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Amy Winehouse: a vida após a morte

Imagem em destaque: Fredy Alexandrakis/Comunicação Visual – Jornalismo Júnior Como a matamos Meredith Graves, cantora punk e apresentadora da MTV, disse uma vez em um ensaio sobre a autenticidade de Lana Del Rey: “Eu cheguei a uma conclusão; que o culto da personalidade que ronda os artistas existe devido a um mundo insensível que não …

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Imagem em destaque: Fredy Alexandrakis/Comunicação Visual – Jornalismo Júnior

Como a matamos

Meredith Graves, cantora punk e apresentadora da MTV, disse uma vez em um ensaio sobre a autenticidade de Lana Del Rey: “Eu cheguei a uma conclusão; que o culto da personalidade que ronda os artistas existe devido a um mundo insensível que não ama nada mais do que destruir pessoas sensíveis e talentosas. Os sistemas opressores que nos rodeiam nos forçam a assumir personas da mesma forma que castelos têm fossos – elas não podem protegê-lo para sempre, mas podem funcionar por um tempinho para impedir os malvados de entrarem. Isso não é seguro nem positivo para corações humanos, independentemente de seus respectivos privilégios quanto à classe ou gênero”.

Talvez o mais surpreendente sobre a morte de Amy Winehouse foi como todos já sabíamos que ia acontecer. Não foi como Robin Williams, ou Michael Jackson, que morreram sem aviso, revelando um histórico escondido de vício e distúrbios psíquicos. O que tornava Amy uma estrela tão inusitada – e vulnerável -, é o fato de ela nunca ter se escondido atrás de uma persona para as câmeras dos tabloides. Ela sempre foi, para o bem ou para o mal, irredutivelmente si mesma. Complicada, viciada, agressiva, sensível: humana.

Não estamos acostumados com isso. A maioria das pessoas sob o olhar clínico do público se protegem atrás de representações bem arquitetadas de si mesmas. Uma foto da praia no Instagram, uma aparição num programa de entrevista, um tweet engraçadinho – é como a eterna timeline de caras sorridentes do seu Facebook. É por isso que tão frequentemente o fator da “autenticidade” entra em questão quando discutimos a produção de algum artista. Ao mesmo tempo em que cultuamos os autênticos, temos a tendência de expô-los ao ridículo, talvez devido a sua fragilidade, talvez devido a nossa incapacidade de separar a vida pública da pessoal, no tocante às grandes celebridades.

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Winehouse se expôs, e muito. Não apenas devido à ação invasiva da mídia do entretenimento, que insistiu em divulgar todos os seus momentos de maior fraqueza; ela se expôs deliberadamente: suas letras eram uma janela para seu mundo; ela mesma se tornou um livro aberto, porque esse era o único modo que encontrava de criar arte que para ela fizesse sentido. Ela era uma cantora, autora e compositora genuína.

É claro, essa maneira de lidar com a música provavelmente funciona melhor com audiências reduzidas. Entretanto, nunca foi a intenção de Amy que sua fama atingisse as proporções que atingiu, muito pelo contrário. Vários foram os momentos em que se tornou visível seu desprezo por todo o circuito da grande mídia, os grandes festivais, as propagandas, os programas de TV. Ela era uma fã dos clássicos, seus ídolos eram Billie Holiday, Thelonious Monk, Tony Bennett. O pequeno espaço entre o reconhecimento e a celebridade era tudo o que almejava, e ela poderia passar toda a sua vida cantando jazz em pequenos bares e cafés.

Acontece que Winehouse tinha um talento excepcional, que não pôde passar despercebido. Nós, não satisfeitos com o que ela aceitava compartilhar – o que já era muito -, a colocamos nas manchetes e capas de revista. Lá ela estava, até em seus últimos momentos: magra demais, possivelmente devido a um surto de sua recorrente bulimia, ou por causa dos efeitos da heroína, provavelmente os dois. Dentes amarelados, cabelo despenteado. Seu próprio pai tentou capitalizar sobre a situação, fazendo de sua vida um reality show. Ela era um desastre ambulante em câmera lenta: sim, todos sabíamos o que ia acontecer, mas não conseguimos parar de assistir.

Dois álbuns e o que mais poderia ter sido

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Imagem: Fredy Alexandrakis

Alguns viam Amy Winehouse como o sopro de vida do qual a música mainstream tanto precisava: ao mesmo tempo em que seu cabedal de conhecimentos em jazz a capacitava para compor melodias e progressões musicais mais sofisticadas, suas canções lembravam mais um neo-soul, com a acessibilidade dos grupos de pop vocal femininos da década de 60.

Seu primeiro lançamento se deu em 2003 com Frank, um álbum transbordando de personalidade; cada canção pontuada por comentários honestos e carismáticos, além de reflexões inteligentes sobre o campo dos relacionamentos amorosos. Fuck Me Pumps é o single que se destaca por seu grau de ironia e tema diferenciado: uma crítica ácida a mulheres superficiais e gananciosas, embalada por um ritmo envolvente. Por outro lado (There Is) No Greater Love marca por sua sensibilidade – é a música mais fiel às influências da cantora, uma versão da canção já interpretada por Billie Holiday, Nat King Cole, Aretha Franklin e outros, e que não passa vergonha frente aos grandes nomes do jazz e do blues.

O sucesso humilde (mas respeitável) atingido por seu primeiro disco, aclamado pela crítica, criou certa expectativa em torno de seu próximo trabalho. Este só viria três anos depois, com Back to Black. Escrito após um rompimento complicado com Blake-Fielder Civil, seguido de uma recaída à depressão e ao alcoolismo, o álbum é de uma leveza que surpreende: retém o humor negro de seu antecessor, e amplifica suas sensibilidades com o pop, graças à participação do produtor Mark Ronson. O disco subiu ao topo das paradas britânicas, onde ficou por três semanas. Rehab, seu principal single, atingiu o número 10 na lista da Billboard e a rendeu comparações a Etta James e Ella Fitzgerald. Foi seu último álbum lançado em vida.

Porém, pouco antes de seu falecimento, Amy começou a traçar planos para um novo projeto, mais focado em jazz: ela teria discutido com Questlove (baterista do The Roots) a ideia de começar um super-grupo com Mos Def e Raphael Saadiq. Em entrevista, Questlove a chamou de “esnobe de jazz”, e afirmou que ela teria passado “lições de casa” para os membros da banda que nunca foi: indicações de seus discos favoritos, que ela mandava os outros estudarem. Isso se refletiu no álbum póstumo Lioness: Hidden Treasures, lançado em 2011, que contava com um dueto com Tony Bennett do jazz standart Body and Soul, além de versões de Garota de Ipanema e Our Day Will Come.

Como a mantemos viva

No dia 23 de julho de 2011, Amy Winehouse foi encontrada morta em sua cama, com um laptop ao seu lado e garrafas de vodka no chão. De acordo com seu guarda-costas Andrew Morris, ela estava assistindo a  vídeos de si mesma no YouTube. Agora, já fazem 5 anos da morte dela. A memória de sua presença aqui ainda está fresca, e não demonstra intenções de ir embora. De certo modo, é o que a matou que a mantém viva hoje. Pense em suas canções como pequenos pedacinhos de sua vida que ela deixou conosco, que extraímos dela. Esses registros são tão poderosos e perduram por tanto tempo porque, apesar de suas especificidades, comunicam algo de universal, sobre a experiência humana. Eles operam num modo one-size-fits-all: Love Is a Losing Game, por exemplo, pode ter sido escrita após o término de seu relacionamento com Fielder-Civil; mas também é a trilha sonora da sua última decepção amorosa. A honestidade latente de confissões como essa permite a identificação do ouvinte. É possível que você escute Tears Dry On Their Own para superar alguma dificuldade emocional, e inadvertidamente estará revivendo o legado de Winehouse. O caráter autobiográfico de toda a sua obra eterniza seus momentos em vida.

Por Fredy Alexandrakis
fredy.alexandrakis@gmail.com

1 comentário em “Amy Winehouse: a vida após a morte”

  1. Cara, eu sou um fã de Amy Winehouse, e achei esse texto brilhante, fabuloso. Já chorei bastante por sentir sua falta, mas hoje procuro mantê-la viva através de publicações, seu som. E sim, como Amy jamais haverá! Sua verdade, com toda sua cru-eldade é de algo que não se encontra mais nos dias de hoje, ao menos não tão facilmente. Me dói lembrarque seus planos não se finalizaram… sinto saudades ? parar, pensar e lembrar que não teremos algo lançado pela própria é doloroso demais.

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