Por Guilherme Fernandes
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Treze destacados jornalistas nacionais falam sobre questões essenciais e contemporâneas a sua profissão no Brasil. Para intercalar as entrevistas, são exibidos trechos da montagem da peça “O mercado de notícias” (The staple of news, 1625), do dramaturgo inglês Ben Jonson. A peça é uma ácida crítica aos primórdios da imprensa. O documentário de Jorge Furtado, conhecido por trabalhos na TV e no cinema (O homem que copiava, 2003 e Meu tio matou um cara, 2004), foi apresentado em sessão de pré-estreia, havendo, depois, um debate entre o diretor e o público presente, com mediação do editor-adjunto da Folha, Fabio Victor.
As entrevistas do filme discorrem, principalmente, sobre a função do jornalismo na sociedade, na visão de profissionais como Paulo Moreira Leite, Luis Nassif, Renata Lo Prete, José Roberto de Toledo, Fernando Rodrigues, Jânio de Freitas, entre outros nomes. Para alguns, estamos em plena crise. Para os mais otimistas, no meio de um revolução. A peça de Ben Jonson se passa num momento de revolução do jornalismo, quando a imprensa em larga escala está em expansão, em meados do século XVII. Curiosamente, alguns princípios jornalísticos daquele período parecem permear a produção de notícias ainda hoje, como uma inclinação para fofocas e boatos. No debate, Jorge Furtado concordou com tal relação.
A obra de Ben Jonson, intercalada às entrevistas, às vezes esfria o ritmo do documentário. Os trechos da peça são dispostos em alinhamento com os temas das entrevistas. Há um confronto entre a encenação teatral, e a “veracidade” dos depoimentos dos profissionais, permitindo o questionamento dos limites da simulação, seja na peça, seja nas entrevistas. Há também o jogo temporal séculos XVII/XXI, pois no cenário da peça são dispostas (e usadas) máquinas que transformaram a comunicação mundial, como câmeras e computadores.
Jorge Furtado, um ávido leitor de jornais, desmascara alguns “tramas” jornalísticos que grandes veículos de comunicação, em conjunto, promoveram, como o caso da bolinha de papel atirada em José Serra, na campanha presidencial de 2010, e o episódio do quadro de Picasso encontrado no prédio do INSS. O diretor realiza, durante o filme, simples (e cômicas) averiguações que, se realizadas previamente pelos jornais, evitariam os “vacilos”. Com essa faceta, Furtado reafirma, com emblemáticos exemplos, pontos colocados nas entrevistas, como o grande conservadorismo da mídia brasileira e o distanciamento dos princípios da profissão.
A montagem e a edição do filme são simples e , e as entrevistas são repletas de frases de efeito. O projeto gráfico-visual é mantido no site do projeto, que levou a devida atenção. Lá, há informações extras dos casos mostrados e da pesquisa para o filme, além das entrevistas na íntegra, fazendo de O Mercado de Notícias um interessante projeto intermídia.
A intenção de Jorge Furtado, como ele mesmo colocou no debate, era refletir sobre a situação atual do jornalismo brasileiro, num filme para o grande público. Para tal objetivo, escolheu profissionais que admira, atuantes, em sua maioria, em jornais impressos, mas também na TV e na internet. Práticas antijornalísticas, a relação entre a mídia e os partidos políticos e o futuro da profissão são alguns dos temas debatidos. As visões dos entrevistados distinguem-se, sobretudo ideologicamente, o que enriquece o documentário. Essas diferentes visões da prática jornalística, inevitalmente, incitam o debate, trazendo à tona conceitos muitas vezes distantes do grande público, como a verdade factual e a honestidade intelectual. Com estreia nesta quinta, 7/8, em 14 salas no país, espera-se que o filme não seja contemplado somente pelos jornalistas e por ávidos leitores. A discussão que o filme proporciona é fundamental para nossa democracia. Espalhe-o a seus familiares e amigos, por favor.