Rejeito da barragem da mineradora, que rompeu em Mariana-MG, seguiu pelo curso do Rio Doce até chegar em Regência, no ES
Por Caio Santana (caiosantana@usp.br)
“O sertão vai virar mar // É o mar virando lama // Gosto amargo do Rio Doce // De Regência a Mariana.” A letra da música “Cacimba de mágoa” escrita por Tato Cruz, da banda Falamansa, e por Gabriel O Pensador, evidencia um sentimento que muita gente teve quando houve o rompimento da barragem de Fundão, da mineradora Samarco, em Mariana. O trágico episódio aconteceu há exatos três anos, na tarde do dia 5 de novembro de 2015, destruindo quase que por completo o distrito de Bento Rodrigues, seguindo até o Rio Gualaxo do Norte. No mesmo dia, a lama seguiu o curso do Rio do Carmo até encontrar o Rio Doce.
O Laboratório foi em busca de respostas sobre o estado das águas do Rio Doce, após receber grande parte do rejeito de minério proveniente da barragem da mineradora Samarco. Os rejeitos são resíduos provenientes da mineração e que devem ficar armazenados, por exemplo, em barragens. O Doce é um dos principais rios do eixo leste do Brasil, situado na Região Sudeste do país. Nosso repórter também passou pelo Rio Doce lado a lado, de Colatina-ES à Ipatinga-MG, em julho de 2018, e pôde perceber alguns aspectos do rio.
Esse rio é de extrema importância para cidades de referência regional, como Governador Valadares-MG, Colatina-ES e Linhares-ES. Contudo, esses centros viram sua principal fonte de abastecimento ser tomada por um mar de lama. Será que as águas estão próprias para consumo? O que aconteceu com os rejeitos de minério? Antes dessas respostas, vamos relembrar o que aconteceu e algumas das medidas e consequências decorrentes do desastre.
O que aconteceu
Era uma tarde de quinta-feira, dia 5 de novembro de 2015, quando uma barragem com rejeitos de minério se rompeu, em Mariana-MG. Tratava-se da Barragem de Fundão, de propriedade da Samarco (empresa cujos maiores acionistas são a brasileira Vale e a anglo-australiana BHP Billiton). No princípio, acreditavam que duas barragens haviam se rompido: a de Fundão (acima) e a de Santarém (abaixo). Porém, não havia acontecido nada com esta última, exceto amortecer parte do impacto da descida da lama.
As causas que levaram ao rompimento ainda apresentam divergências. É que não se sabe o que de fato foi o maior fator para que a barragem se rompesse. O que é mais aceito é a provável influência do acúmulo da lama e de seu recuo dentro da barragem, além de problemas com a drenagem da parte líquida e da liquefação estática (quando um material sólido começa a se comportar como fluido).
Uma possibilidade, descartada pelo Ministério Público, era a de que abalos sísmicos tivessem provocado o acidente. Naquela tarde, o Centro de Sismologia da Universidade de São Paulo (USP) havia registrado 11 abalos, sendo dois mais significativos, de 2,7 e 2,5 graus na escala Richter, ocorridos, respectivamente, às 14h12 e 15h56, antes do rompimento por volta das 16h30. Nas investigações, ficou-se sabendo que um ano antes foi observado trincas no alto de um dos paredões da barragem, mas que a Samarco construiu um aterro embaixo dele e concluiu que a barragem estava estável.
Segundo a Fundação Renova (criada para gerenciar a remediação e compensação do que já estava sendo feito desde novembro de 2015 pela mineradora Samarco), vazaram de Fundão 43,7 milhões de m³ de rejeito de minério. Desses, 4,5 milhões de m³ ficaram retidos na própria barragem, enquanto os 39,2 milhões de m³ restantes desceram sobre vilarejos — como Bento Rodrigues —, córregos e rios. A descida do rejeito levou consigo 19 pessoas. Destas, 18 corpos foram encontrados, mas o do funcionário da Samarco, Edmirson José Pessoa, continua desaparecido.
Aproximadamente metade dos rejeitos ficaram retidos no reservatório da Usina Hidrelétrica Risoleta Neves, localizada nos municípios mineiros de Rio Doce e Santa Cruz do Escalvado. “Parte desse rejeito está acumulado na primeira usina hidrelétrica, a de Risoleta Neves, que acabou sendo um anteparo, uma armadilha para esse sedimento”, diz o professor e pesquisador da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes), Gilberto Barroso.
Pelas contas, sem considerar rios, afluentes e lagos, os quase 18 milhões de m³ seguiram rio abaixo. Porém, esse é um número incalculável, conforme diz Barroso: “é difícil saber esse número. Acho que ninguém nunca vai poder precisar exatamente quanto foi liberado. Boa parte do material ficou retido e boa parte desceu e chegou no mar.”
As providências
Ao tomar conhecimento da tragédia, a Samarco precisou ser rápida para agir conforme determina a legislação brasileira. Talvez as medidas mais emergenciais fossem garantir o consumo de água para uma população que dependia exclusivamente do abastecimento dos rios atingidos. Ao todo, de acordo com dados divulgados, a empresa afirma que foram cerca de 1,378 bilhão de litros de água distribuídos nessas cidades com abastecimento comprometido entre novembro de 2015 e janeiro de 2016.
Nesse período, além de ter sido (por obrigação) a protagonista em se articular pelos reparos, a empresa necessitou criar medidas mais eficientes. Por causa disso, foi criada a Renova, uma fundação de direito privado e sem fins lucrativos, com sede em Belo Horizonte.
O surgimento da Fundação fez parte da assinatura do Termo de Transação e Ajustamento de Conduta (TTAC) entre Samarco, com o apoio de suas acionistas, Vale e BHP Billiton, e o Governo Federal, os Estados de Minas Gerais e do Espírito Santo. Além de órgãos como o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), a Agência Nacional de Águas (ANA) e a Fundação Nacional do Índio (Funai).
“Durante o primeiro ano após o rompimento a Samarco se mobilizou e atuou de forma emergencial para remediar os impactos causados pelo rompimento de Fundão”, disse a Samarco ao Laboratório. A empresa ainda ressaltou que “as suas operações estão paralisadas desde o rompimento da barragem de Fundão em novembro de 2015”. E essa paralisação vem trazendo prejuízos para economias de municípios que tinham na empresa sua maior fonte de arrecadação de impostos, como é o caso de Mariana-MG e Anchieta-ES.
É no município capixaba de Anchieta que a Samarco possui quatro usinas de pelotização, que transformam o minério de ferro, transportado de Mariana, nas chamadas pelotas. É essa formação que permite o embarque do produto no terminal portuário de Ubu, em Anchieta.
O rejeito era tóxico?
Muitas dúvidas surgiram no decorrer dos dias. O quão perigoso seriam esses rejeitos, que provocaram o maior desastre antrópico ambiental do país?
Quem responde ao Laboratório é a própria Fundação Renova: “a barragem de Fundão armazenava um rejeito inerte, não tóxico, composto essencialmente por elementos do solo (rico em ferro, manganês e alumínio), sílica (areia) e água”. A Samarco falou praticamente a mesma coisa, ao dizer que “o rejeito não é tóxico e não apresenta risco a saúde humana”.
Contudo, é de se considerar a concentração que o grande volume liberado pode causar. “Junto com o ferro do minério, existem outros metais, que podem ser tóxicos dependendo da concentração. Conforme o rejeito de minério foi se deslocando pela calha do rio, ele foi revolvendo o fundo do rio e das represas, o que promoveu a remobilização de poluentes e contaminantes que estavam depositados nos sedimentos. É um efeito de sinergismo, uma combinação de fatores do rejeito de minério com os poluentes acumulados”, diz Gilberto Barroso.
E o contratempo surge nesse momento. Pois podem surgir problemas com metais, como “o cromo, zinco, cádmio, chumbo, arsênio (esses foram os mais significativos), além é claro, de ferro e alumínio”, conforme falou o professor da Ufes.
Em resposta à pergunta se existe algum ponto do Rio Doce com maior presença de metais, a Renova deu a entender que sim. Ela diz que “os pontos a jusante do Rio Doce, entre Governador Valadares e a foz, em Regência, são os que apresentam níveis acima dos limites estabelecidos pelo Conama para os metais tóxicos”. O Conama é o Conselho Nacional do Meio Ambiente.
Onde foi parar esse rejeito?
“É provável que uma boa parte dos metais estejam acumulados nos fundos dos lagos, sobretudo dos lagos onde o rejeito de minério acabou entrando. Lagos são ambientes deposicionais, então tendem a acumular mais materiais. Muito mais do que um rio”, afirma o pesquisador Gilberto Barroso. “Os estudos estão sendo feitos agora justamente nos sedimentos do rio, do estuário, do mar e dos lagos, para poder identificarmos se há de fato essa concentração em algum desses ecossistemas aquáticos”.
Sobre os riscos da descida da lama, o pesquisador diz que “o aporte de rejeito de minério de ferro teve um impacto agudo e significativo na condição da coluna d’água do Rio Doce da sua porção estuarina e do ambiente marinho adjacente.” Isso ocorreu por conta do aumento da turbidez, material particulado em suspensão e dos sedimentos de fundo desses sistemas. “Diversos organismos, tanto aqueles da coluna d’água quanto aqueles que vivem no fundo, foram severamente impactados pelo rejeito de minério de ferro, na fase mais aguda, que foram os primeiros meses após o desastre e que acabou passando,” ressaltou.
Onde acumulou-se rejeito a Renova explica que foi possível fazer a sua realocação e deposição em novos locais construídos e seguros. Entretanto, pondera: “Fazer manejo do rejeito não significa necessariamente retirar o material de onde ele está armazenado. A solução será definida caso a caso e será considerada a opção de não remoção, se essa for a melhor alternativa, tendo em vista os impactos ambientais resultantes da movimentação do rejeito. A decisão final para cada trecho tem como princípio as soluções com menor impacto ao meio ambiente e à sociedade”.
O Rio Doce já enfrentava problemas
O caminho que o Rio Doce faz para chegar até a foz, em Regência, no litoral capixaba, é de aproximadamente 879 km. Sendo de extrema importância para os 228 municípios que estão sob influência da sua bacia hidrográfica, o rio assume todo um caráter econômico, ambiental, social e cultural nessas cidades. São cerca de 3,5 milhões de pessoas influenciadas pelo Doce, mas que também influenciam negativamente a vida do rio.
A problemática que o desastre proporcionou agravou a situação de um rio que já sofria com fortes períodos de estiagem e com a seca. Onze dias antes do desastre em Mariana, no dia 25 de outubro daquele 2015, o nível do Rio Doce na cidade de Colatina era de apenas 5 cm.
E não era só isso. Com o desenvolvimento das cidades polo mineiras e capixabas, sobretudo Governador Valadares-MG, Colatina-ES e Linhares-ES, era cada vez mais alarmante a quantidade de poluentes decorrentes de diferentes atividades. Destacam-se as atividades agrícolas, industriais e urbanas, com o esgoto doméstico sem tratamento.
Gilberto Barroso comenta: “A própria condição do Rio Doce, independente do desastre, já era problemática em si em função da vazão e da carga de esgotos lançados ao longo do rio. São efluentes urbanos, industriais e até mesmo agrícolas”.
Desde o rompimento da barragem e consequente agravamento da situação do Rio, ao menos a situação de períodos com nível do rio baixíssimos perdurou. Dados obtidos com o Serviço Autônomo de Água e Esgoto (SAAE) de Governador Valadares, mostram que o Rio Doce se manteve acima da sua média histórica apenas em curtos períodos de chuva, que geralmente acontecem em grande volume entre novembro e março, na região que abrange a bacia do Doce. A média histórica em Valadares é de 0,80m, e desde a tragédia, somente entre 02/02 e 24/04 deste ano de 2018, é que o rio ficou por longo período acima da metade da média histórica, ou seja, acima dos 40cm.
Abaixo, segue tabela com os semestres correspondentes aos mínimos e máximos das medidas em metros, feitas pelo SAAE de Valadares, do nível do Rio Doce no município mineiro.
O maior período com leito super baixo — com nível do rio abaixo dos 12,5% da média histórica, ou seja, 10cm — aconteceu entre 30/05 e 17/10 de 2017. Outros intervalos se assemelham, mas nenhum foi tão longo quanto este, que apresentou muitos dias também com a régua na medida negativa (devido ao nível 0 corresponder ao nível ideal do rio, sendo o limite máximo da cota crítica). A medida negativa se assemelha ao volume morto que reservatórios de água possuem.
Esse cenário, que já estava acontecendo ao menos desde 2014, prejudicava os pescadores mineiros e capixabas, pois não era possível pescar com bancos de areia atrapalhando a passagem dos barcos e canoas. Quando aconteceu o desastre, além das perdas dos peixes, houve a proibição da pesca ao longo rio, pelo menos no território mineiro, já que no ES apenas foi proibido na foz e no mar até áreas onde o Rio Doce influencia com sua sedimentação.
Após a chegada da lama no litoral e consequente restrição das pescas, banhistas foram proibidos de mergulharem nas águas do Porto de Regência, pois “a área estava temporariamente imprópria para banho”, segundo placa da prefeitura. Em nota enviada ao Laboratório sobre a situação hoje, “a Prefeitura de Linhares informa que o monitoramento das condições de pesca e banho no Rio Doce, Povoação, Regência e Pontal do Ipiranga [localidades do município] são determinados pelos governos Estadual e Federal e no momento, o banho está liberado nas referidas praias”.
Mesmo com a proibição da pesca no Rio Doce mineiro, hoje apenas as espécies nativas continuam proibidas de serem capturadas. Como destaca a Fundação Renova, “na porção mineira do rio, a atividade focada em espécies exóticas (que não são naturais da região) já foi liberada pelo Instituto Estadual de Florestas (IEF) em maio de 2017. A proibição de captura de espécies nativas tem o objetivo de não prejudicar o repovoamento do rio. Já no ES, a pesca nunca esteve proibida. Só existe proibição, hoje, na área de mar, junto à foz”.
Procurado, o Instituto Estadual do Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Iema) confirmou a fala da Renova, a respeito da não proibição da pesca no Rio Doce no ES. O órgão capixaba disse ainda que a proibição da pesca na foz aconteceu via decisão judicial pelo “princípio de predicação”. Eles acrescentaram também “que a proibição em Minas proíbe apenas a pesca de nativos. E ela tem dois pontos: o primeiro é garantir a reprodução das espécies nativas; já o segundo é assegurar que o pescador continua-se a receber o seguro defeso”.
A administração municipal de Linhares-ES reforça que “a pesca, está proibida na Foz do Rio Doce, em Povoação e Regência, até a localidade de Degredo, numa profundidade de até 20 metros. No Pontal do Ipiranga não há proibição de pesca.” Pontal do Ipiranga é um balneário do município, distante cerca de 60 km da foz do Rio Doce, em Regência.
Como já falado, o baixo nível atrapalhava os pescadores, e continua a atrapalhar. “A vazão do Rio Doce está muito baixa, ao ponto de a navegação na Foz estar muito restrita por conta de bancos de areia. O acesso às estações amostrais pelo baixo Rio Doce, pela calha do rio, está muito comprometido pela baixa vazão do rio”, relata Gilberto Barroso, que estava em pesquisa até poucas semanas atrás.
As pesquisas
Demorou para ser feito um comprometimento contínuo para que pesquisas fossem feitas com uma periodicidade específica, mesmo após o acontecimento. Barroso comenta que a grande maioria dos rios do Brasil não possui uma base de dados e monitoramento, para subsidiar o planejamento e a gestão da água na própria bacia hidrográfica.
O Iema disse que “o ES trabalha continuamente na busca de soluções eficazes para o monitoramento e a recuperação da bacia do Rio Doce, importante fonte de recursos ambientais fundamentais para milhares de pessoas que dependem dele direta ou indiretamente”, reiterando o trabalho que eles fazem para monitorar a bacia.
Ainda de acordo com o instituto, para fomentar a pesquisa e começar de fato um monitoramento mais preciso, foi assinado um contrato entre a Fundação Renova e a Fundação Espírito-santense de Tecnologia (FEST) através da Rede Rio Doce Mar (rede colaborativa acadêmica formada por pesquisadores de 24 instituições de todo o país para executar o monitoramento da biodiversidade aquática em toda a área atingida no Espírito Santo).
O objetivo principal do acordo é verificar a evolução do impacto nos ecossistemas atingidos. O orçamento do monitoramento ficou em torno de R$ 120 milhões, e a coleta de dados em campo foi iniciada no dia 20 de setembro de 2018.
“Nossa equipe fez a primeira amostragem na parte da calha do Rio Doce, dos lagos do baixo rio e da porção estuarina. A água está com aspecto relativamente normal, sem estar muito turva e os dados serão processados a partir de agora. A amostragem de campo terminou no dia 26 de outubro”, revelou Barroso, que havia acabado de encerrar uma das etapas desse monitoramento iniciado no mês anterior.
A Fundação Renova complementa: “A parceria tem como objetivo monitorar a biodiversidade de 230 pontos ao longo de toda a porção capixaba do Rio Doce e na região estuarina, costeira e marinha, que compreende o entorno da foz do rio e se estende para o Sul até o município de Guarapari e para Norte até a cidade de Porto Seguro, na Bahia.”
O Laboratório conseguiu mais informações. Fomos informados que os resultados dos monitoramentos serão entregues trimestralmente à Fundação Renova. E que a cada semestre será realizado um workshop para apresentação dos resultados, com a participação dos órgãos ambientais. A previsão inicial é de que o primeiro workshop seja realizado em fevereiro de 2019, para dar tempo de processar os dados coletados nesta primeira etapa que ocorreu em setembro e outubro deste ano.
Como está o uso da água
De acordo com resolução do Conama, a qualidade requerida para a água varia a depender do uso da mesma. “Isto posto, é sim possível utilizar a água dos lugares afetados, dependendo apenas da qualidade requerida para o uso e como está a qualidade da água no momento da captação. Em termos de abastecimento público, a água tem se mostrado com qualidade passível para abastecimento, desde que tratada por estações de tratamento convencionais”, justifica o Iema.
A Renova afirma que desde o primeiro semestre de 2016, os níveis de metais no curso d’água do Rio Doce têm se mantido na normalidade, com valores semelhantes aos encontrados antes do rompimento da barragem. E salienta, porém, que para ser consumida, a água precisa passar por tratamento.
Os números
A reparação dos prejuízos apresentam, até então, números compreensíveis com a responsabilidade assumida pela Samarco e posteriormente pela Fundação Renova. Isso se não fosse conhecido o valor da ação cível pública de cerca R$155 bilhões, feita pelo Ministério Público Federal e que está suspensa até agosto de 2020. De acordo com a Renova, já foram pagos em indenizações e auxílios financeiros algo em torno de um bilhão de reais, sendo que 22 mil pessoas são assistidas através de 9.350 cartões de auxílio financeiro.
Eles disponibilizaram no Fundo Desenvolve Rio Doce, 40 milhões de reais para financiar microempresas e empresas de médio porte, com empréstimos que variam de 10 a 200 mil reais. Em relação às obras de infraestrutura, 1718 obras foram concluídas, estão em andamento ou em fase de projeto.
O monitoramento da qualidade da água do Rio Doce acontece em 92 pontos de coleta, sendo que 22 são estações automáticas que avaliam 80 indicadores. Também estão planejados 200 pontos para monitorar a biodiversidade marinha que vai de Guarapari-ES até Porto Seguro-BA. Monitoramento esse que iniciou através da parceria com a Rede Rio Doce Mar.
A proteção de nascentes também foi outro compromisso levado a sério e muito necessário. Eles tinham, até o final do ano passado, 511 nascentes protegidas e querem fechar 2018 com mais 500. No total, segundo a Fundação, já foram reabilitados 113 afluentes impactados de alguma forma pela lama. Na busca de diminuir efluentes urbanos lançados no rio, foram disponibilizados R$500 milhões para o tratamento de esgoto dos municípios atingidos.
Esse último dado também foi confirmado pelo Iema, como medida de cunho compensatório da Renova, no valor de R$ 500 milhões de reais, a 39 municípios impactados na área ambiental para custeio na elaboração de planos básicos de saneamento básico, elaboração de projetos de sistema de esgotamento sanitário, implantação de obras de coleta e tratamento de esgotos, erradicação de lixões e implantação de aterros sanitários regionais. No Espírito Santo, serão contemplados com os recursos os municípios de Baixo Guandu, Colatina, Marilândia e Linhares, totalizando um montante de recurso de mais de R$100 milhões.
O estado da água hoje
“Hoje já se passaram três anos do evento e a situação melhorou bastante. É possível que a gente tenha alguns pulsos de sedimentos na água, provenientes da bacia hidrográfica e de rejeito de minério que estão acumulados nas margens do curso médio superior do Rio Doce”, analisa Gilberto Barroso.
Ele adianta um pouco do que pôde perceber da água, nesses últimos dias de pesquisa. “O aspecto da água não é mais turvo. Aparentemente ela está clara. Em condição mais regular do Rio Doce, fora do período de alta vazão. É de se esperar que com as chuvas, tenhamos o aumento da turbidez do rio e o aumento de material particulado em suspensão. Isso é normal de acontecer e o rio responde dessa forma mesmo. A questão é verificar se há de fato o incremento dos elementos contaminantes, seja pelo rejeito ou do material depositado no fundo dos rios, lagos e represas.”
O futuro
Pode ser incerto o que virá pela frente. Na época do desastre, muito se falava do dano irreparável que a tragédia proporcionou. Como as pesquisas não eram sólidas, não existe uma base de avaliação também sólida. Contudo, as pesquisas da Rede Rio Doce Mar tem tudo para apontarem indicadores que serão importantes para provar algumas teses e eliminar outras. Decerto, espera-se que tenhamos levado um enorme aprendizado disso tudo, que não deixou de ser um crime ambiental que a Samarco promoveu.
E é sobre aprendizado que Barroso fala: “Minha maior preocupação é não termos aprendido com o desastre e não termos se preparado para os futuros desastres que vem pela frente. Eu espero que esse desastre não caia no esquecimento e que os governos e a sociedade no geral possam se preparar melhor para os problemas agudos, como foi o desastre e os problemas crônicos que acontecem a cada dia. Como é o caso do lançamento de esgoto nos ecossistemas aquáticos.”
Ele termina deixando um recado para todos. “O que a gente pode esperar do futuro, num ponto de vista positivo, é tomar uma abordagem mais de precaução, fazendo as atividades humanas necessárias como produção de energia, consumo de água, deposição de efluentes e resíduos de modo mais seguro possível. Isso significa que a sociedade e os governos de modo geral, estejam preparados para trabalhar preventivamente, e não remediando acontecimentos complexos. Prevenir é mais barato que consertar o estrago depois.”
É imperativo que os órgãos responsáveis pela manutenção e monitoramento do Rio Doce se mantenham sempre vigilantes, tanto no ponto industrial, como ecológico, para evitar futuras catástrofes.
Creio que esse desastre industrial, economico e ecológico plantou uma semente de conscientização local, estatal, e nacional voltada para a importância de uma eco- industria, onde o progresso e a sanidade ambiental possam co-existir!