Este filme faz parte da 41ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo. Para mais resenhas do festival, clique aqui.
Uma paisagem montanhosa, árida e uma pequena vila são os visuais que irão permear a vista do espectador durante quase todos os 79 minutos do filme. O longa de origem indiana Caminhando com o vento (Walking with the wind, 2017), do diretor Praveen Morchhale, mostra o jovem de 10 anos Tsering em suas diversas jornadas enfrentadas no dia a dia. O seu lar localiza-se em uma vila na região do Himalaia, cercado por montanhas e um visual deslumbrante. É lá que Tsering passa a maior parte de sua vida quando não está percorrendo longos caminhos.
A quebra acidental da cadeira de um colega da escola dá início ao enredo do filme. Tsering percorre os 7 km que separam o colégio de sua vila levando a cadeira nas costas de seu burrinho para consertá-la. O menino passa por paisagens belíssimas ao mesmo tempo que enfrenta um caminho árduo e cansativo, mostrando uma grande discrepância na realidade vivida por ele.
Outro exemplo muito marcante de discrepância está nas imagens da família do garoto e moradores do local em contraste com os turistas. Por se tratar de uma região interessante para caminhadas e escaladas, turistas do mundo todo visitam o local. Mesmo com o atrativo, a vila é muito pobre e longe de qualquer cidade mais desenvolvida, fazendo com que as condições de vida sejam muito difíceis e diferentes do que estamos acostumados. O encontro de turistas com a população nativa na vila representa um choque cultural e visual gigantesco.
Um aspecto muito interessante do filme é o grande uso de planos gerais favorecendo a paisagem. A escolha pelos ângulos de filmagem é inteligente e muito bem feita. Tudo contribui para que o espectador se sinta dentro do lugar, participando das trajetórias e fazendo parte da realidade de Tsering. Para quem está acostumado com os closes de Hollywood, o filme traz uma leveza e conforto, como se tivéssemos espaço para explorar e descobrir o local.
A trilha sonora composta por sons ambientes e melodias de flauta contribuem para o efeito de imersão. O farfalhar de folhas e pisadas na areia transmitem o clima árido do local, enquanto o som de flauta se torna um símbolo das interações sociais entre os membros da vila.
Outro ponto interessante é a presença de cenas bem completas. As cenas não apresentam apenas a ação mais importante daquele segmento, mas também o processo real, incluindo os momentos considerados “insignificantes” para o cinema, mas que são o que acontecem na realidade. Um momento de espera do personagem pode se mostrar tão interessante quanto uma fala ou ação.
Assim como as longas e árduas caminhadas enfrentadas pelo personagem, o filme transmite a mesma sensação. Ele pode parecer cansativo, lento, monótono e sem ação, mas de alguma forma cumpre o papel de colocar o público no mesmo lugar de Tsering, tornando a obra ainda mais realista.
Por Maria Clara Rossini
mariaclararossini@usp.br