por Bianca Caballero
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Um fenômeno. Isso é o mínimo que se pode dizer do que foram os trapalhões na televisão e no cinema brasileiro. Enorme sucesso com as crianças e também parte da rotina de adultos e adolescentes. Didi, Dedé, Mussum e Zacarias deixaram suas marcas em diversas gerações e seus modos simples e cativantes de fazer graça serão vistos por muitos anos como um exemplo de humor.
História na TV
Em 1966, na TV Excelsior de São Paulo, estreou Adoráveis Trapalhões, que em sua formação original contava apenas com Didi e Dedé. Mussum e Zacarias passaram a fazer parte do programa só algum tempo depois. Na TV Record o show teve o nome Os Insociáveis e na TV Tupi se consolidou como Os Trapalhões. Nesta última o programa superou a audiência de líderes como o Fantástico. Entretanto, como a emissora já apresentava problemas, os trapalhões foram para a Rede Globo em 1977.
Ao receberem uma proposta de Boni para fazer parte da emissora, Renato Aragão ficou temeroso quanto à liberdade que teria dentro do canal. Assim, para não recusar o convite fez uma enorme lista de exigências, especificando quem seria diretor, redator e até qual o horário do programa. Surpreendentemente, a Globo queria tanto os trapalhões em sua grade que aceitou todas as condições. No dia 13 de março de 1977 o programa estreou na emissora sendo exibido aos domingos antes do fantástico e teve 30 anos de altos e baixos, mas principalmente de sucesso e risadas.
Com tantos anos de duração era inevitável que o programa passasse por diversas mudanças. Entre alterações de cargos importantes como diretores e roteiristas, alguns dos aspectos que sempre mudavam eram a presença de plateia, o direcionamento maior ou menor ao público infantil, o aumento ou a diminuição da quantidade e da duração dos esquetes, quadros e cenas externas, além de qual desses estava mais presente em cada programa.
Independente de tais mudanças o programa se manteve um enorme sucesso durante anos. Mas como nem tudo é alegria, um dos momentos mais delicados em sua história foram as “férias conjugais”, como Renato Aragão chama a época em que o grupo se separou momentaneamente. Durante os seis meses separados, Dedé, Mussum e Zacarias romperam com a Renato Aragão Produções, que cuidava dos negócios do grupo, e criaram a empresa Demuza. Assim seguiram sozinhos na carreira cinematográfica enquanto Renato Aragão tocava o programa.
O tempo passou e, ao pensar nos principais fatores que levaram ao fim do programa, é importante citar a morte de dois grandes atores que faziam parte do quarteto: Mauro Faccio Gomes, o Zacarias, e Antônio Carlos Bernardes Gomes, o Mussum. Em 18 de março de 1990, Zacarias morreu de insuficiência respiratória. Renato Aragão afirma que por pouco a morte do amigo não levou ao fim do grupo e que, após decidirem continuar o programa como forma de homenageá-lo, este precisou passar por grandes mudanças para se adaptar à falta de Zacarias. Em 29 de julho de 1994 quem deixou saudades foi Mussum, que faleceu por conta de problemas no coração. O programa continuou por pouco tempo e depois passou a exibir apenas reprises até sua reestreia em 1995.
Nos anos seguintes Didi e Dedé foram contratados por um canal de Portugal e estrelaram até 1998 Os Trapalhões em Portugal. Em seguida, passaram alguns anos separados e em meio a desentendimentos, não apenas entre os dois, mas também entre Didi e a família de Zacarias. Em 2004 a dupla se reconciliou no programa Criança Esperança e, após alguns anos trabalhando em programas diferentes, voltaram a se juntar com Dedé integrando o Elenco de A Turma do Didi, exibido até 2010 .
Personagens
Didi Mocó (Renato Aragão): O cearense Didi Mocó Sonrisal Colesterol Novalgino Mufumbbo aparece sempre como uma espécie de líder do grupo. Com uma imagem cômica, tornava-se ainda mais engraçado por utilizar, na hora de falar, várias adaptações de palavras e alguns bordões que se tornaram clássicos como “ô, psit!”.
Dedé Santana (Manfried Sant’Anna): Personagem mais sério do grupo, se diferenciava por não ter o jeito exagerado de seus amigos. É também o cérebro do quarteto e tenta resolver suas trapalhadas, ainda que por vezes também esteja envolvido nelas.
Mussum (Antônio Carlos Bernardes Gomes): O carioca foi muitas vezes considerado o mais engraçado do grupo. Com suas expressões todas terminadas em “is”, como a popular “cacildis” e caretas sempre sensacionais é compreensível que seu jeito cause muitas gargalhadas. Seu amor por bebidas alcoólicas é outra forte característica que lhe rendeu em 2013 a criação de uma bebida em sua homenagem, a Birits.
Zacarias (Mauro Faccio Gonçalves): Personagem mais caricato do grupo tem como marcas a risada engraçada, os dentes saltados e a peruca. Assim, é em si uma figura engraçada, basta sua aparência e seu jeito infantil para causar boas risadas.
No Cinema
A história dos trapalhões no cinema começou em 1965 com o longa Na Onda do Iê-Iê-Iê (Idem, 1965), estrelado apenas por Didi e Dedé. Até 1999 foram 41 filmes realizados pelo grupo, o número é questionável, pois em muitos desses longas nem todos os trapalhões estavam presentes. De qualquer modo, com o quarteto reunido foram 22 lançamentos. Uma boa prova do sucesso que fizeram nas telonas é que atualmente 5 de seus filmes estão na lista das maiores bilheterias brasileiras.
Assistindo aos filmes encontramos algumas características comuns à enorme maioria deles. O tipo de humor simples e voltado ao público infantil é bem forte. Além disso, em diversos longas esse humor é utilizado para mostrar de um modo mais leve diversos problemas da sociedade brasileira. A situação das crianças de rua, o problema da destruição das florestas e a seca do nordeste são apenas algumas das temáticas presentes nos filmes com o propósito de, desde cedo, conscientizar as crianças que acompanhavam as aventuras do grupo.
Outro aspecto presente na maioria dos filmes é a posição de Didi como uma espécie de líder e, assim, personagem principal. Além disso, este sempre possui um par romântico, diferente de seus amigos. Isso que faz com que, de certa forma, os longas sempre tenham um mocinho e uma mocinha. Outros elementos clássicos de histórias infantis que observamos nos filmes são os trapalhões representando sempre homens bonzinhos, ou até heróis, e por vezes tendo que lidar com algum inimigo que se dá mal no final. Os temas das histórias variam bastante, mas esses pontos costumam estar sempre presentes.
Por fim, é interessante citar a participação musical do quarteto nos filmes. Em divertidas performances, ou simplesmente cantando uma música de fundo, atuar não era o suficiente para os trapalhões, em diversas cenas eles soltam a voz.
Pra dar um gostinho, o Cinéfilos conta a história de alguns dos filmes de sucesso do quarteto:
Considerado pelos críticos o melhor filme do grupo Os Saltimbancos Trapalhões (Idem, 1981) junta a graça dos atores, a magia do circo e as músicas dos saltimbancos. A mistura não poderia ser mais deliciosa. Num formato de musical, as cenas são acompanhadas por algumas músicas da peça. Os interpretes são os próprios trapalhões e alguns cantores famosos, como Chico Buarque e Lucinha Lins, que também atua no filme. Em meio às performances acompanhamos os quatro interpretando funcionários de um circo do qual de repente se tornam a maior atração. Ao perceberem que são explorados pelo dono do circo, resolvem fugir e viver a vida na cidade como saltimbancos.
Os Vagabundos Trapalhões (Idem, 1982) conta a história de Bonga, homem que, junto com quatro amigos e sua namorada, vive em uma caverna na qual cuida de crianças de rua e procura pais adotivos para elas. Certo dia Pedrinho, filho de um industrial milionário, foge de casa e vai viver com eles. Seu pai oferece uma recompensa para quem encontrá-lo, de modo que, sem saber o que está acontecendo, o quarteto precisa lidar com as pessoas que querem levar o garoto. No final do filme, uma grande surpresa sobre a origem de Bonga é revelada.
Em O Casamento dos Trapalhões (Idem, 1988) o tema é a busca pelo amor. O quarteto de irmãos vive junto em uma fazenda e passa o dia cuidando de seus animais. Em um passeio pela cidade Didi encontra uma mulher e, após brigar com o vilão Expedito por sua causa, a leva para casa. Eles rapidamente se apaixonam e em outra visita à cidade, dessa vez com os quatro juntos para assistir o show de seus sobrinhos – representado pelos cantores do grupo pop Dominó – Dedé, Mussum e Zacarias, assim como os garotos, também se apaixonam. Porém para conseguir ficar em paz com seus amores ainda terão que acertar a briga mal resolvida com Expedito.
O Fênomeno
Caretas, falas engraçadas, cenas inusitadas e, como é de se esperar, personagens completamentes atrapalhados. É nisso que se baseia o humor simples e popular dos trapalhões, humor esse que conquistou gerações e deixou um forte legado. Com filmes que são facilmente encontrados na internet, livros sobre sua história e até um enredo de escola de samba em sua homenagem o que não faltam são lembranças do grupo. Os Trapalhões e o papel que tiveram dentro do humor brasileiro não serão esquecidos tão cedo e devem ficar como lição para novos humoristas, afinal, um espetáculo como esse não pode parar.