Jornalismo Júnior

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Uma Infância Quebrada

por Mirella S. Kamimura mirellask317@gmail.com O que deveria ser um simples registro dos primeiros anos da vida de uma criança, tornou-se um premiado documentário sobre um dos vários embates relacionados ao conflito israelense-palestino. O longa Cinco Câmeras Quebradas (5 Broken Cameras, 2011) co-dirigido pelo jornalista e cinegrafista palestino Emad Burnat e pelo ativista israelense Guy Davidi. …

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por Mirella S. Kamimura
mirellask317@gmail.com

O que deveria ser um simples registro dos primeiros anos da vida de uma criança, tornou-se um premiado documentário sobre um dos vários embates relacionados ao conflito israelense-palestino. O longa Cinco Câmeras Quebradas (5 Broken Cameras, 2011) co-dirigido pelo jornalista e cinegrafista palestino Emad Burnat e pelo ativista israelense Guy Davidi. A produção conta com recursos mínimos e possui um caráter familiar. As cinco câmeras que dão nome ao filme registram o uso não-violento da força pela parte dos palestinos contra a armada guarda militar israelense e o crescimento de Gibreel, uma criança palestina que tem sua infância tomada quase que militarmente pela necessidade de conhecer e defender as causas de seu povo.

Emad Burnat é um jornalista e agricultor palestino que vive em Bil’in, uma vila da Cisjordânia, com sua família e amigos. Em poderio de uma câmera – que de início serviria para registrar os primeiros momentos de Gibreel, seu quarto filho – e de sua coragem, Emad documenta a ocupação de suas terras por militares com a finalidade de construir assentamentos para os israelenses.

Guy Davidi e Emad Burnat, a dupla palestina-israelense responsável pelo documentário.

O filme tem um ritmo tranquilo, mas as imagens chegam a ser chocantes. Soldados israelenses fortemente armados agem covardemente contra o povo palestino, que resiste e se manifesta contra a criação do muro que delimita suas terras. Entre seus atos de covardia é relevante citar o sequestro de crianças na madrugada para impor respeito, destruição de câmeras dos cinegrafistas e incêndio de oliveiras seculares pertencentes às famílias palestinas.

Ademais, fora o próprio cinegrafista Emad, alguns outros personagens chamam atenção durante o longa: Phil, Adeeb, Soraya e Gibreel. 

Adeeb e Phil, moradores de Bil’in, durante uma manifestação.

Phil era conhecido como “o elefante” por ser grande e dócil. Para Emad, Phil era intenso e sempre transparecia otimismo, conferindo ao povo uma sensação de que, no final, tudo daria certo. Adeeb era incansável. Em todas suas aparições no filme, está cantando, gritando ou dançando alegremente, tudo em prol da paz e da justiça com sua comunidade. Soraya é a mulher de Emad, que sofre com a sua rotina perigosa. Além disso, ela é uma palestina criada no Brasil, o que dá ao filme um toque tupiniquim devido à algumas frases que ela fala em português, à algumas roupas que estampam o nome ou algo relacionado ao nosso país e à bandeira brasileira, pintada na porta de sua casa e agitada por Phil durante um jogo de futebol entre as crianças da vila. Gibreel, quarto filho de Emad Burnat e razão para o surgimento do documentário.

Gibreel é personagem antes mesmo de aprender a falar: ele é o quarto filho de Emad e Soraya e o motivo desse documentário acontecer. A câmera de Emad fora comprada para registrar o crescimento de Gibreel, mas acabou mostrando uma dura realidade enfrentada pelos povos envolvidos nesses conflitos do Oriente Médio: a infância não existe mais. Esse fato se comprova através de uma cena caseira do filme, na qual Gibreel, já com 5 anos, pergunta ao pai porque não mata o soldado israelense que matou um de seus amigos com uma faca. Para Emad e para os outros pais de Bil’in, seus filhos devem se tornar homens fortes e corajosos para lutar pelos seus ideais. Por isso assistem os protestos desde pequenos, inclusive participando de algumas das manifestações.

Mesmo tendo 5 câmeras quebradas por balas de borracha, soldados que não gostaram de ser filmados e bombas de gás lacrimogênio, Emad manteve-se documentando os acontecimentos de Bil’in. Segundo ele, atrás da câmera sentia-se seguro, mesmo sabendo que era uma sensação falsa, afinal, uma das suas câmeras quebradas serviu de escudo para uma bala que estava destinada à sua cabeça.

O longa foi exibido no festival de documentários É Tudo Verdade de 2012 em São Paulo e no Rio de Janeiro e foi um dos escolhidos para concorrer à estatueta do Oscar como Melhor Documentário de 2013. O renomado jornal New York Times denominou a obra como uma mistura entre vida-diário e “crônica de protesto”.

Independente de argumentações a favor de Palestina ou Israel, o filme é um lembrete amargo de que, por trás das lutas ideológicas, existem pessoas e famílias normais. Existem Gibreels que nascem e crescem, existem Sorayas que sofrem, existem Emads que lutam e documentam. Apesar da baixa qualidade de algumas das câmeras utilizadas, elas conseguem retratar com mais realidade a guerra e os seus efeitos na sociedade do que grandes produções que caracterizam a guerra como uma obra artística e artificial, criando vilões e mocinhos, quando na verdade, só existem vítimas.

“Tenho cinco câmeras quebradas, cada uma conta uma história.”

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