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Observatório | CPI da Covid: as omissões do Governo Bolsonaro em cheque

Ex-governantes agitam as duas primeiras semanas de depoimentos e comentam sobre o gerenciamento do governo federal em meio à pandemia

A pandemia do coronavírus já virou um tema familiar, afinal, já se passaram muitos meses que é o principal tópico que ouvimos. Pandemia, Covid, coronavírus, contaminação, Sars-Cov-2, máscaras de proteção e, finalmente, as vacinas. Mas a chegada dos imunizantes não representa realmente o fim deste período. Durante todo o ano de 2020, nós, brasileiros, assistimos a uma onda de negacionistas que subestimaram a ameaça e o perigo que o vírus representa à população. 

Um deles, e talvez o maior, foi o próprio presidente do Brasil, Jair Messias Bolsonaro. Chamá-lo de negacionista e irresponsável diante do gerenciamento do Brasil inserido na pandemia não é infundado: esse nome caminha junto de uma série de episódios nos quais o chefe do Executivo colocou em risco a saúde e vida de seu povo, sugerindo tratamento precoce com medicamentos ineficazes e caçoando da ciência e de medidas eficazes contra o avanço da pandemia no país. Em vista disso, diversos senadores denunciaram as inúmeras omissões do governo federal ao enfrentamento da covid-19. Assim, instalou-se a CPI da Covid. 

 

Desde o início

A Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) é uma medida tomada para pesquisas destinadas a apurar fato determinado, requerida por senadores e/ou deputados. A comissão tem poder de investigação, próprios das autoridades judiciais, mas não podem julgar ou punir. Após o prazo estipulado, o colegiado apresenta relatório com as conclusões e pode propor projetos de lei e sugerir o indiciamento dos investigados, sendo submetido ao Ministério Público.

A CPI da Covid foi ocasionada por dois requerimentos: RQS 1371 e RQS 1372. A primeira foi escrita pelo senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) e tem como principal foco “apurar as ações e omissões do Governo Federal no enfrentamento da pandemia da covid-19 no Brasil e, em especial, no agravamento da crise sanitária no Amazonas com a ausência de oxigênio para os pacientes internados”. Já a segunda, RQS 1372, é de autoria do senador Eduardo Girão (Podemos-CE), e foi criada para “apurar desvios de recursos destinados ao combate dos efeitos da covid-19”.  

No plano de trabalho são apresentados seis tópicos de investigação: (1) ações de enfrentamento à pandemia, como vacinas e medidas para contenção do vírus, (2) assistência farmacêutica com insumo para tratamento de enfermos, (3) estruturas de combate à crise referentes às atribuições de responsabilidades e competências, (4) colapso da saúde no estado do Amazonas, (5) ações de prevenção e atenção à saúde indígena e (6) emprego de recursos federais.

A comissão da atual CPI é composta por 11 titulares e 7 suplentes, sendo presidida pelo senador Omar Aziz, com seu vice-presidente, o senador Randolfe Rodrigues, e relator, o senador Renan Calheiros. 

No Bloco Parlamentar Vanguarda, o Senador Zequinha Marinho (PSC) cedeu a vaga para o Senador Fernando Bezerra (DEM), no dia 05 de maio. [Imagem: Reprodução/Senado Federal]

 

Atuação da CPI

Nas últimas semanas, a CPI começou a ouvir os primeiros depoimentos para apurar as ações e omissões do governo na gestão do país inserido na pandemia. Em entrevista a Jornalismo Júnior, o líder da bancada do PT e senador de Sergipe, Rogério Carvalho, havia especulado acertadamente sobre os primeiros passos da CPI: o foco inicial nos depoimentos dos ex-ministros da Saúde. O senador também compõe a CPI como suplente.

Do ponto de vista do senador sergipano, a CPI vai “avaliar o que o governo fez ou deixou de fazer que promoveu o aumento do número de pessoas infectadas e, consequentemente, de mortes”. Ele ainda revela que a CPI vai representar à população o quanto Bolsonaro promoveu a propagação do vírus e o aumento no número de infectados e de mortos. 

O Brasil se aproxima da marca de 450 mil mortes pelo coronavírus e parte expressiva desse número é reflexo do desgoverno durante a pandemia e insultos à ciência. Prova disso é a enorme rotatividade que o cargo de comando do ministério da Saúde teve até o atual, Marcelo Queiroga, e a onda de negacionismo que inundou os primeiros meses da pandemia. 

 

Mandetta, Teich, Queiroga, Wajngarten e turma

Em 16 de abril de 2020, Luiz Henrique Mandetta foi exonerado do cargo por defender o combate à pandemia pautado nas recomendações da ciência. Na época, o ex-ministro defendia o isolamento social e as recomendações da OMS, enquanto Bolsonaro subestimava a gravidade da situação nacional. A defesa de tratamento precoce, com o uso ineficaz da cloroquina e posturas negacionistas sobre medidas sanitárias eficazes contra o coronavírus são exemplos de agravantes do quadro atual de mortos e contaminados pelo vírus. 

Durante seu trajeto no cargo, a atuação de Mandetta teve mais que o dobro da aprovação de Bolsonaro. De acordo com uma pesquisa do Datafolha em abril de 2020, o ex-ministro da Saúde teve aprovação de 77% no combate ao surto de coronavírus, ao passo que Bolsonaro não atingiu nem metade da porcentagem dele, com apenas 36% de aprovação. 

No dia 4 de maio, Mandetta foi o primeiro a prestar esclarecimentos à CPI. Durante a reunião no senado, o ex-ministro revelou que enquanto estava à frente da pasta propunha a criação de campanhas sobre a importância do uso de máscaras e do distanciamento social, ao passo que Bolsonaro tinha um “assessoramento paralelo” e alimentava a ideia de um decreto presidencial que promovesse mudanças na bula da cloroquina para o tratamento precoce do coronavírus. A proposta foi recusada pelo presidente da Anvisa, Antonio Barra Torres, que também foi ouvido pela comissão e confirmou a proposta. 

Nem o pedido de Mandetta para que o Presidente mudasse de postura foi acatado. Para Mandetta, foi justamente a falta de alinhamento com as orientações científicas que resultou no agravamento do gerenciamento da pandemia no país, o colapso do sistema de saúde e as graves consequências à população.

Luiz Henrique Mandetta, ex-ministro da Saúde, ao lado do presidente da CPI Omar Aziz, durante testemunho à comissão. [Imagem: Reprodução/ Edilson Rodrigues/ Agência Senado]

 

Ainda na primeira semana de maio, Nelson Teich foi o segundo ex-ministro a participar das oitivas da CPI da Pandemia. A reunião aconteceu no dia 5 de maio e novamente a temática sobre a proposta de tratamento precoce protagonizada por Bolsonaro esteve presente. Para Teich, que não ficou nem um mês à frente do Ministério da Saúde, a situação era insustentável, já que não possuía  autonomia na função e era pressionado para implementar a cloroquina como tratamento para o vírus. O ex-ministro pediu demissão do cargo em maio do ano passado devido divergências com Bolsonaro sobre o uso de cloroquina em pacientes com sintomas leves, a ampliação de atividades essenciais e a flexibilização do isolamento social.

Ex-ministro da Saúde, Nelson Teich, cumprimenta o presidente da CPI, Omar Aziz. [Imagem: Reprodução/ Jefferson Rudy/ Agência Senado]

 

Outro depoimento preocupante foi o de Fabio Wajngarten, ex-chefe da Secretaria Especial de Comunicação Social (SECOM). Vale lembrar que Wajngarten passou a ser alvo de investigações da Polícia Federal em janeiro de 2020 por corrupção, peculato e conflito de interesses enquanto esteve à frente da SECOM.

No dia 12 de maio, a sessão com o ex-secretário de comunicação do governo foi recheada de vozes de prisão em flagrante e respostas evasivas e mentirosas. Wajngarten foi contrariado diversas vezes por suas declarações controversas, principalmente diante de sua entrevista à revista Veja. Nela, o ex-secretário afirmou que apenas teria se envolvido nas negociações de compra de vacinas da Pfizer devido ao desleixo do Ministério da Saúde, e revelou também que parte das dificuldades encontradas para a compra do imunizante era por “incompetência” do Ministério da Saúde, que na época era comandado por Eduardo Pazuello. 

Porém, durante seu testemunho na CPI, foi controverso ao dizer que nunca negociou com a Pfizer e que havia participado de uma reunião apenas “para ajudar”, além de ter dado outra resolução à fala em entrevista à Veja sobre o papel do Ministério da Saúde nas negociações. “Eu entendi que ele ocupou um espaço diante da saída do dr. Teich, que eu lamentei muito. O ex-ministro Pazuello foi corajoso em assumir uma pasta no pior momento do Brasil”, explicou à comissão. Em áudio divulgado pela revista VEJA, afirma-se que o ex-secretário mentiu, já que ele definiu as complicações encontradas na compra de vacinas por Pazuello como “incompetência”.

Ex-secretário de comunicação especial do governo, Fabio Wajngarten, em sessão da CPI da Covid no dia 12 de maio. [Imagem: Reprodução/ Edilson Rodrigues/Agência Senado]

 

Rogério Carvalho também esteve presente na sessão e desmentiu o ex-secretário de comunicação quando questionado sobre o uso de cloroquina em seu tratamento contra a Covid. Wajngarten afirmou que na época em que foi contaminado, em março de 2020, a cloroquina ainda não era cogitada como medicamento para o tratamento da doença e que, se estivesse, submeteria o uso dele em seu tratamento. Carvalho rebateu todos os testemunhos do ex-secretário com evidências de que naquele período a Organização Mundial da Saúde já alertava a população sobre a falta de comprovação científica da eficácia do medicamento e que mesmo assim o Governo Federal investia em laboratórios do Exército para aumentar a produção da hidroxicloroquina. Dentre os testemunhos de Wajngarten, Carvalho o desmentia frequentemente. “Vossa excelência mentiu nesta oitiva”, afirmou o senador.

Rogério Carvalho, senador suplente da CPI, durante oitiva do ex-secretário de comunicação, Fabio Wajngarten, na última quarta-feira (12). [Imagem: Reprodução/ Edilson Rodrigues/Agência Senado]

 

A oitiva de Wajngarten foi bastante conturbada. Diante das declarações rasas e dissimuladas, foi acusado por senadores de mentir à comissão, postura caracterizada como crime. O clima da sessão tornou-se  ainda mais tenso após o relator da comissão, Renan Calheiros, sugerir que Wajngarten fosse preso em flagrante. Na ocasião, Omar Aziz, presidente da CPI, disse que tal ambiente não se configurava como um tribunal e, após uma pausa na sessão, informou que o depoimento de Fabio Wajngarten seria encaminhado ao Ministério Público Federal para investigar a possibilidade de falso testemunho.

Durante a sessão de Wajngarten, também foi mencionada a reportagem da Agência Pública que investigou o pagamento de R$ 23 mil reais para influenciadores digitais visando propagandas de “atendimento precoce” à Covid-19. Ainda segundo a matéria, as publicações nas redes sociais dos “famosos” não mencionavam distanciamento ou isolamento social. [Imagem: Reprodução/Agência Pública]

 

Carlos Murillo, gerente-geral da Pfizer, foi ouvido na quinta, 13 de maio. Suas declarações evidenciaram a negligência do Ministério da Saúde ao não responder às cartas da Pfizer para negociações de vacinas. “Não tivemos resposta positiva e nem negativa sobre a oferta”, declarou Murilo. Ele também reforçou o envolvimento de Wajngarten em reuniões com a Pfizer e da participação de Carlos Bolsonaro em uma delas.

Marcelo Queiroga também prestou esclarecimentos à CPI no dia 6 de maio. Assim como Wajngarten, suas declarações foram consideradas evasivas e pouco esclarecedoras. Uma possível reconvocação do atual ministro da Saúde é especulada, já que de acordo com Omar Aziz, Queiroga testemunhou números diferentes de entrega de vacinas e que é natural que a CPI investigue as declarações incompletas do atual ministro da pasta. 

O atual ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, cumprimentou o senador Luis Carlos Heinze (PP-RS) durante sessão da CPI no dia 6 de maio. [Imagem: Reprodução/ Jefferson Rudy/ Agência Senado]

 

CPI: a saga continua

As investigações da CPI da Pandemia continuam. Aguardam-se os depoimentos do ex-ministro de Relações Exteriores, Ernesto Araújo, na próxima terça (18), e do ex-ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, na próxima quarta (19). Ainda para o mês de maio são esperados os testemunhos de Mayra Pinheiro, Secretária de Gestão do Trabalho do Ministério da Saúde; Dimas Covas, diretor do Instituto Butantan; Nísia Trindade, presidente da Fiocruz, e de Fernando Marques, presidente da União Química, que representa a vacina russa Sputnik V no Brasil. 

Em um panorama geral, o senador Rogério Carvalho ressalta que as atividades da CPI da Pandemia representam instabilidade para o governo atual de Bolsonaro. “Pela postura dele e do Ministério da Saúde na promoção do número de infectados”, afirma. Questionado sobre o julgamento de possíveis crimes de responsabilidade de Bolsonaro, Carvalho revelou que será consequência das investigações da CPI: “A CPI deve apresentar elementos e dar publicidade ao conjunto de crimes de responsabilidade que ele praticou ao longo da sua gestão”. Para o líder da bancada do PT no Senado, a CPI precisa investigar as medidas que o governo toma e tomou em gestões passadas que levaram o Brasil à situação que se encontra hoje. “A sociedade precisa uma resposta imediata”, frisou.

 

*Capa: [Imagem: Reprodução/Senado Federal]

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