Draco Lúcio Malfoy (Tom Felton) é um bruxo do universo de Harry Potter (Daniel Radcliffe), o qual possui um papel próximo à antagonista durante toda a saga. Ele vem de uma família puro-sangue, filho de Lúcio (Jason Isaacs) e Narcisa Malfoy (Helen McCrory), e tem muito orgulho disso, uma vez que acredita na superioridade do sangue que não foi misturado com “trouxas” (não-bruxos).
Assim como o resto de sua família, Draco é selecionado para a Sonserina, casa de Hogwarts representada pela cobra. As qualidades mais marcantes dos sonserinos são astúcia, liderança, individualismo e ambição. Contudo, a casa também tem a fama de abrigar vilões e, por isso, é vista com maus olhos por toda Hogwarts (especialmente por Harry Potter). Mas seria Draco mesmo um vilão, como estipula Harry, ou apenas uma criança envolta de más influências?
Bom, é isso que discutiremos nesta matéria.
Gostaria de fazer um parêntesis e adicionar que irei analisar a redenção de Draco com base em três de seus relacionamentos: com Harry Potter, com seu pai Lúcio Malfoy e com Voldemort (Ralph Fiennes). Tais relações moldam ele como pessoa e elucidam melhor suas intenções e o funcionamento de sua psique. Dito isso, vamos à análise.
Draco e Harry: rivalidade madura ou inveja infantil?
Draco e Harry possuem a mesma idade, atendem a mesma escola, vêm de famílias ricas de puro-sangue e jogam quadribol na mesma posição. Mas as semelhanças param por aí, já que ambos os personagens foram escritos para serem opostos.
A diferença fundamental entre Harry e Draco está no que eles valorizam. Enquanto Harry considera a amizade e o amor como bens mais importantes, Draco estima (por influência de seus pais) o status. Essa distinção fica clara quando examinamos os melhores amigos de ambos os personagens. Harry cultiva uma relação de extrema confiança e companheirismo com Ron (Rupert Grint) e Hermione (Emma Watson), os quais conheceu por acaso no Expresso de Hogwarts. Porém Draco é melhor amigo de Crabbe (Jamie Waylett) e Goyle (Joshua Herdman), ambos provindos de outras famílias de puro-sangue e pertencentes à Sonserina.
Essa oposição moral de valores faz com que ambos se enxerguem como inimigos. Draco, então, procura meios de prejudicar Harry durante os oito filmes. Em Harry Potter e o Cálice de Fogo (Harry Potter and the Goblet Fire, 2005), por exemplo, ele faz broches ofendendo Harry e os distribui pela escola inteira. Apesar da desagrádavel insistência, Draco atrapalha a vida de Harry de modo inofensivo. Isso porque é covarde e fica desconfortável com violência direta.
Mas por que o trabalho de perturbar Harry, então? Apesar de as fanfics sugerirem que ambos eram profundamente apaixonados um pelo o outro, Draco agia a partir de pura inveja. Ele era um talentoso bruxo e mesmo assim vivia na sombra da lenda “Harry Potter”.
Além de ser obviamente mimado e desejar receber na escola a mesma ininterrupta atenção que recebia como filho único de seus pais, Malfoy desconta seu ódio e frustração no menino prodígio. Com o passar dos anos, Draco é cada vez mais empurrado para o lado de Voldemort por influência de seus pais, os quais são ambos Comensais da Morte.
Todavia, como anteriormente citado, Draco não gosta de violência direta e hesita em tomar ação quando é necessário. Por esses motivos, não consegue matar Dumbledore (Michael Gambon) em Harry Potter e o Enigma do Príncipe (Harry Potter and Half-Blood Prince, 2009). Mas a pressão em fazer algo assustador e com o qual ele não concordava inteiramente corrói-o por dentro. Assim, Draco sente ainda mais remorso em relação a Harry, a imagem de tudo que ele gostaria de ser.
No final das contas, Draco nunca quis fazer mal a ninguém de verdade. Nunca quis que Harry morresse. Se ele quisesse matar Harry, ele já estaria morto há muito tempo. Apesar de não apagar que era um bully com um complexo de superioridade e obsessão com pureza do sangue, é importante entender que Draco também se encontrava num dilema moral entre aquilo que achava certo e aquilo que seus pais lhe ensinaram que era certo.
Draco e Lúcio: abuso ou criação mimada?
Sabemos que Draco convivia cotidianamente com as insistências e expectativas de seus pais sobre seus ombros. No sexto filme, Harry Potter e o Enigma do Príncipe, a situação se torna ainda mais tensa, uma vez que o menino é obrigado a se tornar um Comensal da Morte para que sua família não caia em desgraça e seja morta por Lord Voldemort. Mas será que essa pressão fraterna chegou a ser parte de uma relação abusiva?
Em primeiro lugar, vamos discutir abuso físico. Há alguns hábitos de Lúcio que sugerem que ele não era o pai mais tranquilo e misericordioso do mundo. Por exemplo, o fato de que sua bengala sambava na cara do Draco o tempo inteiro. Apesar de sugerir uma possível violência física, no sexto filme, Draco leva o objeto a Hogwarts como uma lembrança do pai. Uma vez que a bengala não pode ser tanto o objeto de agressão e de recordação, é possível concluir que ele muito provavelmente não sofria abuso físico de seu pai.
Em segundo lugar, vamos analisar negligência emocional com o apoio de um acontecimento de Harry Potter e a Pedra Filosofal (Harry Potter and the Philosopher ‘s Stone, 2001). Draco quer entrar no time de quadribol e seu pai faz com que isso aconteça. Mesmo que soe como uma ação atenciosa, será que não representa uma confusão entre dinheiro e amor? Na maioria das vezes, pais de crianças mimadas compensam a falta de tempo e afeto físico com presentes e favores.
Apesar de podermos especular sobre as intenções de Lúcio, é impossível ter 100% de certeza se ele abusava física e emocionalmente do filho e compensava com dinheiro ou se ele só era um pai encorajador com muito dinheiro e poder. Mas a partir da evidência que nos foi concedida pelos filmes, eu diria que a segunda opção é a correta.
Draco e Voldemort: fidelidade cega ou autêntico medo?
De qualquer forma, é por influência de Lúcio que Draco se transforma num bully na escola. O berço de ouro dos Malfoys lhe ensinou que sangue puro é superior e que, por isso, ele é melhor que a maioria das pessoas. Embora Draco tenha acreditado por muito tempo nessa meia verdade, ele teve um pouco mais de dificuldade em defender Lord Voldemort junto de Lúcio.
Em Harry Potter e o Enigma do Príncipe, suas responsabilidades aumentam e o Lord das Trevas espera que Draco crie uma passagem para os Comensais da Morte em Hogwarts e mate Dumbledore. O menino então procede a fazer o que lhe foi pedido, mas não acredito que sua motivação fosse pura e cega fé em Voldemort. Draco nunca quis que as coisas escalassem desse jeito. Ele nunca quis matar Dumbledore (o que ele não conseguiu fazer). Draco se tornou um Comensal da Morte pelo simples motivo de que ele tinha de ajudar sua família. O Lorde das Trevas perdia a confiança na família e ameaçava matá-los todos. Ele não tinha outra escolha nessa altura do campeonato.
Finalmente nos últimos dois filmes Harry Potter e as Relíquias da Morte – Parte 1 e 2 (Harry Potter and the Deathly Hallows – Part 1 and 2, 2010 e 2011), Draco tem uma mudança de espírito (que não é bem uma mudança de espírito, porque ele já sabia que estava no lado errado da guerra há muito tempo). Finge não reconhecer Harry, salvando sua vida, e ele e sua família trocam de lado na Batalha de Hogwarts. Apesar de não serem atos exatamente heróicos e altruístas, temos que lembrar que Draco era um covarde. Então, não podemos esperar que de um minuto para o outro ele deixe de ser uma pessoa 100% “do mal” e passe a ser uma pessoa 100% “do bem”.
Por fim, é relevante abordar aqui uma teoria da conspiração ligada ao simbolismo da varinha de Draco. Teoricamente, sua varinha seria terrível de ser manuseada por outra pessoa que não ele mesmo. Contudo, em Harry Potter e as Relíquias da Morte – Parte II, Harry usa-a. Isso só foi possível, porque ambos compartilham das mesmas intenções. Tanto Draco quanto Harry queriam derrotar o Lorde das Trevas naquele momento e, por isso, a varinha, como extensão do estado de espírito e intenções do primeiro, funcionou com o Harry.
Enfim, Draco merece uma redenção?
Nos resta a pergunta: Draco Malfoy merece uma redenção? Ele é realmente o “menino sem escolha”?
Draco era um menino de 17 anos quando teve que fazer parte de uma guerra (que ele nunca quis) com consequências muito reais e assustadoras para sua família. Ele era um menino de 17 anos quando foi designado a matar um dos magos mais poderosos do mundo. Apesar de ser um bully, ele também era uma criança com pais que lhe doutrinavam a pensar dessa forma.
Com o passar dos anos, Draco percebeu que estava errado, mas já se encontrava fundo demais no buraco que ele próprio tinha cavado. Porém, no final, ainda consegue mudar de mentalidade.
Draco Malfoy merece uma redenção, porque ele prova que as pessoas podem mudar e que não somos o produto de nossos pais. No final das contas, somos o produto de nossas escolhas e Draco escolheu o bem.