A juventude é, mais vezes do que não, definida só por ser juventude. Entre uma vida escolar qualquer e revoltados desesperançosos, vão se fazendo retratos típicos. Cada lado em busca de suas perspectivas únicas através dos estereótipos.
Quanto a isso, We Are Who We Are (2020), de Luca Guadagnino, se situa em uma zona cinzenta. A minissérie foi perfeitamente lançada após o fenômeno de Euphoria (2019) e a renovação do interesse por superproduções que captem realidades simples, mas grandiosas — que aproveitem o sub-representado ponto de vista da geração Z, cheio de fluidez e extravagância.
A sinopse não é longa. Em uma base militar estadunidense na Itália, dois adolescentes, Fraser (Jack Dylan Grazer) e Caitlin (Jordan Kristine Seamón), desenvolvem um laço inquebrável enquanto exploram questões identitárias e dificuldades de suas criações opostas.
Há, embora, um divisor de águas. Para os adultos, em algum momento não esclarecido, acabam os questionamentos ativos, e o que foi construído se torna conforto. Através de Fraser e Cate, o seriado aborda com proeza o breve — e tão facilmente esquecido — momento no qual, sem barreiras emocionais convincentes, resta apenas o mistério da própria exploração, solitária ou com ajuda do olhar mais carinhoso do outro.
Os episódios são como memórias avulsas, despreocupados com o desenrolar passo a passo de linhas narrativas. As cenas que se congelam repentinamente parecem registros feitos ao vivo, fixados na mente dos personagens. Até mesmo a linha temporal cria sua própria atmosfera nostálgica, no passado recente do ano de 2016.
We Are Who We Are é única ao dispor a juventude não em sobreposição ao militarismo e ao conservadorismo do início da era Trump, nem em confronto direto através de diálogos expositivos. A minissérie estabelece um belo diálogo, verossímil e crítico, que considera seus personagens capazes de lidar com e refletir o mundo em que vivem, cheios de respostas vindas da incerteza, dor, cinismo e existencialismo próprios.
No centro disso, Jack Dylan Grazer entrega uma performance fascinante e eclética sob o figurino de Giulia Piersanti. Fraser é desafiador e conflituoso (consigo e com outros), e se veste não pela aceitação alheia, mas pelo reverso.
O personagem é arrogante do jeito que só adolescentes intelectuais conseguem ser. Também é agressivo, assim como vulnerável e ansioso feito qualquer jovem com uma obsessão amorosa impossível, ou uma amizade forte demais. Jack nunca perde o ritmo de seus trejeitos — o número musical de Time Will Tell é um bom estímulo para se assistir à série. O resto do elenco tampouco tropeça em momento algum. O retrato, como um todo, nunca deixa de ser poético.
Tão seguro de si mesmo em seu título (“somos quem somos”), é um seriado de improvável reprodução, uma convergência das vozes certas no tempo certo, ao som certo do compositor Devonté Hynes, o Blood Orange.
We Are Who We Are é um espetáculo de humanidade plural e contraditória, que, se acusado de irregular, dado o número de narrativas abordadas, é apenas pela própria natureza. Talvez a obra mais complexa do diretor Luca Guadagnino, é destruidora como uma tempestade frenética e acalentadora como uma viagem ao lado de sua pessoa favorita.