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Peça Amadores: A potência do relato

Imagine a si mesmo calculando antecipadamente, enquanto anda pela rua, os desvios que terá de fazer das multidões apressadas nas calçadas de São Paulo. Você falha em alguns momentos e produz aqueles encontros infinitesimais de formiga: um encarar involuntário e um automático movimento de saída do embaraço que é ter com um desconhecido. Ou, então, …

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Imagine a si mesmo calculando antecipadamente, enquanto anda pela rua, os desvios que terá de fazer das multidões apressadas nas calçadas de São Paulo. Você falha em alguns momentos e produz aqueles encontros infinitesimais de formiga: um encarar involuntário e um automático movimento de saída do embaraço que é ter com um desconhecido. Ou, então, veja-se com a tez colada na janela de um ônibus. As vozes que saem do fone são as únicas que você quer ouvir. Você empresta um olhar indiferente às paisagens duras da terra da garoa. Nos dois casos, saltam aos seus olhos os seguintes dizeres num cartaz mal colado no ponto de parada: “Precisa-se de artistas amadores sem experiência. Remunerado.”. O que você faria? O que pensaria? O que mudaria no seu trajeto?

Se a resposta vier com dificuldade, ou sair em forma abstrata, hesitante, transitando entre quereres e realidades, vá ver a nova peça da Cia Hiato, Amadores, no Sesc Consolação entre os dias 26 e 29 de maio. Se vier com uma certeza aventureira, a peça também é pra você. Lá, você encontrará pessoas que foram selecionadas por anúncios de jornal e entraram no palco trajando suas próprias vidas como máscara. É isso: as atrizes e os atores são sujeitos com quem você bem pode trombar no caminho para o trabalho, e não seres etéreos como costumamos supor os artistas. Professores, dançarinos, estudantes, ex-lutadores, donas de casa, atores, advogados, protagonistas de cotidianos diversos, multifacetados, recordam a todos nós o sublime do individual e a grandeza das coisas pequenas através de uma série de depoimentos e representações.

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Elenco da peça Amadores. Imagem: Divulgação – Cia Hiato

 

O amadorismo vem em forma de pensamento da própria construção do teatro e não da falta de habilidades dos participantes. Um crítico-personagem (ou personagem-crítico) atravessa algumas histórias com observações sobre o fazer arte. A referência central é o filme Rocky: um lutador, mas apenas como forma de atender a uma “compulsão por grandes narrativas” e como quebra da expectativa de um roteiro que acompanhe o movimento cíclico da “Jornada do Herói”: o equilíbrio do protagonista, um chamado à aventura, a recusa, encontro com o mentor, inimigos e assim vai; o que há, em contrapartida, é o uso desses elementos direcionados ao florescimento dos discursos que se calam nas restrições do mundo. Que se calam na questão de classe. De gênero. De cultura. De sexualidade. E em outros anseios e angústias inerentes à vida humana.

Agora, transporte-se para um teatro. Os holofotes miram seu corpo e o jogo de luz transforma tudo o que é alheio a você em breu. Você imagina que interesse poderia haver no seu trajeto até ali. Que efeitos poderiam causar suas memórias do emprego como office-boy, ou suas experiências de luta com as drogas. O que você observa na plateia é um misto de reações: risos, emoção, seriedade. Em suma, identificação, empatia. E não é algo magnífico perceber que você não está sozinho? Que sua luta é comum?

Numa produção consciente de seu estado de produção – porque tematiza, por exemplo, como nasceu a peça -, Amadores traz a força dos relatos como lembrança de que nossas peculiaridades podem afetar mais do que imaginamos, enquanto permeia temas relacionados aos combates nos ringues da vida.  

Ainda não satisfeito, encontre-se, por último, na posição de espectador. Veja todos as exposições pessoais ecoando poeticamente com performances nada amadoras de músicas de nada amadores como Cazuza, Caetano e Beyoncé. Repare as (re)significações, revisite as perguntas iniciais e então protagonize as mensagens nas ruas, no ônibus, nas casas, na fazenda e numa casinha de sapê.

 

De 26 de abril a 29 de maio de quinta a domingo,

Local: SESC Consolação

Endereço: Rua Dr.Vila Nova, 245

R$40,00 inteira / R$20,00 meia / R$12,00 comerciário

 

Por Wagner Nascimento
wagneriano7@gmail.com

 

 

 

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