Mariana Franco
De cada cena de O Silêncio de Lorna emana realidade. Quase não há música, nem preocupação com belas cenas ou fotografia. Os atores não são beldades, os figurinos mal variam. Assistir ao filme é como acompanhar uma personagem vinte e quatro horas por dia, a uma certa distância, sem nada dizer e sem nada ouvir. Só observar.
O filme dos irmãos Dardenne, premiado em Cannes, aborda o contexto da luta de imigrantes do leste europeu para construir uma vida nos países mais prósperos do continente. A albanesa Lorna, bem interpretada por Arta Dobroshi, vive em um casamento falso com o viciado em drogas Claudy (Jerémie Reniér) para obter a identidade belga. Seu sonho é conseguir a nacionalidade e um empréstimo para abrir uma lanchonete e viver com seu namorado, Sokol (Alban Ukaj), que trabalha no exterior. Aliciada por Fábio (Fabricio Rongione), um negociador de casamentos falsos, o plano era supostamente o viciado morrer de uma overdose após Lorna conseguir sua nacionalidade, para que ela em seguida case-se com um russo em troca do dinheiro que precisa. As coisas mudam de rumo, entretanto, quando Claudy resolve largar as drogas e pede ajuda à mulher para isso.
Além da realidade que acompanha todas as cenas, e da questão dos imigrantes na Europa, muito comentadas as duas; o filme explora a psicologia dessa mulher. O nome dado à obra não poderia ser melhor. O sofrimento não é escancarado, acompanhado de choro e desespero, é velado, está por baixo da pele, mudo como a personagem. Tanto quanto da tela emana realidade, emana também solidão. Pequenos detalhes do cotidiano, despercebidos para muitos, são opressores para a personagem: a caixa de correspondências, sempre vazia; as ligações que recebe, sempre sobre os negócios dos casamentos, nunca um amigo ou seu namorado. Lorna é uma mulher sozinha, num país estrangeiro, sem amigos, lutando contra uma dura realidade, apoiada apenas num sonho de futuro; seu sofrimento, imenso, é encarnado pelo seu silêncio. Pior que sofrimento cheio de gritos ou lágrimas é o sofrimento mudo, solitário. E é esta solidão opressora que leva a personagem aos limites da psicologia.
Depois de assistir esse ótimo filme (apesar do final um tanto vazio, e bastante criticado) não há como não sair do cinema como a personagem: muda.
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