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Dos palcos para as telas: o renascimento do teleteatro

No dia 18 de setembro de 2020 a televisão brasileira completou 70 anos. Durante a maior parte de sua existência a televisão foi o principal veículo de informação, lazer, cultura e entretenimento para a população nacional. Os empresários, no início da TV brasileira, tinham o desejo de criar uma TV com um conteúdo cultural e …

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No dia 18 de setembro de 2020 a televisão brasileira completou 70 anos. Durante a maior parte de sua existência a televisão foi o principal veículo de informação, lazer, cultura e entretenimento para a população nacional. Os empresários, no início da TV brasileira, tinham o desejo de criar uma TV com um conteúdo cultural e artístico, por isso o formato encontrado para explorar esse objetivo foi o teleteatro.

Símbolo da TV Tupi, expoente do teleteatro. [Imagem: Reprodução/Wikimedia Commons]
Símbolo da TV Tupi. [Imagem: Reprodução/Wikimedia Commons]
O teleteatro é uma linguagem construída a partir da ficção com atores e atrizes encenando ao vivo para o público da televisão. Em outras palavras, os teleteatros são peças teatrais transmitidas em tempo real. Na década de 1950, a pioneira TV Tupi possuía uma estrutura semelhante à dos grandes estúdios de cinema brasileiros, com câmeras, refletores e cenários. Em 1956, na cidade de São Paulo, a TV deu início à transmissão do programa Grande Teatro, que brindava os telespectadores com adaptações de peças de teatro e romances literários.

O primeiro teleteatro produzido no Brasil foi A Vida por um Fio, de Cassiano Gabus Mendes, uma adaptação do filme Sorry, Wrong Number, de 1948, dirigido por Anatole Litvak.

Outro nome que surgiu no período foi o paulistano José Alves Antunes Filho, que iniciou sua carreira no Teatro Brasileiro de Comédia (TBC). Sua estreia profissional aconteceu ao dirigir uma das primeiras produções de teleteatro na América do Sul para a Tupi, o Week-end, com Nicette Bruno e Paulo Goulart. Outros grandes nomes da arte dramática também vieram do teleteatro e estavam presentes no elenco fixo da TV Tupi, como as atrizes Fernanda Montenegro e Nathália Timberg.

Fernanda Montenegro e Sérgio Britto no teleteatro 'A Casa em Ordem', em 1963. [Imagem: Reprodução/Cedoc – Funarte]
Fernanda Montenegro e Sérgio Britto no teleteatro ‘A Casa em Ordem’, em 1963. [Imagem: Reprodução/Cedoc – Funarte]
Depois de 70 anos, o teleteatro ainda permanece vivo na memória de quem o acompanhou à época pelo marco que deixou na história televisiva brasileira. Aos poucos, o formato do teleteatro foi sendo substituído pelas telenovelas, que são exibidas até o dia de hoje.

Mas outro fenômeno se iniciou, antes mesmo do aniversário de 70 anos da televisão. O teatro mais uma vez passou dos palcos para as telas. Dessa vez, devido à pandemia da Covid-19 e a impossibilidade da presença do público nos assentos dos espaços teatrais. Os espetáculos passaram a ser on-line e transmitidos ao vivo e com a participação dos espectadores. Seria o teatro on-line o renascimento do teleteatro?

 

Os espetáculos on-line

Sem a possibilidade de reunir o público nas plateias dos teatros, artistas e companhias estão se reinventando e criando espetáculos on-line transmitidos por plataformas como Zoom e Google Meet, ou através de lives nas redes sociais. A experiência é diferente da presencial e a interação com o público, algo muito importante no teatro, é feita de maneira diferente.

Um dos exemplos de produções on-line é o Teleteatro Ao Vivo que vem sendo feito na Oficina Cultural Maestro Juan Serrano da Cohab Taipas, em São Paulo, e que faz parte do programa da Secretaria de Cultura do Estado de São Paulo. Os espetáculos são interativos: durante a transmissão é feita uma pausa e o espectador consegue definir o final da peça. Isso funciona da seguinte forma: durante a live do espetáculo, próximo da reta final, uma pausa é feita na peça, os atores perguntam aos espectadores qual caminho deverá ser tomado pelas personagens, e os espectadores podem responder pelo chat.

De acordo com Waltinho Ribeiro, que é produtor da Dona Mirna Cia de Arte e participa das produções do Teleteatro Ao Vivo, essa interação é essencial: “O público dá uma energia para o ator e diretor. É como um pingue-pongue, você manda o espetáculo e a reação do público reflete em quem está no palco. Seja em riso, em choro, aquilo volta para nós. No teatro on-line, o público também passa uma energia para os atores, mesmo que pela interação por chat ou expressão faciais, é diferente do presencial, mas ainda é muito importante”, diz Waltinho.

Para Rafael Cardoso, coordenador da Oficina Cultural Maestro Juan Serrano e idealizador do Teleteatro Ao Vivo, o teatro on-line é diferente do teleteatro, é uma nova modalidade de apresentação, mas tem como referência o teleteatro da década de 1950. Rafael ainda acrescenta que um espetáculo on-line é diferente de outras produções, como uma novela, websérie ou até mesmo um espetáculo gravado. “Não é uma câmera que está transmitindo um espetáculo. O teleteatro é um espetáculo feito para o audiovisual, existe a preocupação de envolver o público pela tela”, ressalta.

Para a produção do teatro on-line é preciso trabalho em equipe e uma união de esforços. Sobre o aspecto técnico, o teatro on-line demanda estúdio, câmeras, microfones, iluminação, fundo de chroma-key — a famosa tela verde —, switcher e mesa de corte em tempo real. Sobre o aspecto teatral, é necessária a adaptação do texto, a escolha da trilha sonora, a escolha do cenário — ou imagem que será projetada em um chroma-key—, figurino e ensaio, que inclui a preparação vocal e o texto decorado.

“Nós chegamos a utilizar até cinco câmeras no Teleteatro Ao Vivo. Elas ficam posicionadas em todos os ângulos possíveis para captar a melhor imagem da peça. Isso porque não estamos no palco, onde há uma marcação, então é preciso fazer esse posicionamento de imagem ali na hora. Também utilizamos microfones nos atores, controlamos o áudio e a trilha sonora. Para o cenário, utilizamos o recurso do chroma-key para brincar com o fundo e dar um ar mais lúdico. Também cuidamos da iluminação, pensando em oferecer a maior qualidade de imagem possível”, explica Rafael Cardoso.

Cabe aos diretores, atores e produtores montarem o roteiro pensando em possíveis finais para a peça. Como o espetáculo é interativo, em dado momento é feita uma pausa, na qual o público escolherá entre dois finais. Portanto, a dramaturgia precisa caminhar, com coerência, para ambos os finais. Além de que todos os atores e atrizes devem estar bem preparados para interpretar ambos.

“Como a maioria do nosso público é infantil, nós fazemos adaptações de contos famosos como O Pequeno Príncipe, João e Maria, A Branca de Neve, entre outros. Com a ajuda do dramaturgo e do diretor, nós escrevemos o roteiro iniciando com a narrativa clássica, e a partir dela nós criamos dois finais alternativos. O primeiro é o desfecho do conto como todos conhecem. O segundo é algo novo, inventado por nós, mas que não foge do contexto da história. Curiosamente, o público prefere, na maioria das vezes, o final que eles ainda não conhecem”, diz Waltinho Ribeiro.

Peça ‘João e Maria: Experimentação em Teleteatro ao Vivo’. [Imagem: Divulgação/Dona Mirna Cia de Arte]
Peça ‘João e Maria: Experimentação em Teleteatro ao Vivo’. [Imagem: Divulgação/Dona Mirna Cia de Arte]
Para o diretor e professor de teatro Eric Côco, os ensaios on-line são uma nova experiência. “No início da pandemia estávamos tão preocupados com o que estávamos perdendo em relação ao teatro que acabamos não percebendo o que estávamos ganhando. Estávamos ganhando a chance de sair da caixa, ser ousados e entender que tudo é possível, basta a gente acreditar e insistir”, conta.

Eric ainda acrescenta os inúmeros desafios para os ensaios online: os ruídos da família que está em casa, o animal de estimação que quer atenção, o celular que recebe notificações e se torna uma distração. Por isso, ele pontua que é imprescindível muita disciplina para que os colaboradores do teatro consigam completar seus exercícios, com supervisão online. “Como diretor, tive que me atentar a todos esses detalhes e dar suporte para meu elenco para que pudéssemos alcançar nosso objetivo”, diz.

A presença do público no teatro presencial costuma ser vista como um termômetro da peça para alguns atores ou diretores. Na modalidade on-line, essas reações não podem ser avaliadas pelos artistas, porque as câmeras e microfones precisam estar desligados durante a apresentação. Mas, ainda é possível manter uma interação entre plateia e artista.

“Durante a cena, infelizmente não conseguimos sentir a resposta imediata do público. Mas no final da apresentação, a gente faz um convite para quem quiser abrir a câmera e o microfone conversar um pouco conosco. O grande diferencial do teatro on-line acredito que seja isso. Essa troca que podemos ter com os espectadores de conversar e ouvir os seus pensamentos sobre o que acabaram de assistir. No presencial, isso acaba não acontecendo muito, são poucos espetáculos que têm essa troca imediata”, comenta Eric Côco.

Já para Rafael Cardoso, o objetivo do Teleteatro Ao Vivo é aproximar o público. “A nossa proposta é interagir com o público, trazer calor humano para o camarote virtual e refletir esse calor para quem atua. O teleteatro on-line não substitui o teatro presencial, tampouco substitui as novelas. É uma outra modalidade”, ressalta.

 

Projeções para o teatro on-line após a pandemia

Manter o Teleteatro Ao Vivo é uma possibilidade na visão de Rafael Cardoso, que pensa nos públicos que costumam não ter acesso às produções teatrais presenciais, como por exemplo crianças internadas, crianças em abrigos, casas-lares e Fundações Casa. “Nós temos parcerias com escolas, com a AACD aqui da região, que assistem às nossas produções. Há crianças no Hospital do Câncer que assistem ao nosso teleteatro. Além delas, há as crianças cujos pais não conseguem levá-las até um teatro, devido à distância, questões financeiras, e nosso projeto as aproxima do teatro. Atender a esse público é muito importante para nós, então acredito que o teleteatro permanecerá tendo essa ênfase”, explica.

Já de acordo com Eric Côco, mesmo que o teatro on-line tenha seus desafios e exija uma série de adaptações, essa modalidade tem grande potencial. “Durante a pandemia, eu dirigi aproximadamente 40 pessoas para quatro espetáculos diferentes que precisavam estrear ainda neste ano de 2020. Para mim, é uma modalidade que seguirá existindo mesmo em um mundo pós-pandemia. Com essas apresentações, tivemos a oportunidade de apresentar o nosso trabalho para pessoas do Canadá, Holanda e Estados Unidos, por exemplo. A vida está em constante evolução e o teatro também”, finaliza.

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