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Shakespeare e Cangaço

Por Beatriz Moura bia.vlm@gmail.com Com a chegada do 80º aniversário de Eduardo Coutinho, era de se esperar que a  37ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo preparasse uma mega homenagem a um dos maiores figuras do cinema nacional. E preparou. A programação está recheada do melhor do documentário e da ficção do cineasta. Entre …

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Por Beatriz Moura
bia.vlm@gmail.com

Com a chegada do 80º aniversário de Eduardo Coutinho, era de se esperar que a  37ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo preparasse uma mega homenagem a um dos maiores figuras do cinema nacional. E preparou. A programação está recheada do melhor do documentário e da ficção do cineasta. Entre eles, Faustão (idem, 1970).

O filme, parte da obra ficcional do diretor,  conta duas histórias superpostas: a de um cangaceiro negro – Fausto (Eliezer Gomes) – e a de um conflito familiar no sertão nordestino. Henrique (Jorge Gomes), filho do coronel Pereira, é atacado por jagunços a mando do inimigo de sua família, o coronel Araújo. Fausto e seu bando, ao verem o que acontecia, salvam o rapaz. No entanto, eles não libertam Henrique. É preciso que seu pai pague o resgate para o filho retornar à sua casa.

Assim, começa a transformação de Henrique. Como o dinheiro de seu pai tarda a chegar, o rapaz é obrigado a conviver com os bandoleiros, em meio à caatinga, fazendo com que ele desenvolva o conhecimento dessa vida. Bebidas, mulheres e violência passam a fazer parte de seu cotidiano. E ele começa a gostar disso. Tanto que, quando finalmente o coronel Pereira quita sua dívida com Faustão, Henrique não quer mais voltar para casa. Ele já havia conquistado sua liberdade bem antes de seu pai pagar por ela.   

A reviravolta do filme se dá quando amigos de Fausto são assassinados por capangas dos Araújo. Apesar de, primeiramente, não querer se meter na briga das duas famílias mais poderosas daquela região do sertão, o jagunço negro não resiste. A sede de vingança toma conta dele, fazendo com que eles passem a apoiar os Pereira. No ataque do coronel Araújo à fazenda do pai de Henrique, Faustão luta ao lado deste, mata o coronel Araújo, mas perde, para sempre, seus companheiros de cangaço. O coronel Pereira também morre. Henrique, então, assume o controle da fazenda e volta a ter sua vidinha normal, enquadrando-se no estereótipo de herói “bonzinho” e “benfeitor”. Sendo assim,  não pode mais admitir os crimes do ex-amigo em suas terras,  o que leva ambos a um duelo, no qual só um pode sair com vida.

Faustão é uma releitura da peça shakespeariana “Henrique V”. Ao  invés de centrar a história em Henrique, Coutinho transforma o anti-herói em sua personagem principal. Na tragédia clássica, Falstaff é um conhecido boêmio farrista e amigo de adolescência do rei. Da mesma forma que o mocinho do agreste abandona o cangaceiro, o rei inglês acaba desrespeitando e afastando-se do fanfarrão, que acaba morrendo triste e abatido numa taverna junto a antigos amigos.

Quando se junta um dos maiores mestres do cinema nacional com um dos grandes atores negros dos anos 70 e Shakespesre, não tem como o filme ser ruim. A ótima atuação de Eliezer Gomes – que encarna toda a boemia, valentia e senso de humor de Fausto/Falstaff , unida à sensibilidade exacerbada do diretor – que soube fazer da caatinga o cenário perfeito e do cangaço e do coronelismo o pano de fundo ideal -, resulta em uma tragédia genuinamente nordestina e cria uma lenda brasileira. É uma pena Faustão pertencer a um circuito mais alternativo do diretor, tendo sido “deixado de lado” dentro do contexto cinematográfico nacional. Felizmente, a Mostra “ressuscitou” o canganceiro do rei Eduardo Coutinho.

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