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‘Dance Fever’: uma ode à performance

Imagine que o mundo estivesse enfrentando uma nova pandemia. Nesse contexto, as pessoas seriam contaminadas por um vírus que as faria querer dançar até a exaustão. É nesse cenário — não totalmente hipotético — que a banda britânica Florence + The Machine se inspirou em seu quinto álbum de estúdio, lançado na última sexta-feira, 13, …

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Imagine que o mundo estivesse enfrentando uma nova pandemia. Nesse contexto, as pessoas seriam contaminadas por um vírus que as faria querer dançar até a exaustão.

É nesse cenário não totalmente hipotético que a banda britânica Florence + The Machine se inspirou em seu quinto álbum de estúdio, lançado na última sexta-feira, 13, intitulado Dance Fever

 

 

Capa do álbum Dance Fever, da banda Florence + The Machine. Num fundo preto com ramos verdes, há uma lua dourada com uma mulher ruiva branca com flores roxas nos cabelos no centro. Ela usa uma capa dourada e preta, com as mãos no peito.
O conceito por trás da capa do disco é criação da diretora Autumn De Wilde, do filme “Emma” (2020) [Imagem: Divulgação/Florence + The Machine]

 

Em julho de 1518, em Estrasburgo, na França, uma mulher identificada como Frau Troffea dançou pelas ruas da cidade de maneira frenética, sem motivo aparente. O que poderia ser um ato isolado e facilmente esquecido contagiou cerca de 400 pessoas dentro de um mês a fazerem o mesmo, o que levou muitas delas a ataques cardíacos, derrames e até à morte. 

Saindo do aspecto penoso e sombrio desse episódio, o disco se aventura em temas como a paixão pela arte e pela expressão exagerada desse sentimento. Também, se aprofunda na própria performance musical e o que ela representa. Ele carrega nele, além disso, reflexões feitas pelos musicistas da banda durante a pandemia, que estabelecem um novo sentido para o grupo. 

Desde a era vitoriana até histórias de horror, a banda reuniu referências e as transformou em “algo decorativo”, conforme as palavras da vocalista Florence Welch, para o Spotify. Todos esses elementos místicos e fantasiosos reuniram-se para contar uma história que, apesar de simbolizar o universal e o apelo ao desconhecido, também dizem muito sobre o interior, o micro e o individual. 

 

Em um fundo cinza de pedras, há uma mulher ruiva e branca deitada com uma faixa preta na cabeça e vestidos pretos. A vocalista de Florence + The Machine encara a câmera para divulgar seu novo álbum, Dance Fever.
Florence Welch fotografada pela fotógrafa e diretora de “Emma”, Autumn De Wilde. [Imagem: Divulgação/Florence + The Machine]

 

Faixa a faixa

O álbum exala movimento do início ao fim: nas transições entre as faixas, nas diferenças vocais e no retorno discreto a muitas tendências já criadas pela banda em álbuns anteriores. Segundo Florence Welch, Dance Fever soa como Lungs”, o álbum de estreia da banda, “mas com mais auto-conhecimento”.  

Não é a primeira vez que Florence + The Machine aborda a temática da liberdade da forma como faz em Dance Fever. Em Shake it Out, uma das faixas de Ceremonials, o segundo álbum do grupo, há uma celebração do que anos mais tarde se transformaria num álbum totalmente dedicado a esse sentimento intenso: “É difícil dançar com um demônio nas costas / Então, liberte-se dele”, canta Florence na música em questão. 

O tema da dança como uma forma de arte muito significativa para Florence predomina nas três faixas iniciais do álbum, principalmente pela sonoridade. 

King, a que abre o disco, é o início dessa história contada em primeira pessoa pela própria Florence. A música traz a realidade de alguém que confronta diferentes desejos sobre seu próprio destino.  A vocalista cita a vontade de ser mãe e suas reflexões sobre o verdadeiro valor da arte para a sua vida, em um desabafo sobre a insegurança que sentia em nunca poder escrever novamente. Esse momento a fez refletir sobre o que desejava para si mesma. Mesmo assim, Florence ainda se via levada a se conectar a sua maior verdade: a música. “I am no mother, I am no bride, I am king”, versa na letra que aborda decadência e grandeza ao mesmo tempo.

Em Free temos um retrato da relação da cantora com suas doenças mentais e da instabilidade que isso causa em sua vida. Quando ela dança e performa, entretanto, se sente livre, o que justifica o título da música. O ritmo é animado e caracterizado pelo frenetismo das guitarras e da bateria, em contraste direto com seu conteúdo lírico. 

Choreomania traz a contextualização para o episódio da praga em Estrasburgo e sua introdução remete fortemente a um clássico da banda, Dog Days Are Over. É uma faixa imprevisível, que em nenhum momento explode instrumental ou vocalmente da maneira que se espera, dado o contexto da letra. Apesar disso, estabelece muito bem o impulso que conduzirá o álbum ao longo das restantes 11 faixas. A partir desse momento do disco, ele passa a desacelerar, e introduz Back In Town. Essa canção, por sua vez, se aventura em temas delicados e melancólicos, junto de uma sonoridade que beira o etéreo, e que se utiliza de vocais elaborados para substituir o instrumental carregado característico das músicas da banda. 

O sopro de otimismo que ouvimos nas três faixas iniciais se dissipa após Back In Town e dá lugar a um misto de confusão, medo, horror e melancolia, mostradas de diferentes formas para o ouvinte a cada faixa. 

Em Heaven is Here reside um lado sombrio que a cantora não teme mostrar. Sua ideia era trazer a perspectiva de uma mulher destemida, que expõe sentimentos que buscamos constantemente esconder, como a revolta e o ódio. Essa temática se repete em Dream Girl Evil e Girls Against God, que trazem ao disco a perspectiva mitológica de confronto entre bem e mal. Da mesma forma, Daffodil e Cassandra inspiram-se nos mitos gregos de Narciso e Cassandra para abordar a falta de certeza e perspectivas sobre o futuro, ao lado das sonoridades mais impactantes do disco. 

Retomando as características vistas nas primeiras três faixas, chega a vez de My Love, um dos singles do álbum. Nesse momento, a cantora coloca na letra sua certeza e sua paixão em relação à música. Ela atinge uma maturidade em relação à faixa King, na qual predominava uma dúvida sobre suas próprias motivações. 

 

 

Florence + The Machine caminha para o final de Dance Fever brincando com melodias leves e letras impactantes. Em The Bomb, Florence assume amar o caos e a música soa como uma confissão dessa característica dentro de sua vida amorosa. Morning Elvis, a faixa subsequente e fechamento do álbum, com sua orquestração crescente, leva-nos à emoção de uma música que, assim como Free, saúda o sentimento de grandeza que Florence Welch sente em estar nos palcos, e que a ajuda a superar suas frustrações e problemas pessoais. A letra relembra quando Florence perdeu uma visita à Graceland, a casa de Elvis Presley, por conta de seu problema com o álcool: “Eu disse à banda para sair sem mim / vou pegar o próximo vôo / E eu vou ver todos vocês com Elvis / Se eu não sobreviver à noite”. 

A sobriedade da cantora, que completa 8 anos em 2022, ainda é um tópico a ser discutido em suas canções. A multidão que a aplaude ao final de Morning Elvis é o ponto de chegada ideal de sua trajetória pessoal contra os vícios e pela sua paixão incondicional pela música: “A maioria das coisas na minha vida melhoraram exponencialmente por não beber, mas é solitário estar sóbria em grandes turnês (…) são as pessoas nos shows que me salvam”, disse a cantora para a ES Magazine, em 2019

O disco ainda conta com alguns interlúdios. Entre eles, Prayer Factory, levando para o meio do álbum, e Restraint, conduzindo o ouvinte ao final, e que têm o papel fundamental de criar a expectativa para as diferentes fases desse álbum.

Com a entrega de um álbum tão profundo e genial, a impressão que Florence + The Machine deixa é que Dance Fever foi feito para inaugurar uma era de euforia e gosto pela reinvenção, bebendo das fontes da individualidade e da auto-reflexão. É a aposta da cantora e frontwoman da banda em encontrar um novo caminho para si mesma, entender sobre o seu passado e confrontar seu presente, ainda que o futuro seja incerto e assustador. 

 

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