por Breno Macário (breno.macario@usp.br)
Está acontecendo em Belém a 30ª Conferência das Partes (COP 30), uma comissão da Organização das Nações Unidas (ONU) que reúne representantes de quase todos os países do mundo para discutir ações de combate às mudanças climáticas. A COP 30 teve início na segunda-feira (10) e vai até o dia 21 de novembro.
A Agenda 2030 é um plano de ação criado, em 2015, pela Organização das Nações Unidas (ONU) e estabelece 17 objetivos globais, chamados de Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), que se dividem em 169 metas quantificáveis a serem cumpridas até 2030. Eles têm a finalidade de alcançar o desenvolvimento sustentável, integrando a proteção ambiental com questões sociais e econômicas.
Desde a década de 1990, o Brasil tem ocupado uma posição de destaque nas iniciativas ambientais da ONU. Na última década, essa postura oscilou junto do cenário político interno do país. A COP 30 é um marco importante não só para recolocar o Brasil como um dos protagonistas na luta pelo desenvolvimento sustentável, mas também para dar voz aos indígenas e outros povos tradicionais, que estão participando das negociações sobre a crise climática. Com a COP 30 em evidência e faltando um pouco menos de cinco anos para o fim da Agenda 2030, é possível acreditar que o mundo conseguirá cumprir os 17 ODS? Ou pelo menos, a maior parte deles?

O relatório Brundtland, texto publicado em 1987 pela Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (CMMAD) e intitulado como “Nosso Futuro Comum”, foi a primeira iniciativa das Nações Unidas para a sustentabilidade. Gro Harlem Brundtland, primeira ministra da Noruega na época, presidia a Comissão e o relatório leva o seu nome em homenagem. O texto define que desenvolvimento sustentável é aquele que satisfaz as necessidades do presente sem comprometer a capacidade das gerações futuras de satisfazerem as suas próprias.
Em 1992, a conferência da ONU no Rio de Janeiro (Rio 92) foi a sede da elaboração da Agenda 21, que determinava objetivos de caráter facultativo aos países para atingir o desenvolvimento sustentável. Na virada do século, elaboraram os Objetivos do Desenvolvimento do Milênio (ODM), que deixava de ser apenas um tratado que visava orientar, mas também, o firmamento de um compromisso formal. Os ODM duraram até 2015, quando foi criada a Agenda 2030, que ampliou para 17 objetivos para melhorar não só a questão ambiental, como também a questão social.
Os objetivos são globais e não há nenhum plano integrado que divide proporcionalmente as ações a serem tomadas por cada país. Cada nação se adapta à própria realidade e cria planos independentes para fazer sua contribuição ao cenário global. A ONU acompanha os dados e indicadores de cada país e faz um relatório anual informando o progresso da Agenda. Apesar de não haver sanções caso algum país não se movimente para fazer sua contribuição, integrantes das Nações Unidas exercem pressões diplomáticas.
Em entrevista a Jornalismo Júnior, Paulo Almeida, professor de Sustentabilidade e Gestão Ambiental da Universidade de São Paulo (USP), e representantes da ONG Missão Ambiental, sediada na cidade de São Paulo, dizem que alcançar o desenvolvimento sustentável é uma tarefa desafiadora, mas não impossível. Para alcançá-lo é preciso da participação ativa de diferentes setores da sociedade, mas, principalmente, do poder público.
“A crise climática não afeta a todos da mesma forma. As populações mais pobres e vulneráveis são as primeiras a sentir os impactos, como o aumento das enchentes, deslizamentos de terra, falta de água e ondas de calor. A crise climática aprofunda as desigualdades sociais. Por isso, a luta por justiça climática é inseparável da luta por justiça social”
Representantes da ONG Missão Ambiental
Etapas do progresso
O relatório de 2025, mostra que, mesmo após uma década da implementação da Agenda 2030, apenas 35% das metas estão encaminhadas, enquanto cerca de 47%, não estão no ritmo ideal para serem alcançadas até o prazo final.18% das metas estão regredindo.
Desde a implementação da Agenda 2030, os relatórios anuais também apontam avanços notáveis no acesso à educação, à ampliação de energias renováveis e à redução de doenças infecciosas, como HIV e Malária. Em contrapartida, a pobreza extrema e a insegurança alimentar ainda são problemas que têm aumentado. A ONU também relata que países mais desenvolvidos têm avançado mais do que os países com menos recursos, mas ainda assim, não estão no ritmo ideal para cumprir as metas.

Esses resultados, junto ao fato de que nenhuma das agendas ambientais propostas pela ONU jamais foi 100% cumpridas, levam o professor Paulo Almeida a crer que já não é mais possível cumprir a Agenda 2030 a tempo. “Chega a ser utópico imaginar que em pouco tempo nós fizéssemos toda a atividade que não tivemos 10 anos para fazer”, afirma.
O professor indica que, apesar da previsão do não cumprimento da Agenda 2030, é possível extrair aprendizado dos avanços e regressos. Ele também conta que é provável que as Nações Unidas elaborem um novo plano de ação a partir dos resultados da agenda atual.
“O fato de não cumprirmos 100% a linha de chegada, pelo menos no tempo que nós temos, não inviabiliza a continuidade da corrida. Nós (sociedade) chegaremos lá, essa é a expectativa, nós temos essa capacidade.”
Paulo Almeida, professor de Sustentabilidade e Gestão ambiental da USP
Protagonismo brasileiro irregular
O protagonismo brasileiro nas pautas ambientais em conferências da ONU começou na década de 1990, quando foi sede da Rio-92, que concebeu a Agenda 21. Na virada do século, o Brasil manteve um bom desempenho em relação às metas dos Objetivos do Milênio e cumpriu a maior parte dos oito objetivos.

O desempenho brasileiro é reportado no Relatório Luz, documento divulgado anualmente elaborado pelo Grupo de Trabalho da Sociedade Civil para a Agenda 2030. O último Relatório Luz, lançado em Setembro de 2025, aponta que apenas 7,1% das 169 metas têm avançado em um ritmo satisfatório. 43,4% das metas têm avançado em um ritmo insuficiente para o cumprimento e 15,4% estão em situação pior e apontam retrocesso.
O principal órgão brasileiro que monitora ações e indicadores da Agenda 2030 e repassa resultados à ONU é a Comissão Nacional para os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (CNODS), órgão público federal, vinculado à Secretaria-Geral da Presidência da República. A CNODS foi criada em 2016 e extinta em 2019, até ser recriada através de decreto presidencial em setembro de 2023.
O Brasil também criou um novo ODS interno, o “ODS 18 – Igualdade Étnico Racial”, em Novembro de 2024. O objetivo busca eliminar a discriminação contra povos indígenas, afrodescendentes e grupos populacionais afetados por múltiplas formas de discriminação.

Quais as dificuldades para o cumprimento da Agenda?
Paulo Almeida diz que o principal fator é a falta de comunicação do poder público para com a sociedade civil, que, em sua grande maioria, não conhece o assunto e não participa de ações de sustentabilidade. Ele também conta que a pandemia de COVID-19 foi um grande desacelerador da Agenda 2030 e causou prejuízos no seu progresso. Outro fator são as crises diplomáticas, como guerras.
A ONG Missão Ambiental, revelou os principais obstáculos notados na sua experiência na cidade de São Paulo. São eles: a falta de políticas públicas de longo prazo e a falta de sensibilização da sociedade civil e do setor privado. Além disso, também apontam a fragmentação de esforços, ou seja, ações isoladas que não recebem o suporte para gerar o impacto necessário, com isso, alertam para a necessidade de articulação integrada entre governo, empresas e sociedade.
Em entrevista à JPress, Alessandra Prates, membro do Grupo de Pesquisa em Relações Internacionais e Meio Ambiente (GERIMA), relaciona a pouca participação da sociedade civíl com a captura corporativa da agenda climática. Segundo ela, com grandes empresas e bancos pautando a sustentabilidade e promovendo mecanismos como o mercado de carbono, a natureza vira ativo financeiro, o que acaba institucionalizando a luta em prol da sustentabilidade e afastando a sociedade civil do processo. Como outro fator, ela aponta a centralização das negociações climáticas apenas entre Estados.
Como as contradições afastam resultado significativos
Para Alessandra Prates, a ineficiência dessa e de outras agendas das Nações Unidas está ligada à sua base ética. A pesquisadora e indigenista é crítica às lógicas que pautam as iniciativas da ONU, porque elas continuam priorizando o desenvolvimento econômico ao invés da preservação ambiental e promoção de direitos sociais.
“O problema é que as agendas não questionam o sistema que as torna necessárias. O desenvolvimento sustentável virou uma narrativa de governança global, não um projeto de transformação”, afirma Prates. “Para os povos indígenas, esse tipo de “avanço” é ambíguo, pois frequentemente vem acompanhado de novas formas de apropriação de seus territórios — agora em nome da sustentabilidade”, ela cita.
Segundo ela, as iniciativas anteriores à Agenda 2030 trouxeram avanços institucionais, mas não produziram resultados significativos porque não questionam o alicerce do problema, isto é, as estruturas de poder que produzem desigualdade e destruição ambiental. Ela acrescenta que as agendas revelam “um progresso técnico, mas não ético ou político”.
Alessandra aponta a perpetuação da lógica colonial como um grande obstáculo para resultados mais eficientes. Para ela, “o sistema internacional é desigual por natureza”. Ela justifica seu ponto citando o fato de que países do Norte global são os principais emissores de gases de efeito estufa e, hoje, têm autonomia e recursos para coordenar as iniciativas. Enquanto isso, países do Sul global são os que mais sofrem as consequências da crise climática e precisam assumir compromissos sem autonomia e com menos financiamento e tecnologia para realizar medidas em prol da sustentabilidade. As métricas dos ODS são universais e desconsideram diferentes contextos culturais e territoriais.
Outro fator que desacelera o progresso é a contradição sistêmica entre metas econômicas e ambientais. A doutoranda afirma que “não é possível sustentar o crescimento econômico contínuo e, ao mesmo tempo, reduzir a pressão sobre ecossistemas e povos.”
O papel da sociedade na promoção do desenvolvimento sustentável
O professor Paulo Almeida atesta a importância de um sistema democrático forte para prosperar a ideia de sustentabilidade. Ele define a democracia como um sistema com liberdade das instituições, imprensa transparente, que promove equidade e estimula cidadãos para que compreendam os processos e participem deles.
Apesar dos problemas estruturais das iniciativas ambientais da ONU, representantes da ONG Missão Ambiental julgam que a sociedade civil tem um papel importante na preservação ambiental. Eles julgam que a consciência da sociedade brasileira sobre o tema ainda é muito superficial e parte apenas de uma parcela. Para a ONG, possíveis soluções para atrair o interesse dos brasileiros sobre o tema são: maiores investimentos públicos e privados em tecnologia e educação ambiental para todas as faixas de idade. A educação ambiental é importante para capacitar as pessoas a entenderem as complexas interconexões entre a vida humana e o meio ambiente.
“A sociedade é o alicerce, sua participação vai além de simplesmente seguir regras. Ela se manifesta em ações diárias e coletivas, como a escolha por produtos sustentáveis, a redução do consumo, a reciclagem, e a participação em iniciativas comunitárias”
Representantes da ONG Missão Ambiental
Um dos projetos da ONG Missão Ambiental, a “Compostagem Comunitária” é um exemplo prático da importância da participação da sociedade no processo de sustentabilidade. A iniciativa consiste na produção de adubo orgânico para um canteiro agroflorestal por moradores do bairro do Ipiranga. Segundo a ONG, “o projeto mostra como a união de pessoas pode criar soluções práticas e tangíveis para os desafios locais, diretamente alinhadas com os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável.”









