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‘Nick e Charlie’: uma continuação digna do casal

Novela da série 'Heartstopper' apresenta um olhar mais íntimo — e angustiante — para o relacionamento tão amado pelos fãs

“Estou saindo com Nick Nelson desde que eu tinha catorze anos. Ele gosta de rúgbi e Fórmula 1, bichos (especialmente cachorros), Marvel, o som de canetas hidrográficas no papel, chuva, desenhar em sapatos, Disneylândia e minimalismo. Ele também gosta de mim.” 

Charlie Spring

A série de quadrinhos Heartstopper, da britânica Alice Oseman, foi um sucesso de vendas e inspirou uma série de televisão que estreou na Netflix em 2022, cuja segunda temporada está em produção. O livro, publicado inicialmente como um webcomic em 2016, ganhou uma nova continuação, dessa vez em formato de prosa.

Ambientada dois anos depois do fim da série de livros principal, a novela Nick e Charlie (2023) acompanha o cotidiano do casal protagonista, Nick Nelson e Charlie Spring, em seus últimos anos de ensino médio, já com seu relacionamento consolidado e uma rotina vivida a dois. Na nova obra de Oseman, o amadurecimento dos protagonistas é nítido e vem acompanhado de responsabilidades e desafios para suas vidas pessoais, além de um forte abalo no relacionamento: Nick está prestes a ir para a faculdade e terá que se mudar para o outro lado da Inglaterra. Apesar de sua saúde mental ter melhorado muito com os anos, Charlie não se sente pronto para ver Nick partir, o que, em sua cabeça, parece um abandono.

Com muitas referências a High School Musical (2006), fotos analógicas e falhas de comunicação, a novela assume um tom mais melancólico, dando palco para as emoções negativas e confusas de Nick e Charlie, além de retratar a maior briga já protagonizada pelo casal. Mesmo assim, a autora foi capaz de manter o clima leve e cativante característico de seus livros e tão amado pelos fãs. É possível notar o amadurecimento de ambos também em relação às suas sexualidades: Nick se sente muito mais confiante e confortável em falar que é bissexual, e Charlie não tem mais medo de voltar a sofrer bullying — e tampouco teme que Nick se torne vítima das agressões psicológicas. 

 “Hoje em dia, não temos mais que ter medo por aqui.

Seguro a mão dele sempre que quero.”

Charlie Spring

Imersão

Por ser escrita pelas perspectivas de Nick e Charlie, que se alternam entre capítulos, é possível entender a história a partir de ambos os pontos de vista, o que contribui para a imersão no enredo e no psicológico dos personagens. O leitor tem acesso a informações que os personagens não têm, o que, além de gerar angústia pela falta de comunicação, também permite maior proximidade com o  relacionamento; quem lê acessa “segredos” entre os personagens — como surpresas planejadas entre eles ou a intensidade com que se amam e sentem falta um do outro.

Essa imersão contribui para uma leitura muito rápida: são apenas 168 páginas, a fonte é grande, os capítulos são curtos e o enredo, envolvente. Por isso, é um livro que pode ser facilmente lido em um único dia.

A obra é dividida em partes sinalizadas por uma página inteira coberta de desenhos. [Imagem: Acervo Pessoal/Julia Alencar]

Essência dos quadrinhos

Uma das características mais marcantes de Heartstopper é o fato de ser uma história em quadrinhos. Apesar de não seguir esse formato, Nick e Charlie consegue manter a essência, inserindo ilustrações dos protagonistas e de cenas ao longo do texto. Essas imagens, normalmente de momentos românticos do casal ou de cenas importantes para o enredo, lembram o leitor da série principal e contribuem para o imaginário do que está acontecendo — além de serem encantadoras.

Um dos principais elementos da identidade visual do universo Heartstopper são as folhas de árvore coloridas, que podem ser vistas nas capas e contracapas, nos quadrinhos, seguindo o esquema de cores predominante neles, e até mesmo na série de televisão, incorporadas como detalhes em alguns momentos para contribuir com a ambientação e expressão de emoções dos personagens. Na novela não é diferente, apesar de estarem em tons de cinza. As icônicas folhinhas podem ser vistas na contracapa do livro e ocasionalmente ao longo da leitura.

Nick usando uma camiseta com a estampa de folhas, ao lado de Tori, irmã de Charlie. Ao longo da narrativa, a relação dos dois é explorada mais a fundo, impulsionada pela confusão de Nick acerca do comportamento de Charlie. [Imagem: Acervo Pessoal/Julia Alencar]

Eles roubam a cena

O livro, é claro, não tem Nick e Charlie como os únicos personagens. Nesse sentido, a obra agrada especialmente os fãs de Tori, irmã mais velha de Charlie, que ganha muito mais destaque e participação do que na série principal. Sempre muito racional para balancear o lado emotivo de Charlie, Tori é crucial tanto para a estabilidade mental do irmão — por ser sempre compreensiva e preocupada, sem violar os limites impostos por ele — quanto para o sucesso de seu relacionamento. Para aqueles que gostariam de ver ainda mais de Tori e sua história, Um Ano Solitário (Travessa, 2014), o primeiro livro de Oseman, acompanha a trajetória da jovem em seu segundo ano do ensino médio, revelando eventos anteriores à Heartstopper e proporcionando uma visão mais aprofundada de seu comportamento e pano de fundo.

Tori e Charlie no sofá, conversa em que Tori dá conselhos para seu irmão. [Imagem: Acervo Pessoal/Julia Alencar]

Outros personagens queridos pelos fãs, como os amigos do casal, Tao e Elle, também aparecem no livro, mas de forma muito secundária: suas personalidades não são desenvolvidas na narrativa e eles possuem poucas falas. Darcy e Tara, também integrantes do grupo formado por Nick, Charlie, Tao e Elle, não são sequer mencionadas. Aled, que nos quadrinhos não é muito desenvolvido, ganha um pouco mais de destaque na novela, mesmo que continue sendo secundário, aparecendo apenas nos momentos em que Charlie precisa de algo.


Nick e Charlie é uma leitura divertida e cativante, que relembra aos fãs o motivo de amarem tanto o casal e o universo de Heartstopper. Apesar do afastamento temporário de ambos, que deixa o leitor desesperado para terminar o livro e saber o que vai acontecer, é revigorante ler um livro LGBTQIAP+ em que a maior problemática não é a sexualidade dos personagens –- como é o caso em muitos livros com temáticas queer. Na novela, leitores da comunidade têm a oportunidade de se identificar com os personagens e aproveitar uma história com final feliz, sem serem constantemente relembrados da realidade homofóbica em que vivemos.

Foto de capa: Acervo Pessoal/Julia Alencar

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