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Você tem medo de quê?

por Carolina Tiemi  carolinathaga@gmail.com Não existe um consenso sobre qual teria sido o início do medo no cinema. Mas já no final do século XIX o ilusionista francês Georges Méliès, um dos precursores da sétima arte, ousou mostrar um encontro do Diabo e seus fantasmas ajudantes com um nobre cavaleiro. Ainda que o filme de três …

Você tem medo de quê? Leia mais »

por Carolina Tiemi 
carolinathaga@gmail.com

Não existe um consenso sobre qual teria sido o início do medo no cinema. Mas já no final do século XIX o ilusionista francês Georges Méliès, um dos precursores da sétima arte, ousou mostrar um encontro do Diabo e seus fantasmas ajudantes com um nobre cavaleiro. Ainda que o filme de três minutos tentasse incitar o riso e o questionamento no público, a temática e os personagens mal-assombrados fizeram com que A Mansão do Diabo (Le Manoir du diable, 1896) pudesse ser considerado o primeiro filme de terror produzido.

 

 

Outra grande referência na história do terror foi O Gabinete do Dr. Caligari (Das Cabinet des Dr. Caligari, 1919), uma das mais marcantes obras do expressionismo alemão, dirigido por Robert Wienne que, juntamente com Nosferatu (Nosferatu, eine Symphonie des Grauens, 1922) e Fausto (Faust, 1926), ambos de F. W. Murnau, viriam a influenciar todo o gênero produzido em seguida, graças à sua atmosfera sobrenatural e fotografia gótica, incorporando o que há de mais sombrio e expressivo na arte cinematográfica. Wiene orquestrou uma sequência de imagens insólitas e sufocantes, num verdadeiro show de demência e loucura, realizando um filme sob a ótica do louco: daí justificando as distorções e deformações das ruas, casas e pessoas. E conseguiu não só relatar uma história de que provocasse medo, temperada com um requintado suspense, mas também criar uma das mais originais obras do cinema mudo. Suas imagens mostram que não é necessário o uso de diálogos para relatar a aflição e a neurose humana -temas expoentes no tipo de terror que logo daria as caras, ou melhor, sugeriria sua presença: o terror psicológico. Alfred Hitchcock, mestre do suspense, conhecido por seu filme Psicose (Psycho, 1960) certamente bebeu da fonte de Wienne para elaborar seus principais filmes, com os contrastes de luz e sombra, sempre sugerindo as cenas e nunca as evidenciando, uma das características básicas desta vertente do gênero.

terror1Entretanto, foi em Sangue de Pantera (Cat People, 1942) que o terror psicológico ganhou força. Este filme, dirigido com o talento visual característico de Jacques Tourneur, tem uma história que gira em torno de sexualidade e repressão feminina e, com efeitos especiais mínimos, transforma-o num estudo psicológico denso de emoções proibidas e medos primitivos. Se o terror psicológico crescente do filme é eficaz na criação de suspense, a forma como os filmes de Tourneur são desenvolvidos só contribuiem para o medo atmosférico da trama. Diferente dos alemães, a estética de horror fundada na contenção visual e no minimalismo, na crença de que o invisível é muitas vezes mais aterrorizante do que o visto. Para este fim, Tourneur filmou um punhado de cenas sombrias, maravilhosamente evocativas deum suspense quase insuportável como Irena, personagem transformada em pantera, persegue a suapresa. Não vemos sangue, não vemos o ataque: nos momentos de perseguição, inclusive na clássica cena da piscina, sabemos que não se trata mais da mulher, porém tudo de uma forma subentendida, apenas através de vultos e rugidos do animal.

Não há nada tão assustador quanto o desconhecido

Este jogo com o oculto é a maior diferenciação entre o horror e o terror. Ainda que ambos sejam oriundos do medo, o terror está mais relacionado com o sentimento intenso de medo e expectativa que precede uma experiência horrível. Por outro lado, horror é a repulsa quase orgânica que ocorre depois de algo assustador e desagradável é visto, ouvido ou experimentado. Em outras palavras, horror está mais relacionado a ficar chocado e horrorizado, enquanto o terror está mais relacionado à ansiedade e ao pavor. É possível ter os dois elementos em uma mesma trama, mas cada um é produzido de maneira diferente: enquanto o lado gore (violência explícita, intensa e incômoda, quase escatológica) usa da maquiagem de alto nível e dos efeitos especiais que possam reproduzir os corpos dilacerados e o sangue jorrando, o nervosismo psicológico vem de intricadas combinações de música e efeitos de luz junto a tensão do enredo e dos próprios personagens, evocando um clima angustiante a partir de cenas que mostram de menos.

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O medo se apresenta em escalas até a sua inativação, tomando uma proporção até que o indivíduo tenha seus sentimentos e emoções destabilizados, dividindo-se em fases de acordo com o grau de extensão e imensidão: Prudência, Cautela, Alarme, Ansiedade, Pânico e Terror.

Assim é criado a atmosfera que leva ao terror nos filmes. Nos medos dos personagens e instabilidade emocional crescente para construir a tensão que absorve o expectador, de tal maneira que, ao invés de se chocar com a morte violenta de outrém nas telas, é amedrontado pelo desconhecido, dando espaço para o lado mais creepy da sua imaginação, ao explorar situações desconfortáveis e perturbadoras da mente humana -assim, o que nos chocava se torna ainda mais próximo.

Tanto em O Bebê de Rosemary (Rosemary’s Baby, 1968) quanto em O Iluminado (The Shining, 1980) existe esta construção do medo. Partindo de um cenário inicialmente comum e agradável, dando dicas sutis das partes sombrias da psique humana até mostrar o ápice da auto-dúvida e desconfiança, ou da paranóia dos outros e de si mesmo. Ambos trazem a sensação de que algo não está normal, que enerva lentamente, fazendo com que nós duvidemos do próprio ambiente, das próprias crenças e ideias. Para tal, no primeiro caso, há um quê de misticismo e bruxaria no enredo, que alimenta o pavor que compartilhamos com Rosemary. Já na obra de Stanley Kubrick, a trilha sonora de compositores como Béla Bartók, que se adensa com o passar do tempo e a insanidade de Jake ferem o reconhecimento do nosso próprio autocontrole.

 

 

Temáticas do terror psicológico

Para gerar essa aproximação, alguns roteiros também fizeram uso desse desequilíbrio mental: no longa independente Coyote (Idem, 2014), Bill Oberst Jr.é um escritor insone, cujas alucinações o levam à uma violenta paranoia, juntando momentos de horror e terror intenso que o tornou tão polêmico, sendo exaltado em algumas premiações e banido em outras.

Do mesmo modo, lendas urbandas e creepypastas moveram tramas como Ringu (Idem, 1998), conhecido pela sua adaptação norte-americana, O Chamado (The Ring, 2002). Entre as películas japonesas de destaque, assim como Ringu, está Noroi, A Maldição (Noroi, 2009). O longa consiste num mockumentary, um documentário fictício que funciona como um quebra cabeças, mesclando as imagens feitas pelo protagonista e pelos programas de televisão japoneses. A trama segue a estética do found footage, já abordado no nosso site, e todos os acontecimentos e gravações são importantes para entender a maldição do filme.

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Existem também produções que buscam o macabro e sombrio. Um exemplo curioso desse nicho será o Phantasmagoria: The Visions of Lewis Carroll, em que assistiremos a perniciosidade de uma Alice sinistra que atormenta seu criador Lewis Carroll, interpretado por um não menos medonho Marilyn Manson. O projeto, que esteve parado por cinco anos, liderado pelo cantor, voltou a ser gravado no ano passado.

Independente da temática e do estilo, o terror psicológico é um gênero rico e envolvente. Qual o seu filme preferido?

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