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Observatório | Combate à homofobia: quando o direito à igualdade está no sangue

O 16º Dia Internacional de Combate à Homofobia será lembrado de uma maneira diferente. Entre tantas crises e momentos de incerteza, o ano de 2020 ainda reservou um importante capítulo na luta por reconhecimento das minorias. No início de maio, o Supremo Tribunal Federal (STF) derrubou a restrição que impedia a doação de sangue por …

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O 16º Dia Internacional de Combate à Homofobia será lembrado de uma maneira diferente. Entre tantas crises e momentos de incerteza, o ano de 2020 ainda reservou um importante capítulo na luta por reconhecimento das minorias. No início de maio, o Supremo Tribunal Federal (STF) derrubou a restrição que impedia a doação de sangue por homossexuais. A decisão da mais alta instância do poder judiciário brasileiro representa muito mais que um acréscimo na doação de sangue no Brasil. É símbolo de uma luta por justiça e igualdade.

A medida de restrição a homens gays e bissexuais era defendida pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). O argumento usado tomava como base a maior prevalência de casos de HIV, vírus causador da Aids, entre homens homossexuais: dados do Ministério da Saúde de 2018 mostraram o crescimento da doença entre homens gays, com um foco nos jovens. Os motivos apontados a alto nos números são principalmente falta de campanhas de prevenção e queda no financiamento de organizações especializadas no tema.

Em 2016, porém, foi proposta uma ação no STF pelo Partido Socialista Brasileiro (PSB) contra um importante dispositivo: o artigo 64 da Portaria 158/2016 do Ministério da Saúde. Nela é indicado que “homens que tiverem relações sexuais com outros homens e/ou as parceiras sexuais destes” serão considerados inaptos por 12 meses, contados a partir da última relação sexual com outro homem, para doação de sangue. A votação foi paralisada em 2017, depois do ministro do Gilmar Mendes pedir mais tempo para analisar a ação.

Concluída somente em maio de 2020, a votação terminou com uma decisão histórica: por sete votos a quatro, o STF considerou inconstitucional as restrições de doação de sangue impostas a homens homossexuais.

A Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5.543 marcou um importante passo nessa antiga luta. No Brasil, as primeiras medidas formais desse tipo de restrição remetem à década de 1990. Em novembro de 1993, uma portaria do Ministério da Saúde definiu ser proibida a doação de sangue para qualquer homem gay com vida sexual ativa. 

O fim da restrição de doação de sangue para homens gays foi colocado como urgente pela Defensoria Pública. Levando em consideração os baixos estoques de sangue durante o período de pandemia do coronavírus, órgãos como o Ministério da Saúde apelaram pela decisão diante do estado crítico dos bancos de sangue no país. 

Em entrevista à equipe do Observatório, Bernardo Fico, especialista na área de Direito Internacional dos Direitos Humanos, afirmou: “Acredito sim que houve uma baixa nas doações, mas, ao mesmo tempo, não é possível deixar de lado o trabalho de convencimento que foi feito durante o processo para mostrar que, independentemente de ter ou não pessoas doando, é fundamentalmente errado discriminar pessoas por sua orientação sexual”.

 

Luta no âmbito legislativo

Essa, porém, não é a primeira vez que o debate de reconhecimento de minorias ultrapassa a esfera cívica e influi no âmbito político. Em 2019, por exemplo, o Supremo Tribunal Federal permitiu a criminalização da homofobia e da transfobia. A decisão do tribunal colocava declarações homofóbicas na mesma categoria de crimes de racismo. A partir de então, a pena prevista para esse tipo de discriminação é de um a três anos de prisão, podendo chegar a cinco anos em casos mais graves.

Bandeira LGBT
Bandeira LGBT [Imagem: Elza Fiuza/Agência Brasil]
A decisão do Supremo foi influenciada por ações apresentadas pela Associação Brasileira de Gays, Lésbicas e Transgêneros (ABGLT) e pelo partido Cidadania. Dessa forma, torna-se notável a tendência de combate a preconceitos e outras formas de discriminação no meio legislativo e judiciário.

Sobre isso, Bernardo Fico afirma: “Ter essas questões representadas na esfera política é importante para dar maior visibilidade a essas minorias. Claro que só a representação não resolve, mas é um passo importante.”

Também se percebe que muitas das reivindicações da esfera política buscam combater meios de intolerância já consolidados do ponto de vista histórico e cultural. “É inevitável que a nossa visão de mundo parta do nosso próprio contexto. Então, é esperado que aspectos histórico-culturais (que por vezes vêm carregados com preconceitos) apareçam na formulação de leis, como aparecem em outras partes. O importante é que esses aspectos possam ser identificados e corrigidos quando for necessário”, complementa Bernardo, mencionando o fim das restrições para homossexuais em hemocentros.

Segundo especialistas como o médico Dráuzio Varella, tal proibição tem um viés preconceituoso e, de certa forma, antiquado. Isso porque a decisão seria fruto de um resquício da epidemia de HIV vivida pelo Brasil. O médico argumenta que, atualmente, há advento de testes para o vírus e que tanto casais héteros quanto casais homossexuais estão sujeitos a contrair a doença.

 

Momento atual do combate à homofobia no Brasil e no mundo

Embora a comunidade LGBTQI+ tenha conquistado muitos direitos e até uma representação maior nas últimas duas décadas, não se pode dizer que esse é um progresso constante. Segundo relatório da Associação Internacional de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Transexuais e Intersexuais (ILGA), os discursos de cunho homofóbico vêm crescendo na Europa nos últimos anos. Ainda conforme o relatório, países como Portugal, Espanha e Finlândia, conhecidos por serem acolhedores com essa população, também tiveram um aumento de discursos deste cunho.

No Brasil, não é diferente. Nos últimos anos a comunidade LGBTQI+ conquistou alguns direitos, como o de transsexuais mudarem seu nome social, mesmo sem realização de cirurgia, a criminalização da homofobia e transfobia, além da liberação do casamento civil entre pessoas do mesmo sexo, mas isso não significa que perante a sociedade esse tratamento mudou. Segundo relatório divulgado pelo Grupo Gay da Bahia, em 2019 o Brasil registrou 329 mortes violentas da comunidade LGBTQI+, sendo 297 homicídios e 29 suicídios.

Em 2018, durante a campanha eleitoral, falas desse tipo alimentaram discussões na internet. Nesse período falas homofóbicas do então candidato e agora presidente, Jair Bolsonaro, viralizaram na rede e apontavam um reforço desse discurso. Dentre as falas que ganharam relevância nessa época, está um vídeo de Bolsonaro afirmando ser homofóbico e com orgulho. Além disso, até os dias atuais, o presidente segue se referindo ao público LGBTQI+ com um tom ruim, e fazendo piadas de cunho homofóbico. Tais atitudes, por serem realizadas pelo representante da Nação, ganham mais força, e algumas pessoas acabam vendo ali um reforço de discursos que na realidade deveriam ser combatidos.

Na Bienal do Livro de 2019, o prefeito do Rio de Janeiro Marcelo Crivella orientou que “Vingadores: a Cruzada das Crianças” fosse retirado dos stands de vendas. Segundo o prefeito, a graphic novel, que mostrava um beijo entre Hulkling e Wiccano, continha conteúdo sexual e não deveria ser visto por crianças. Tal medida gerou grande repercussão e revolta na internet, trazendo ainda mais visibilidade para a temática LGBTQI+.

Tendo em vista tais acontecimentos, fica evidente que, apesar dos avanços, a comunidade LGBTQI+ ainda sofre muito com todo o preconceito. Para Bernardo Fico, as conquistas são muito importantes, mas todo o processo para que elas de fato aconteçam é complicado: “Claro que nossas conquistas recentes são importantes (e muito importantes), mas é ficar contente com uma vitória e com o que ela representa, para logo menos termos que enfrentar o mesmo processo para obter outros direitos que pessoas fora da comunidade já têm”.

3 comentários em “Observatório | Combate à homofobia: quando o direito à igualdade está no sangue”

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