Por Júlia Sardinha (jusardinha.eca@usp.br)
Eu cheguei, agora pra voltar porque aqui, aqui não é o meu lugar. A paródia dos versos originais da canção “O portão”, de Roberto Carlos, expressam a rápida passagem do breaking na história dos Jogos Olímpicos. No penúltimo dia das competições em Paris, os B-Boys batalharam sob os olhos de um fervoroso público, com direito a gritos e vaias. O breaking masculino, assim como o feminino, não contou com a participação de nenhum B-Boy brasileiro.
Quando o breaking foi anunciado pelo Comitê Olímpico Internacional (COI) como uma nova modalidade olímpica, opiniões variadas — muitas vezes contrárias entre si — inflamaram discussões mundo afora. Para muitos breakers, a decisão surtiu sentimentos opostos: a alegria de propagar a prática para o mundo e o descontentamento em torná-la uma atividade de fins comerciais.
Trazer a modalidade urbana para o evento não cumpriu com o intuito do COI em aproximar os jogos das gerações mais novas — em destaque a geração Z. Sem alcançar a audiência que o órgão ansiava, o breaking foi retirado das Olimpíadas de Los Angeles 2028, justamente nos Estados Unidos, país onde a dança surgiu. Mesmo com a sua estreia e, logo em sequência, a sua despedida, o breaking masculino atraiu grande público no Place de La Concorde no último sábado (10).
Uma competição previsível
As batalhas entre os B-Boys seguiram a mesma organização das disputas realizadas entre as B-Girls: quatro grupos — nomeados A, B, C e D — com quatro integrantes cada. Na fase preliminar, todos os dançarinos-atletas de um mesmo conjunto competiram entre si, totalizando 24 batalhas de breaking na primeira fase da competição.
Ainda na fase de grupos, fãs e admiradores do esporte tiveram queixas quanto ao nível das batalhas, assim como questionaram a qualidade das competições realizadas entre as mulheres. Para muitos internautas que acompanharam o evento pelas redes sociais, o fator “sobrenatural” do breaking — com apresentações de movimentos arriscados e criativos nos ares ou no chão feitos pelos competidores — deixou a desejar nos Jogos Olímpicos de Paris 2024.
A escassez de novidades nos movimentos apresentados levou a uma rápida previsão sobre quais competidores avançariam para a próxima fase. Apostas como o japonês Shigekix (Shigeyuki Nakarai), do grupo A, o canadense Phil Wizard (Philip Kim), do grupo B, e o francês — favorito da casa — Dany Dann (Danis Civil), também do grupo B, concretizaram-se dentre os oitos breakers classificados para as quartas-de-final. O estadunidense Victor (Victor Bernudez Motalvo), do grupo A, o representante dos Países Baixos, Lee (Lee-Lou Diouf Demierre), do grupo C, e o cazaquistanês Amir (Amir Zakirov), do grupo D, também se consagraram entre os finalistas.
Por uma vaga na semifinal, as batalhas passaram a apresentar mais volume e criatividade nas apresentações, o que surpreendeu os presentes. Entre aplausos, o público começou a perceber que nem sempre os movimentos mais extraordinários são os que contabilizam maiores pontuações aos olhos críticos dos jurados. Como exemplo, o embate entre Victor e o japonês Hiro10 (Hiroto Ono), na última rodada das preliminares, não deixou o público contente com o resultado: o norte-americano ganhou a disputa contra uma apresentação recheada de movimentos ousados e enérgicos do B-Boy asiático, o que gerou vaias entre os espectadores.
Na dança pela medalha
Acima da disputa, os breakers valorizam a relação de amizade, companheirismo e respeitosa entre todos os competidores [Reprodução/Instagram: @_breakingforgold]
Os quatro cavaleiros do breaking — Dany Dann, Victor, Shigekix e Phil Wizard — já chegaram à final como favoritos a uma posição no pódio olímpico. Como batalha inaugural das semifinais masculinas, Dany Dann e Victor protagonizaram uma disputa entre França — a “dona da casa” — e Estados Unidos — berço do breaking. Quem levou a melhor, no fim, foi o francês que, assim, já garantiria ao menos uma medalha de prata ao seu país na competição.
Assim como ocorrido nas batalhas do breaking feminino, os representantes do país norte-americano não alcançaram nenhuma das duas maiores posições do pódio olímpico. E ao seguir a coincidência dos eventos do feminino no masculino, outra semifinal foi travada entre os dois primeiros breakers colocados na classificação pré-olímpica: Shigekix, do Japão, contra Phil Wizard, do Canadá. Na disputa, o canadense levou a melhor e desbancou a liderança do B-Boy japonês.
Após cerca de três horas de competições, a final foi protagonizada por Danny Dann e Phil Wizard. Durante os três rounds da disputa “às cegas” — já que os votos dos juízes só eram revelados com o fim da batalha —, ambos aplicaram os extraordinários movimentos do breaking que a plateia tanto ansiava. Um embate mais do que digno de uma final que consagrou Phil como o primeiro medalhista de ouro olímpico no breaking. Dany garantiu a prata à França e o bronze foi conquistado pelo estadunidense Victor.
O breaking não garantiu a vaga para os próximos Jogos Olímpicos de Los Angeles 2028. Mesmo com a animosidade dos aplausos e dos gritos de torcida da plateia, a modalidade não foi tão bem recebida quanto o skate e o surf — incluídos em Tóquio 2020 — e, por isso, não fará parte das competições da próxima edição. Porém, a sua exclusão não é eterna, há chances das B-Girls e dos B-Boys voltarem a aparecer na cena em Olimpíadas futuras.
Imagem de capa: [Reprodução/Instagram: @_breakingforgold]