Jornalismo Júnior

logo da Jornalismo Júnior
Generic selectors
Exact matches only
Search in title
Search in content
Post Type Selectors
Generic selectors
Exact matches only
Search in title
Search in content
Post Type Selectors

45ª Mostra Internacional de SP | ‘18 ½’

A ressurreição do Watergate pelo diretor indie Dan Mirvish

Em 1972, quando Carl Bernstein e Bob Woodward, repórteres do Washington Post, decidiram investigar a prisão de cinco pessoas que tentavam fotografar documentos e implementar escutas no escritório do Partido Democrata americano no Hotel Watergate, eles não poderiam prever que a reportagem em questão desencadearia na renúncia do então presidente dos Estado Unidos, Richard Nixon. Na época, a história parecia um tanto quanto aleatória. Bernstein estava prestes a ser demitido e ganhara a pauta como uma oportunidade de segunda chance de seu editor. Uma pauta que era ignorada pelos outros veículos e que já esfriava após a reeleição do candidato republicano. 

Dois anos depois do início das investigações, quando finalmente o caso Watergate estourou, o jornalismo aprendeu que tratando-se da apuração dos fatos, é praticamente impossível prever qual acontecimento ganhará o poder de mudar o curso da História. De uma forma ou outra, há um certo elemento do acaso que levou um esquema de espionagem tão estruturado, envolvendo uma complexa rede de corrupção, a ser revelado de uma maneira tão estúpida. Um acaso que, de tão trágico, chega a ser cômico. 

Por essa razão, para as gerações que não viveram o Watergate, sobretudo para quem não é estado-unidense, entender esse escândalo pode ser um tanto quanto desafiador. Afinal, se tivermos como ponto de partida a imagem de um Estados Unidos super organizado, que liderava os países capitalistas e, de uma forma ou de outra, derrotou a União Soviética no contexto da Guerra Fria, é estranho absorver a ideia de um fenômeno tão absurdo ter acontecido lá — ainda mais em plena década de 1970, quando o american way of life era despejado ao redor do mundo. 

Nesse sentido, 18 ½ (2021), o novo filme do veterano Dan Mirvish, é interessante. A obra propõe uma imersão na atmosfera insana própria do espírito daquele tempo, trazendo para o presente a oportunidade de especular sobre o que aconteceu para que os fatos tenham se sucedido da maneira que ficou marcada na História. 

Para tanto, Mirvish joga com a imaginação. A narrativa é centrada no mistério dos 18,5 minutos de áudio que foram ocultados das fitas entregues à Suprema Corte americana por Nixon em 1974. Na versão proposta, a gravação cai nas mãos da protagonista Connie (Willa Fitzgerald), que decide entregá-la à imprensa. Uma tarefa que vai se tornando cada vez mais difícil à medida que os outros personagens — inclusive o próprio jornalista Paul (John Magaro) — parecem estar a tal ponto hipnotizados com as revelações do Watergate que não conseguem agir naturalmente.

 

Imagem de uma secretária atendendo um telefone cercada por uma mesa cheia de papéis e equipamentos.
Na justificativa oficial apresentada pela equipe de Nixon para o desaparecimento dos 18,5 minutos das fitas de áudio entregues à Suprema Corte, foi dito que a gravação foi acidentalmente danificada pela secretária privada do ex-presidente, Rose Mary Woods. A foto acima foi usada como demonstração de como Woods teria se confundido e deletado o trecho de 18,5 minutos enquanto atendia ao telefone. [Imagem: Reprodução/U.S. National Archives and Records Administration]
É verdade que 18 ½ consegue simular o que foi estar nos Estados Unidos naquele momento. A ambientação é muito bem executada, destacando-se pela fotografia e figurinos que constroem com precisão a estética setentista. Por outro lado, o ritmo extensivamente lento da primeira parte transmite a sensação que o filme ficará só nisso: reconstruir o passado com um cenário bonito para contar uma história genérica. Uma decepção para quem ficou curioso com a sua premissa. 

Pouco a pouco, Mirvish até consegue voltar a instigar a curiosidade do espectador. Depois da metade, o plot finalmente ganha velocidade, dando indícios que algo de interessante vai acontecer. O problema é que, para quem está entediado desde o começo, a sensação de passagem do tempo está mais aguçada e, por mais que a promessa seja bem construída, é inevitável achar algumas cenas demoradas. Cenas que talvez em outros contextos poderiam até ser cativantes — quem assistiu ao filme vai concordar que o monólogo de Lena (Catherine Curtin) com certeza seria melhor apreciado se não tivéssemos que escutá-lo por longos minutos. 

 

Cena de 18 ½ em que os personagens vestem roupas sociais cinzentas e azuladas, com uma parede azul clara nos lados e um cômodo em cor creme, com uma brecha de luz solar no fundo.
John Magaro como Paul (esq.) e Willie Fitzgerald como Connie (dir.). [Imagem: Divulgação/Waterbag Eater fil, LLC.]
A parte boa é que no final o filme é mais que surpreendente. Com um desfecho absolutamente nonsense, 18 ½  vinga quase antes de acabar. Uma surpresa que é positiva a ponto de nos perguntarmos se o roteiro do restante da obra não foi estrategicamente planejado para chegarmos mais vulneráveis à conquista dos últimos minutos. Nesse raciocínio, até a cena de ação mal executada fica intrigante — será que não fazia parte do plano de deixar a atmosfera ainda mais aleatória? A mim, seria uma escolha mais que adequada, se contextualizada nas loucuras que realmente aconteciam na Guerra Fria. 

Nota do Cinéfilo: 2,5 de 5. Mediano.

 

Esse filme faz parte da 45ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo. Para mais resenhas do festival, clique na tag no final do texto. Confira o trailer:

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Rolar para cima