Por Ricardo Thomé (ricardo.thome@usp.br)
Quarenta anos e mais de duzentos jogos depois do primeiro lançamento, a franquia Mario ganhou sua primeira animação para as telonas (em 1993, já havia sido produzido um live-action). Sob a direção de Aaron Horvath e Michael Jelenic, Illumination e Nintendo trazem aos cinemas Super Mario Bros. O Filme (The Super Mario Bros. Movie, 2023) buscando repetir o sucesso recente de adaptações de games para o cinema e para a TV — como em Pokémon: Detetive Pikachu (Pokémon Detective Pikachu, 2019), Sonic (2020), Arcane (2021), Sonic 2 (2022) e The Last of Us (2023). O desafio era grande: trazer elementos do jogo para entreter os fãs da franquia sem que isso prejudicasse a experiência envolvendo a história e a atração de novos públicos. Deu certo.
A trama
Já nos trailers divulgados desde o final do ano passado, era possível deduzir que a história contada no filme seria de origem e de apresentação das personagens ao público e do mundo às personagens. E isso é feito de forma muito natural: Luigi (Charlie Day) e Mario (Chris Pratt) são dois irmãos encanadores de uma família italiana do Brooklyn, Nova Iorque, que arriscam suas economias para criar uma empresa própria — a “Super Mario Brothers”. Nenhum dos dois, porém, tinha conseguido grandes êxitos na vida, o que faz com que a coragem de ambos seja vista como teimosia por parte da família.
Em um dos primeiros serviços dos irmãos, um acidente ocorre e eles caem em um cano que os leva a outro mundo. No caminho, contudo, eles acabam se separando — Luigi vai parar no Reino das Sombras, liderado pelo poderoso Bowser (Jack Black), enquanto Mario cai no Reino dos Cogumelos, da princesa Peach (Anya Taylor-Joy). E é a partir deste ponto que se percebe outro detalhe já indicado pelos trailers: ao contrário do que costumava ocorrer nos jogos, em que Mario resgatava a princesa Peach, no filme é Luigi quem corre perigo e tem que ser encontrado.
Para esta aventura, Mario conta não só com a companhia da princesa — de quem acaba se aproximando — mas também com Toad (Keegan-Michael Key), um cogumelo muito extrovertido e dedicado. Os três vão até o Reino dos Kongs procurar por ajuda e, lá, uma série de eventos ocorre e desemboca no clímax do filme. Paralelamente a isso, Bowser convoca os Koopa Troopas (tropas de tartarugas) para expandir seu reinado e chegar ao seu principal objetivo: conquistar a princesa Peach e casar-se com ela, custe o que custar. O filme também conta com duas cenas pós-créditos que propõem novidades para o futuro.
As personagens: carisma de sobra
O longa tem uma ótima trilha sonora, é bonito, bem ambientado e fiel aos jogos. Mas, para além da beleza, as personagens são extremamente carismáticas. Mario e Luigi estão muito bem caracterizados em sua essência, o que é transmitido por Raphael Rossatto e por Manolo Rey, respectivos dubladores dos irmãos. Toad e Donkey Kong (Seth Rogen), que ganham as vozes de Eduardo Drummond e Pedro Azevedo na versão brasileira, também cumprem muito bem seu papel. As personagens secundárias contribuem para o humor, mas o destaque fica por conta de dois antagonistas entre si: Peach e Bowser.
Para quem está acostumado a ver em Peach uma donzela indefesa que deve ser resgatada, o filme descarta essa abordagem. Em Super Mario Bros. O Filme, a personagem dublada por Carina Eiras é uma mulher corajosa, guerreira e talentosa, que protege seu reino a qualquer custo e não cede às pressões alheias.
Se, por um lado, Peach vai de delicada a corajosa, por outro, Bowser vai de amedrontador a apaixonado — beirando ao melancólico cômico. Logo em suas primeiras aparições, a tartaruga gigante já provoca boas risadas na sala ao se mostrar muito mais do que um monstro hostil: Bowser ama Peach e tem ciúmes de qualquer homem que se aproxime dela. Suas inseguranças e performances para tentar conquistá-la são um recurso muito bem utilizado pelo roteiro, o que humaniza a personagem e permite a compreensão de suas razões — por mais obscuras que elas possam parecer. O vilão é brilhantemente interpretado na versão brasileira por Marcio Dondi, que já dublou antagonistas como Ultron (James Spader), em Vingadores: Era de Ultron (The Avengers: Age of Ultron, 2015).
As referências: um show de nostalgia sem perder a história
Além da imensidão de referências aos inúmeros jogos envolvendo as personagens — incluindo Donkey Kong, cujo game foi lançado antes mesmo do primeiro Mario, em 1981 —, o filme entrega outras formas de homenagem aos arcades. Os dois destaques são o plano da câmera na horizontal, que simula um jogo em 2D (mesmo com o filme em 3D), e a interação com os cenários, que é presença constante e crucial para passar de fase nos jogos. Isso traz uma imersão maior tanto para as personagens, como para quem assiste e já jogou os games.
Nem as referências, nem as facilidades do roteiro diminuem a experiência de quem assiste, tampouco desanimam o público-alvo. As crianças, foco principal do produto, tendem a adorar o filme, mesmo que não conheçam a franquia. Não há razão para se exigir um desenvolvimento complexo, repleto de plot twists, ainda mais em um filme de origem. O longa se propõe a ser um bom divertimento com um toque de nostalgia e, nesse ponto, cumpre muito bem seu papel. O roteiro, por sua vez, é de Matthew Fogel — que também escreveu filmes como Vovó…Zona 3: Tal Pai, Tal Filho (Big Momma’s: Like Father, Like Son, 2011), Uma Aventura Lego 2 (The LEGO Movie 2: The Second Part, 2019) e Minions 2: A Origem de Gru (Minions: The Rise of Gru, 2022). A direção é a mesma de Os Jovens Titãs em Ação! Nos cinemas (Teen Titans Go! To the Movies, 2018).
Quais são os pontos negativos, então?
Os aspectos negativos ficam no apelo constante à figura de Luigi como um irmão abobalhado que precisa de Mario para tudo. Seja na cidade, seja nos reinos, seja em flashbacks, o irmão que veste verde está sempre fazendo alguma besteira ou sofrendo algum mal, enquanto o irmão de vermelho (que não deixa de ser tão desajustado quanto) corre para salvá-lo. Ainda que Luigi tenha seus momentos de redenção durante o filme, situações como essa são recorrentes no roteiro, o que torna algumas cenas um pouco repetitivas.
Além disso, alguns momentos importantes do filme, seja na parte cômica, seja na parte de desenvolvimento da história e das personagens, estão claramente expostos nos trailers. Atrair o público é bom, mas surpreendê-lo positivamente é melhor ainda, e uma melhor dosagem desse ponto poderia ter um efeito positivo na experiência, que já é ótima.
O que dizem os cinéfilos
A Jornalismo Júnior conversou com alguns dos cinéfilos presentes na cabine de imprensa de Super Mario Bros. O Filme para saber o que eles acharam do longa.
Artur trabalha no Castback, podcast especializado em séries e filmes, e acredita que Super Mario Bros. O Filme é uma das melhores adaptações de games já feitas para os cinemas. “Esse filme foi sensacional! Tudo o que ele se propôs a fazer, fez com perfeição. Não vi um problema que me tirasse do filme”, explica.
Ele também comparou Super Mario Bros. O Filme aos longa-metragens de Sonic, franquia de jogos da Sega. Na sua visão, o filme inspirado nos jogos da Nintendo foi mais ousado: “Por mais que o Sonic adapte muito bem o personagem, o filme fica na cidade. Aqui, eles realmente se embrenharam em explorar o mundo e em dar abertura para o universo da Nintendo”.
Embora não se considere um grande jogador de Mario, o podcaster se diz satisfeito com a forma como as referências foram colocadas no longa: “Até o que você não conhece, você sabe que é uma referência”. Laura, que escreve para o JBox, portal focado em cultura pop japonesa, contou ao Cinéfilos que, quando criança, tinha o hábito de jogar os games do encanador: “Quando eu era pequena, tinha um Super Mario All Stars, que era uma coletânea dos Marios do Nintendinho (NES, Nintendo Entertainment System)”.
Ela também saiu empolgada da sessão, definindo o filme como “muito bonito”. Laura se disse impressionada com a coesão da história em meio a tantas referências e crê que várias gerações que tiveram contato com a franquia podem aproveitar o longa.

O filme já está em cartaz nos cinemas. Confira o trailer:
*Imagem de capa: Divulgação/Universal Studios