[Deixe-me Entrar]
Owen, um esquisito garotinho de 12 anos, vive no subúrbio de New Mexico com a mãe recém-divorciada. Seu correspondente original, Oskar, habita um lugar semelhante nos arredores de Estocolmo, porém um tanto menos demoníaco por assim dizer. “Deixe-me Entrar” (Let me in), do diretor Matt Reeves, é a regravação precipitada do bem-sucedido sueco “Deixa Ela Entrar” (Låt den rätte komma in), de 2008.
A esquisitice de Owen tem lá seus motivos explicados pela psicologia juvenil: pais em separação, aparência física mirrada e, acima de tudo, o bullying sofrido na escola. Por essas e outras, é supostamente justificável que pratique em casa a vingança em frente ao espelho, ou que desconte o remorso fraco esfaqueando a provocadora árvore do parquinho. É aceitável, principalmente, que a ainda mais estranha garota que acaba de se mudar para o apartamento ao lado surja descalça sobre a neve que cobre o trepa-trepa e lhe dirija a palavra, tentando manter uma conversa normal. Afinal, palavras decentes não lhe são dirigidas todos os dias por crianças de sua idade.
Abby, ou Eli, tem exatamente a mesma idade que Owen, ou mais ou menos isso. Os diálogos das duas crianças no parquinho mantêm a fórmula original da sensível descoberta do mundo estranho. Abby incentiva Owen a enfrentar os garotos mais fortes do colégio. Owen lhe apresenta em troca o cubo mágico e a bala de mascar.
Enquanto se conhecem, estranhos assassinatos de jovens atléticos tomam parte na pacata cidade. Como qualquer filme de terror que se preze, não são fatos isolados. Assim como a esquisitice da garota ao lado não é explicada por motivos que não sobrenaturais. O enredo ganha pontos ao não tentar rotular sua existência com figuras típicas do terror – e que já se tornaram excessivamente carismáticas. Quando questionada por Owen se era um vampiro, Abby apenas responde que precisa de sangue para sobreviver.
O desenrolar do filme diverge do original pelos detalhes macabros. A nova versão americana demoniza as ações, tirando a atenção do enredo para o grotesco. Se, no original sueco, o sangue que mancha a neve pinta os conturbados relacionamentos, no americano, rouba a cena o terror que seus espectadores tanto adoram. Ganha em efeitos especiais, perde em sensibilidade.
Por Beatriz Montesanti