No dia 8 de julho de 2022, Boris Johnson declarou sua renúncia ao posto de líder no Partido Conservador e, consequentemente, ao cargo de primeiro-ministro do Reino Unido. O premiê britânico, no entanto, permanecerá interinamente até a nomeação de um novo líder após as eleições internas no partido.

Apesar de não envolver Boris Johnson diretamente, sua postura com o acontecimento foi extremamente questionada. Em um primeiro momento, disse que não estava ciente de qualquer acusação para, logo após, afirmar que havia se “esquecido” do ocorrido. Cerca de 60 membros do Partido Conservador pediram demissão em protesto a sua permanência no cargo. Os maiores destaques dessas perdas foram o ministro das Finanças, Rishi Sunak, e o da Saúde, Sajid Javid.

A eleição interna do partido, em sua primeira rodada, eliminou os candidatos Jeremy Hunt e Nadim Zahawi. Sunak assumiu a liderança. O plano para as próximas semanas é que restem apenas dois candidatos. O resultado da eleição será decidido no dia 5 de setembro, com uma votação final aberta a todos os membros do Partido Conservador incluindo filiados.
Escândalos durante o governo
Johnson perdeu o apoio de praticamente todo o Partido Conservador após ter seu nome envolvido em uma série de problemas. Com aumento da inflação, baixa previsão de crescimento e efeitos colaterais da guerra da Ucrânia, o Reino Unido passa por sua maior restrição fiscal desde o início da pandemia. O ex-primeiro-ministro anunciou que acreditava não ser melhor se afastar do cargo. Boris demitiu uma série de funcionários que apoiavam sua renúncia, afirmou que havia recebido milhões de votos dos eleitores e que nenhum outro líder do Partido Conservador conseguiria repetir seu sucesso em uma nova eleição.
Em junho deste ano, Boris Johnson foi submetido a uma moção de desconfiança, uma votação entre os parlamentares de seu partido para definir se ele deveria ou não ser substituído. Apesar de sua permanência ter ganhado por 211 votos a 148, o resultado mostrou que sua situação já estava difícil. Há meses, o premiê ficou no centro do escândalo “partygate”, envolvendo sua presença e de outros membros de seu partido em 16 eventos e festas realizados durante o período de maior restrição do lockdown britânico.
Sua postura em tais eventos também foi questionada, já que a festa de natal foi no estilo “cada um leva sua bebida” e diversas fotos do evento surgiram na mídia. Keir Starmer, líder da oposição do Partido Trabalhista, chegou a afirmar que Johnson “não tinha autoridade moral para liderar o país”.

Mesmo eleito ao dizer que realizaria o Brexit a qualquer custo, muitos opositores o acusaram de exagerar e mentir sobre estatísticas da participação do Reino Unido na União Europeia (UE). O episódio mais polêmico desse momento foi quando Boris afirmou que o país enviava um valor semanal de 350 milhões de libras à UE, quantia considerada incorreta pelo partido de oposição.
Outro escândalo foi um pedido de doações feito por ele a membros do partido para reformar seu apartamento na Downing Street. Donativos e empréstimos são permitidos no Reino Unido, porém rigidamente fiscalizados pelo governo. Johnson não registrou as contribuições, de modo que seu partido foi multado em 17.800 libras.
Como funciona o sistema político britânico
No Reino Unido, o primeiro-ministro é o líder do partido que tem maioria na Câmara dos Comuns, ou seja, no parlamento. Dessa forma, ao mudar o líder desse partido, muda-se também o primeiro-ministro. As últimas eleições gerais aconteceram em 2019, e a próxima está marcada apenas para 2025.

Após chegar em dois adversários, todos os membros do partido no país devem votar em seu favorito. Vence aquele que obtiver a maioria dos votos. Em seguida, o candidato é eleito e deve montar um novo gabinete. A primeira rodada já eliminou dois candidatos. Assim, outras duas etapas deverão acontecer antes que os dois finalistas cheguem à votação nacional.
Os conservadores estão no poder desde 2010, com David Cameron (2010-2016), seguido por Theresa May (2016-201919) e Boris Johnson (a partir de 2019). Segundo Maurício Santoro, cientista político e professor no departamento de relações internacionais da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), todos os três caíram em decorrência, em maior ou menor grau, do Brexit. Cameron perde a votação para a saída da União Europeia e renuncia. May tenta organizar a saída e, após não conseguir, também abandona o cargo. Johnson sofre com seus efeitos negativos.
Perspectivas para o futuro
A escolha de um novo líder, a partir de uma eleição interna, tende para um candidato que se encaixe melhor no padrão do Partido Conservador. De acordo com Santoro, o próximo primeiro-ministro deve seguir um modelo mais tradicional e experiente, a fim de proporcionar um contexto mais estável para o partido e o país.
“O cenário diplomático não vai ajudar o governo britânico, pelo contrário, ele faz parte do problema e quem assumir esse posto vai enfrentar muito descontentamento e crise”, afirma o especialista, uma vez que o Reino Unido encara um cenário bélico com a Guerra na Ucrânia. Além disso, ainda tenta conciliar as complicações oriundas da sua saída da União Europeia.
Em seu discurso de despedida, Johnson relembrou seus momentos marcantes, como o Brexit, a velocidade na compra de vacinas e o apoio à Ucrânia. Também afirmou que está sendo difícil “abrir mão do melhor emprego do mundo” e declarou total apoio ao novo escolhido. “Na política, ninguém é nem remotamente indispensável, e nosso sistema brilhante trará outro líder, igualmente comprometido em levar este país adiante em tempos difíceis”, complementa.
*Foto de capa: Reprodução/Unsplash