Pêsames àqueles que tenham paixão pela História e, ao mesmo tempo, um filho pequeno que queira ver este filme. Alguém teria o desvario de juntar personalidades históricas e quadro de arte em uma trama infantil? A Globo Filmes conseguiu a proeza de pensar nisso, elaborando As Aventuras do Pequeno Colombo (2017). A dublagem é estrelada pelas vozes de Isabelle Drummond, como a mística sereia Mab, e o homenageado José Wilker, como o Conde de Saint-Germain. Isso porque o filme, inacreditavelmente, levou mais de meia década para ser produzido.
O pequeno Cris, talvez mais conhecido como Cristóvão Colombo, vive uma situação delicada por conta das dívidas financeiras que seu pai, Domenico Colombo, mantém com o narcisista Barão de Bonneville. O brilhante Leo (Da Vinci) e a charmosa (Mona) Lisa são os melhores amigos de Cris, sempre o ajudando. O pequeno explorador descobre, com a ajuda do “velho louco” Stilpen, a localidade da misteriosa ilha de “Hi Brasil”. Sim, “Hi Brasil”. Essa é a oportunidade que Cris tem de achar o lendário tesouro do Novo Continente, a fim de quitar as dívidas de seu pai e se tornando o maior explorador de toda a Europa.
O enredo é raso. Raso até mesmo para uma produção infantil. A começar pela proposta petulante de tornar os contemporâneos Colombo e Da Vinci em crianças amigas e destemidas. Completar o trio com a presença de Mona Lisa, cuja imagem imediata que se têm no consenso social é a do quadro de Da Vinci (e não a da pessoa que serviu de modelo), é mais surreal ainda. É, literalmente, juntar duas personalidades históricas distintas e um quadro de arte em uma trama infantil. As fronteiras entre realidade histórica e entretenimento estão difusas. A linha é arbitrada na aleatoriedade. Alguns fatos, como o nome e profissão do pai de Colombo condizem com a realidade, mas, talvez, limitem-se a isso e mais poucos exemplos. É aquela “lógica” ortodoxa e pífia de que a apuração histórica é totalmente irrelevante em uma animação para crianças. Elas, provavelmente, não se incomodam com isso. É verdade, mas, se a história como realmente foi é tão “entediante”, por que não criar uma ficção pura logo? E, nem as distorções da realidade, com o intuito de tornar a trama mais interessante, cumprem com o seu papel. A ação e a aventura, baseadas somente no roteiro, são clichês.
É, também, uma responsabilidade do roteirista a construção dos personagens. Talvez fosse inevitável formulá-los bem, considerando-se sua premissa frívola. Cristóvão, ou melhor, o pequeno Cris é um protagonista medíocre e um pouco irritante. Pelo menos, ele converge aos ideais de coragem e determinação, os quais acarretam na admiração das crianças. Leo consegue ser um pouco mais carismático e interessante que Cris. Infelizmente, ele é machista. Sim, um dos protagonistas de um filme infantil é intencionalmente machista. Leo, em muitas situações, banaliza Lisa por tentar fazer algo que não é “de menina”. Lisa simplesmente o acata, respondendo “eu odeio meninos”. Não se entende, e teme-se entender, qual seria o motivo para esses momentos “cômicos”. A reversão desse cenário machista, a qual ocorre no final do filme, chega a ser sútil e inconclusiva. Em questão de comicidade – um dos fatores mais importantes para um longa infantil – o velho Stilpen é o único que alcança um nível satisfatório. Nenhum outro personagem chega a ser muito cômico.
A animação, desenhada pelo carioca Duda Campos, equilibra pontos positivos e negativos. Duda trabalhou anteriormente nas produções Turma da Mônica em Uma Aventura no Tempo e Xuxinha e Guto Contra os Monstros do Espaço, dentre outras películas infantis. Seus traçados minimalistas trazem uma simplicidade física para os personagens, a qual é positiva pelo seus caráteres infantis. O ponto forte do desenho, na realidade, é a coloração. O filme apresenta cores saturadas, promovendo vivacidade. Entretanto, a animação não flui. A movimentação dos personagens e de suas expressões faciais é um pouco picotada.
As Aventuras do Pequeno Colombo é um longa infantil mediano, apresentando claros defeitos e carências. Inevitavelmente, gerará lucros em bilheteria, por ser uma animação, e será repercutido em território nacional, afinal é uma produção da Globo. Porém, isso compensa a falta de cautela em muitos aspectos da composição do filme? Outra reflexão a ser feita é que este é o último trabalho oficial do lendário José Wilker. É triste pensar que a “despedida” de um dos maiores atores brasileiros da história seja com uma animação que será esquecida com o tempo.
O filme estreia dia 06 de julho nos cinemas.
Confira o trailer:
por Caio Mattos
caiomattcardoso@gmail.com