Como em um livro, o longa 2 Outonos e 3 Invernos (2 automnes 3 hivers, 2018) é dividido em partes, capítulos e contato por um narrador. Este último varia: em alguns momentos é um narrador onisciente e, em outros, são os próprios personagens que contam a história. De início, a ideia de o filme ser narrado agrada. O narrador onisciente apresenta os três personagens principais e também divaga, de forma poética, sobre a vida que cada um teve até chegar naquela cena.
No entanto, com o decorrer da trama e o passar dos capítulos, os personagens começam a falar sobre suas próprias histórias e sentimentos. Essa estratégia poderia ser boa, mas depois de 30 minutos se torna cansativa e confusa demais. Faltam silêncios no filme, não há tempo para absorver e assimilar o sentimento de cada um, distinguindo-os. Com o decorrer, se tem a impressão de que as falas são arbitrárias e simplesmente jogadas, não há mais linha de raciocínio.
O ponto em comum entre todas as narrações, no entanto, é que elas carregam muita ironia ao descrever as cenas. Isso traz um aspecto cômico natural ao longa.
A trama gira em torno de três personagens principais. Arman (Vincent Macaigne), sua namorada Amélie (Maud Wyler) e seu melhor amigo Benjamin (Bastien Bouillon). Durante 2 outonos e 3 invernos as vidas deles se cruzam e grandes encontros acontecem. Em resumo, é mais um filme millenium que tenta contar sutilmente a história da ascensão e queda de um relacionamento.
Como bom longa jovem adulto, inclui no roteiro algumas das principais questões desta faixa etária: a depressão que se dá após graduação na universidade, a síndrome de querer mudar o mundo e “ser alguém grande”, de preferência artista, o receio de que, no fundo, cada um se odeie e odeie aquilo que está se tornando e, por fim, o medo de não conseguir viver sem o outro.
Mas as questões existenciais não são a parte principal, e sim a história de amor. 2 Outonos e 3 Invernos é um filme sobre conhecer pessoas, se abrir, e compartilhar detalhes. Com grandes referências da trilogia Antes do Amanhecer (Before Sunrise, 1995), Antes do Pôr do Sol (Before Sunset, 2004), e Antes da Meia Noite (Before Midnight, 2013), o mais importante não são os acontecimentos, e sim os diálogos.
Não há grandes reviravoltas, mesmo a maior ocasião do filme é tratada com simplicidade e discrição. No entanto, em tudo há um excesso de detalhes. Na expressão de cada ator, no cenário, nas falas e, principalmente, nas conversas.
Esse excesso e essa calma com a qual a história é desenrolada demonstram realisticamente o que é conhecer uma pessoa. O realismo é tão preciso que, em um determinado momento, se sente até uma certa preguiça de seguir adiante. Preguiça de conhecer pessoas e de todas etapas que este processo envolve.
Para além do desenrolar da história, o realismo do filme também abarca a construção individual de cada personagem. Arman, Amélie e Benjamin são pessoas reais (e não muito especiais). Podemos encontrar as características deles em colegas de trabalho e mesmo em nossos amigos. Se essa história de amor tivesse de fato acontecido, não surpreenderia.
O diretor francês Sébastien Betbeder utiliza alguns recursos para prender o público na trama. Da metade do filme em diante se inicia uma espécie de contagem regressiva: será que o namoro de Arman e Amélie vai terminar com casamento, separação ou morte?
2 Outonos e 3 Invernos estreia dia 6 de dezembro no Brasil. Confira o trailer:
por Mariangela Castro
mariangela.ctr@gmail.com