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A beleza nua&crua do nu feminino empoderado

Imagem: Beatriz Crivelari / Comunicação Visual – Jornalismo Júnior Ao longo de toda a história da arte, a nudez humana é um dos temas mais explorados pelos artistas – em especial, a nudez feminina. Retratada desde a Vênus de Milo, esculpida na Grécia Antiga, passando pelas pinturas renascentistas italianas, como a Vênus Adormecida e obras …

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Imagem: Beatriz Crivelari / Comunicação Visual – Jornalismo Júnior

Ao longo de toda a história da arte, a nudez humana é um dos temas mais explorados pelos artistas – em especial, a nudez feminina. Retratada desde a Vênus de Milo, esculpida na Grécia Antiga, passando pelas pinturas renascentistas italianas, como a Vênus Adormecida e obras da França impressionista, até As Mulheres de Argel de Picasso e os mais recentes ensaios fotográficos – o corpo nu feminino foi e continua sendo tema de diversas formas de arte; notoriamente, quase sempre a partir de uma visão masculina.

Os ensaios fotográficos, uma forma de manifestação artística mais atual, em sua maioria adotam essa ótica masculina que tende a objetificar o corpo feminino. As mulheres clicadas são sensualizadas, em poses e situações pouco naturais,que buscam apenas o erotismo, reduzindo o corpo a um simples objeto de prazer sexual. Na maioria dos ensaios publicados na mídia, apenas modelos consideradas bonitas são fotografadas e ainda, posteriormente, photoshopadas para que pareçam perfeitas dentro de um específico modelo de beleza.

Desse modo, perpetuam-se os inatingíveis padrões estéticos, que determinam certas características e medidas consideradas perfeitas: mulheres brancas, altas, magras, com busto e quadril avantajados. A hegemonia dessas características nas representações artísticas e midiáticas – tanto na grande mídia quanto em simples postagens diárias em redes sociais – acaba segregando e excluindo as diferentes formas de beleza existentes. 

Nadando contra essa maré, surgem projetos fotográficos com uma proposta diferente, com por  exemplo, o da fotógrafa Céu Ramos: o “Por Elas” tem a iniciativa de retratar e realçar as infinitas e diversas belezas das mulheres através da nudez nua&crua, sem retoques, e espalhar o empoderamento feminino.

A recifense contou ao Sala que o interesse em fotografar mulheres nuas surgiu depois de um processo de depressão, que desencadeou uma baixa autoestima em relação ao seu corpo. Foi então que percebeu que esse problema não era uma singularidade dela, e sim, que afetava todas as mulheres, por causa da pressão que sofrem da sociedade. “E foi pensando na possibilidade de mostrar a elas o quanto são belas que surgiu a ideia do projeto”, explica.

Céu considera o uso do photoshop (com o intuito de fazer melhorias nos corpos) uma fuga da essência real: “nossa mensagem é mostrar o verdadeiro eu de cada mulher e, por isso, modificá-las seria estranho. Num ensaio nu, creio que o que deve ser mais chamativo é a real beleza da modelo”. Por esse motivo, retrata em suas fotografias o corpo e a nudez como realmente são. Sem retoques, os corpos revelam sua naturalidade através de imperfeições, que os tornam unicamente perfeitos.  

Vítima do moralismo, a nudez ainda é censurada em diversas mídias. Dentre elas, o Instagram, principal plataforma de divulgação do projeto Por Elas. O aplicativo pede tarjas em mamilos femininos, mas não nos masculinos. “Eu acho lamentável isso. Preciso colocar tarjas para que a foto não seja excluída e o perfil bloqueado. Espero que um dia essa mentalidade possa ser desconstruída também, já que o nu é algo tão natural nosso”, comenta Céu.

A fotógrafa diferencia seu projeto dos ensaios de nudez feminina voltados para a publicidade ou consumo masculino ao explicar que, desde a sua criação, o projeto é voltado para a autoestima. “Queria fazer algo que pudesse fugir desse padrão imaginário que a sociedade nos infringe e dessa sexualização do corpo feminino. Busco proporcionar nas minhas fotografias tudo que há de mais belo em cada uma delas.  Vejo o projeto como algo realçador, sensual e transformador!”. Para que o sucesso dessa ideia aconteça na prática, Céu busca criar um elo com a modelo: “como mulher, preciso me sentir um pouco dela para que eu possa transmitir todas as suas emoções através das fotos”. Mesmo com essa conexão, ela conta que a maioria das modelos demonstram timidez no início do ensaio mas que “depois de alguns minutos já estão tão libertas que até esquecem que estão nuas, e isso é fantástico, pois rola uma troca de segurança muito bacana”, completa.

Thais Apariz e Isis Tomie são, aparentemente, mulheres totalmente diferentes, mas possuem uma característica em comum: ambas toparam corajosamente posar nuas para o projeto. Isis já havia posado para outros fotógrafos e conta que procura sempre tirar fotos de si mesma e marcar ensaios para dar continuidade à boa relação que aprendeu a desenvolver com seu corpo ao longo dos anos. “Acho maravilhoso esse tipo de projeto”, diz. Já Thais não conhecia a sensação de ser clicada; fugia das fotos, pois sempre teve um bloqueio em relação a expor seu corpo. “A valorização do humano e a ideia de que corpos são plurais, lindos da forma que são, me encanta”. Essa sua visão contribuiu para que aceitasse a ideia após uma amiga contar a respeito.

As duas concordam que, pelo fato de estarem completamente nuas, ter uma mulher atrás da câmera as fizeram sentir mais seguras. Sobre isso, Céu diz: “existem muitos trabalhos fotografados por homens que admiro bastante, mas acho que quando um trabalho que é destinado a autoestima e aceitação é feito por quem passa por esses problemas, o resultado com certeza é diferente. O olhar vai muito no quesito do se enxergar na modelo, do sentimento de querer fazer ela se sentir ainda mais maravilhosa após sair do ensaio.“ E pelo visto, ela atinge seu objetivo. “Céu foi incrível. Sempre enaltecendo o poder, a beleza, a sutileza e a fortaleza de ser quem se é”, elogia Thais.

Sobre a reação após o fim do ensaio, Thais conta que demorou três dias para conseguir olhar as fotos, mas que hoje consegue mostrá-las sem sentir vergonha e sentindo-se bonita. “Até porque, vesti meu melhor sorriso e pude enxergar beleza no ensaio”, diz. Já Isis diz que desde o início amou se ver nas fotos “Me senti eufórica, me senti ainda mais bonita e amei me ver”.

Projetos como o Por Elas, que trabalham o empoderamento e  naturalizam o corpo feminino, trazem à tona uma outra importante questão: o domínio da imagem e do corpo da mulher sempre esteve nas mãos de homens. Meninas são desde pequenas reprimidas sexualmente, afastando a possibilidade de um relacionamento íntimo com sua própria sexualidade. Além disso, a ideia de que o corpo feminino serve apenas como objeto sexual afasta a verdade de que ele é simplesmente um corpo humano. Pele e pêlos, criados com a função natural de simplesmente proteger o organismo. “Nosso meio é tão preconceituoso que, para uma mulher se permitir a fazer um ensaio nu, ela já derruba naquele momento um milhão de barreiras”, afirma Céu. “Os ensaios são uma forma de resistência e de luta. Nosso corpo desde sempre é visto apenas como objeto, e mostrar a sociedade que somos muito além disso é algo transformador”, continua, enfatizando que a conquista do poder sobre o próprio corpo é um dos aspectos mais importantes possibilitados por seu trabalho.

Os ensaios não trazem uma lição de empoderamento apenas para as modelos que topam participar do projeto. Eles contribuem de forma indireta à todas as mulheres, em outra importante conquista: a identificação. As fotos clicadas por Céu se destacam no feed do Instagram ao gritarem diversidade e verdade. A presença de mulheres de todas as idades, cores e biotipos em fotos que escancaram a beleza real do corpo nu faz com que o público feminino se identifique com a modelo representada. “Recebo muitas mensagens de meninas que se vêem nas fotografias. Elas passam a ver que existem mulheres reais assim como elas, e que são belas como realmente são”. Esse sentimento, afastado pelas décadas de representação injusta do corpo feminino, é um grande passo no caminho da liberdade feminina. “Ainda mais para as próximas gerações de meninas, que irão desde pequenas se sentir representadas”, conclui Isis.

Para saber mais sobre o projeto, clique aqui.

Por Giovanna Stael
giovannastael@usp.br

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