mesmo sendo tão comuns atualmente, os aplicativos de relacionamento carregam um estigma muito forte. É fácil encontrar, por exemplo, pessoas que façam julgamentos sobre o tipo de usuários dos apps e sobre as relações teoricamente buscadas nessas plataformas. A própria premissa de “aplicativo de namoro” é questionada, pois muitos acreditam que tais ferramentas só proporcionam relações passageiras, líquidas, com mais apelo sexual, ao invés de relacionamentos amorosos.

Além disso, a ideia de que estar nos aplicativos seria estar desesperado por alguém é recorrente, gerando uma visão pessimista e constrangedora para alguns usuários, que passam a se sentir constrangidos em revelar que usam essas ferramentas.

Por causa dessa opinião generalizada, casais que se conheceram através dos aplicativos muitas vezes sentem vergonha de contar isso para a família e os amigos. Isabela Mendes, de 19 anos, começou a namorar com Matheus, de 20, pelo Tinder. Ela conta que, no início, disse para as pessoas que havia conhecido o namorado pelo Facebook, e fez isso porque sentiu vergonha. Segundo ela, mesmo sendo uma rede social, o Facebook não possui a mesma carga negativa que o Tinder, e pareceu mais adequado para um primeiro momento por não querer sofrer julgamentos.

Isabela começou a usar o aplicativo por auto estima. Ela diz que, assim como grande parte dos jovens, precisava se sentir mais querida, que algo a preenchesse, e com o seu namorado foi do mesmo jeito. Eles conversavam com uma pessoa, depois com outra, nada muito sério. Nada nunca foi para frente. Até que a Isa e o Matheus deram match e ele passou seu whatsapp, mas a garota acabou não ligando muito. Depois de um tempo, o garoto insistiu: “me chama que eu quero falar com você!”. Então ela chamou.

Isso foi no início de 2017. Isabela mora em Jundiaí, enquanto Matheus é de Campo Limpo Paulista, e a conversa foi dando realmente certo. Eles descobriram várias coisas em comum e marcaram de se encontrar. Desde então, estão namorando. Segundo a Isa, “foi muito rápido! A gente já tinha tido algumas outras experiências na vida, mas nada muito sério, então estávamos no Tinder do tipo: ‘ah, se der deu, se não der, ok também. E deu certo!”. A jovem ainda completa: “tudo isso por um aplicativo! Se não fosse o Tinder, a gente não teria se encontrado, porque temos convívios e amizades muito diferentes”.

Isabela e Matheus, namorados desde 2017 que se conheceram no Tinder [Foto: Acervo pessoal]

Sobre a interferência do aplicativo no namoro, a garota diz que foi diferente pelo fato de eles terem começado do zero, sem “pré conceitos” de ambos os lados, não sabiam como era a personalidade um do outro. Talvez, segundo ela, se tivessem se conhecido pessoalmente, a Isa não teria se atraído tanto pelo Matheus, e vice versa, pois ela é bem extrovertida, enquanto ele é mais tímido. Talvez eles nunca tivessem iniciado uma conversa. Graças ao aplicativo, o relacionamento foi uma surpresa. “Uma surpresa muito boa!”, disse  Isabela.

Alguns pontos em comum podem ser observados entre as diversas experiências com os aplicativos. Auto estima é um deles. Além da Isabela e do Matheus, o Marco também falou sobre o tema. “Também tem a ver com auto estima, né? Eu acho que a maioria das pessoas que vai para os aplicativos é justamente por causa disso, não tem aquela segurança, o virtual te favorece nesse sentido, te dá tempo, te dá referência”.

Além disso, o medo das mentiras entre os usuários é recorrente em todas as entrevistas. “É um risco muito grande. Eu ouvi caras que já sofreram violência, meu namorado já foi roubado em encontros, então é perigoso.”, disse Marco.

Porém, outro ponto importante é que as pessoas acreditam, sim, que é possível ter um relacionamento sério começando através de aplicativos de namoro sem grandes interferências.

 

O par ideal

quando você começa a amar uma pessoa nova

dá vontade de rir porque o amor é indeciso

lembra de quando você tinha certeza

que da última vez era a pessoa certa

e agora olha você aí

redefinindo a pessoa certa de novo”

– um novo amor é um presente

Rupi Kaur

Os aplicativos de relacionamento contribuíram para a disseminação da ideia de match, mas esse conceito se origina em um universo mais amplo. Resumindo, o match, no contexto dos aplicativos, está associado ao que conhece-se como par ideal, quando as duas pessoas se interessam uma pela outra por supostamente haver uma boa combinação entre suas características.

O programa Are You The One, transmitido pela MTV, também trabalha com uma premissa relacionada: “se o seu par ideal estivesse na sua frente, você saberia identificá-lo?”. Nele, homens e mulheres são confinados em uma casa com o objetivo de identificar aquele que foi determinado como seu par ideal. Porém, embora trabalhe com essa ideia, o próprio programa não costuma acertar os casais que dão certo na prática, e os pares tidos como ideais raramente ficam juntos.

Apesar de ser recorrente, a configuração do que tornaria duas pessoas um par ideal é nebulosa — sem falar na contestação da própria existência deste. A questão do contraste entre as expectativas e a realidade na busca pelo parceiro ideal é um tema central nessa discussão.

A imagem de um companheiro romântico idealizado é propagada culturalmente e reforçada em produtos como livros, novelas e filmes. O imaginário das pessoas é impregnado com essa versão dos relacionamentos que nem sempre corresponde à verdade, pelo contrário. Na maioria das situações, as expectativas criadas são inalcançáveis, gerando frustração.

É comum encontrar esse sentimento generalizado com a realidade amorosa. Ao mesmo tempo, comportamentos não saudáveis e relacionamentos abusivos tendem a ser romantizados e tratados como normalidade, uma vez que os ideais propagados são irreais. Assim, os desvios se tornam aceitáveis e perdem importância.

Para além dos aplicativos

A alma gêmea é um conceito relacionado à busca pelo par ideal e aparece em diversas correntes filosóficas, esotéricas e religiosas. Platão, em seu O Banquete de Platão, coloca sob a voz de Aristófanes um dos mais conhecidos discursos sobre o amor e as almas gêmeas. Fala sobre a existência de três tipos de seres humanos no passado: o masculino masculino, com origem no Sol; o feminino feminino, com origem na Terra; e o feminino masculino, conhecido como andrógino, com origem na Lua. Por esses humanos serem muito fortes, os deuses do Olimpo, sentindo-se ameaçados, resolveram puni-los. Zeus, então, decidiu que os separaria ao meio, originando assim o umbigo como cicatriz. Depois, jogou-os, agora incompletos, na Terra.

As metades, então separadas, passam a representar os casais ideias. As andróginas são as metades do amor heterossexual, enquanto as de gêneros semelhantes são do amor homossexual. Até os dias de hoje, as pessoas vagariam pelo planeta em busca de suas metades — ou almas gêmeas — das quais foram separadas no passado, para que assim possam conquistar a plenitude de felicidade e força. Segundo o texto, ainda, quando se reencontram, a sensação de intimidade e alegria se apresenta para os indivíduos, gerando a identificação dos pares.

A Cabala, doutrina derivada do judaísmo, também possui mitos relacionados à existência de almas gêmeas. Para essa linha de pensamento, quarenta dias antes de Deus criar a humanidade, surgiu a energia que fez com que todos os humanos tivessem almas gêmeas. A doutrina explica que o homem e a mulher, quando criados por Deus, habitavam um mesmo corpo, que foi cortado ao meio soltando as duas metades incompletas no mundo. Então, as pessoas passam a vida toda buscando a sua outra metade. Para os cabalistas, a relação sentimental desenvolvida com o parceiro ideal é uma das coisas mais importantes no mundo, assim como não existe maior satisfação do que estar com essa pessoa que o impulsiona.

Uma lenda oriental milenar, conhecida como Akai Ito, ou o Fio Vermelho do Destino, ou ainda a Lenda do Fio Vermelho, também trabalha com ideia semelhante. Uma das versões diz que quando a pessoa nasce, os deuses atam um fio vermelho ao seu tornozelo que a conecta à outra, destinada a ser sua alma gêmea. Em uma das versões, a linha vermelha parte do dedo mindinho, o qual seria o caminho mais direto do coração e simboliza a energia vital.

Esse fio pode se embaralhar durante a vida, dificultando a união das almas que compartilham a mesma energia vital, porém nunca será rompido. O casal, segundo a lenda, uma vez atado pelo fio, está predestinado a se encontrar em algum momento e viver uma história de enriquecimento lado a lado.

Já o espiritismo não acredita na existência de almas gêmeas. Segundo a doutrina, os espíritos possuem preferências e afinidades, e através desses fatores as pessoas podem encontrar outras com pontos em comum e desenvolver relacionamentos. As almas seriam indivisíveis e os espíritos se ligariam através de sentimento genuíno, e não por atuação de uma força maior.

 

“O importante é que a gente veja ele como ideal”

A doutora Jaroslava Valentova pesquisa sobre a busca por parceiros [Foto: Cecília Bastos/USP Imagens]

Jaroslava Valentova, doutora em psicologia e pesquisadora da área de relacionamentos, diz que muito da construção da ideia de par ideal vem de um contexto sociocultural e histórico. Segundo ela, na hora de escolher os parceiros, as pessoas tendem a ter algumas preferências específicas, tanto físicas quanto cognitivas, mas geralmente não têm uma ideia completamente clara do que seria essa pessoa ideal. E deixa claro: existem muitos mitos sobre a existência de uma pessoa específica mas, para ela, não existe essa única pessoa.

Tudo está muito conectado às expectativas, à relação entre elas e a realidade do parceiro. Segundo Jaroslava, as pesquisas apontam diferenças significativas entre as preferências e os parceiros reais. “Agora, a questão é: quem é de  verdade o parceiro ideal? Parece ser conto de fadas. Tem uma princesa, um príncipe, com características físicas e cognitivas específicas, e as pessoas acostumam com essa ideia e com achar que isso é normal. Sim, isso é com certeza normativo.”

Com essas histórias, são criadas as expectativas e os padrões esperados. “Mas é claro que a maioria dessas historinhas é heteronormativa, monogâmica, possessiva, obsessiva, ciumenta, dependente e com aquela noção de que existe apenas uma pessoa, mas na verdade tudo isso é só uma norma específica para a nossa sociedade.”, lembra a doutora.

A pesquisadora aponta que existem diversos fatores que determinam se duas pessoas vão ficar felizes juntas, mas o que parece é que as semelhanças, os valores compartilhados e como as pessoas funcionam em uma relação são o que realmente faz diferença. Na realidade, não existe essa ideia de perfeito e ideal. “O importante é a relatividade das características, não alguma absoluta, que simplesmente não existe”. A personalidade, por exemplo, é algo que acreditava-se fazer diferença, ou seja, pessoas com personalidades semelhantes dariam mais certo, porém isso não se prova.

“Tanto faz qual o par ideal. O importante é idealizar o nosso parceiro, ou seja, tanto faz se ele é perfeito, alto e com olhos escuros como a gente gostaria. O importante é que a gente está vendo ele como o ideal”.

Sobre as dificuldades para encontrar esse tal parceiro, Jaroslava Varella aponta que muitas vezes as pessoas querem muito, tem expectativas muito altas e, por vezes, irreais. A busca por esse relacionamento pode ser desgastante e infrutífera, uma vez que essa pessoa pode não existir, ou já estar em um relacionamento, ou simplesmente não se interessar de volta.

Em contrapartida, atualmente, muitas pessoas têm encarado o amor de uma maneira mais pragmática, racional, e que vem funcionando, ocasionando muitos relacionamentos satisfatórios para os lados envolvidos. Nestes, não existe uma paixão arrebatadora inicial, mas uma conveniência e semelhança confortável, que gera felicidade para os que decidem por essa abordagem.

Segundo a pesquisa realizada para essa matéria, apenas 6,7% dos entrevistados associam a ideia de par ideal com o conceito de alma gêmea, enquanto aproximadamente 60% acredita que um romance funcional é mais próximo do match, provando que a idealização e o pragmatismo são duas faces distintas de uma mesma moeda jogada pelos jovens do século 21.

 

Para assistir sobre o assunto:

Black Mirror “Hang the DJ”

OSMOSIS

Newness (filme)

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