Jornalismo Júnior

logo da Jornalismo Júnior
Generic selectors
Exact matches only
Search in title
Search in content
Post Type Selectors
Generic selectors
Exact matches only
Search in title
Search in content
Post Type Selectors

Observatório | A crise institucional da CBF

Caso de assédio e boicote à Copa América agitaram a semana da Confederação

Uma crise momentânea, que basta um título para tudo voltar a se conformar”. Com essas palavras, Katia Rubio, professora da Escola de Educação Física e Esporte (EEFE) da Universidade de São Paulo, descreve a crise da Confederação Brasileira de Futebol (CBF) que explodiu essa semana. Ainda que o assunto não tenha sido esquecido, ele encontrou seu desfecho na terça-feira (8). Mas antes de chegar às conclusões, retornamos ao início para refletir como as questões institucionais da CBF se tornaram pauta nacional.

 

O início de tudo

Rogério Caboclo [Imagem: Lucas Figueiredo/CBF]
 Há cerca de um mês, a CBF entrou em uma crise após seu presidente, Rogério Caboclo, ser acusado de cometer assédio sexual e moral contra uma funcionária. A denúncia, que só foi oficializada na sexta-feira (4), trouxe à tona comportamentos inadequados de Caboclo com seus subordinados, colocando à prova sua permanência no cargo.

Casos de assédio como esse, sobretudo no futebol, ainda são muito comuns e recebem pouca atenção do público — há menos de um mês, por exemplo, a Nike divulgou que o fim da parceria com Neymar, em 2020, ocorreu em razão de denúncias de assédio sexual contra o jogador. Mas essa não foi a situação do presidente da CBF. Um mês após a vítima tornar o acontecimento público para os seus colegas e o caso ter aparecido nos portais ESPN e Globo Esporte, a acusação contra Caboclo voltou aos holofotes com mais força. E o que mudou de lá para cá? A realização da Copa América no Brasil.

 

A Copa América: uma tentativa de reverter a situação

No dia 31 de maio, o Brasil foi anunciado como sede da Copa América. Originalmente previsto para 2020, o evento foi adiado para 2021 devido a pandemia da Covid-19. A princípio, Argentina e Colômbia partilhariam a sede do evento, porém, por problemas sanitários e políticos, ambos os países desistiram. Diante desse cenário, a escolha do Brasil como nova sede do campeonato foi justificada pelos fatos do país contar com uma estrutura capacitada remanescente da Copa do Mundo de 2014 e ter conduzido os campeonatos nacionais durante a pandemia (Campeonatos estaduais e Copa do Brasil). 

“O desgaste [da CBF] já era grande. A Copa América, na verdade, foi uma tentativa de melhorar a própria imagem” é o que Felipe Lobo, jornalista esportivo do site Trivela, afirma. Desde então, a realização dos jogos se tornou um debate na mídia. Ao contrário do planejado, a CBF, representada por seu presidente, foi alvo de críticas dos jornais, que argumentam sobre os riscos de sediar o evento no contexto da pandemia e das mais de 400 mil mortes por Covid-19 no Brasil. Rapidamente a reprovação se estendeu ao presidente Jair Bolsonaro (sem partido), que permitiu a realização do torneio, e a discussão foi tomada pela polarização.

Seleção brasileira ao chegar no Paraguai para o jogo de terça-feira [Imagem: Lucas Figueiredo/CBF]
Diante de toda polêmica sobre a Copa América, Felipe Lobo comenta que um torneio grande como esse acontecer no Brasil “não faz sentido”. Ele ainda aponta: o Brasileirão e a Libertadores também têm riscos e, à princípio, deveriam ser parados também. “A grande diferença entre eles é que o futebol é uma indústria, assim como tantas outras, e não jogar por um ano e meio ou dois seria impossível”. Para Felipe, os jogos da série C e D, mesmo com riscos, são os mais justificáveis de continuar, pois muitos jogadores dependem do salário. “Mas a Copa América é uma competição que nem deveria acontecer mesmo sem pandemia, porque já aconteceu em 2019, em 2016 e em 2015. Seria melhor cancelar e só realizar a edição de 2024”. 

Já para a professora Katia Rubio, a Copa América envolve muitas questões e não pode ser analisada de forma dicotômica: “Falta um relativismo nas posições tanto de leitura do mundo e isso dificulta o entendimento de qualquer coisa”. Para ela, a decisão final não está necessariamente ligada ao problema sanitário, mas sim a uma união de interesses que não ficam transparentes para o público. “Há um grito de não vai ter Copa América, de todos os lados, mas ninguém falou nada do Pan-Americano de ginástica que aconteceu esse final de semana. Por quê? Competição por competição, o campeonato de ginástica envolve tantas pessoas quanto no jogo de futebol”. 

Sendo possível ou não fazer uma análise clara da situação, a competição foi alvo de debates durante a semana. E entre aqueles que são contrários à realização do torneio, surge um aliado: Tite, o treinador da seleção.

Tite: o elo que une os problemas

Com a pressão das eliminatórias nas costas, Tite ainda enfrentou problemas com Caboclo, que, segundo relatos, apareceu bêbado no vestiário do time. Supunha-se que Tite tinha uma opinião contrária à realização da Copa América, pois chegou a afirmar em uma coletiva de imprensa, no dia 3 de junho, que “a [posição] de todos os atletas está muito clara, muito limpa”, porém sem afirmar qual posição era essa de fato.

A tensão sobre a CBF aumentou, e o boicote da seleção à Copa América passou a ser especulado como uma possibilidade. Em resposta, Rogério Caboclo tornou pública sua insatisfação com Tite, tanto pelos conflitos anteriores quanto suas últimas declarações, e prometeu ao governo federal que substituiria o técnico após o jogo contra o Paraguai, na terça-feira (8), por Renato Gaúcho. 

Tite no jogo Paraguai x Brasil no dia 08/06/2021 [Imagem: Lucas Figueiredo/CBF]
Nesse meio tempo, Tite foi transformado em um “herói nacional” por alguns e em “inimigo” por aqueles à favor da Copa América, que chegaram, inclusive, a levantar a hashtag #ForaTite no Twitter. Mantendo sua postura evasiva, corroborada pelo silêncio dos jogadores, a situação de Tite e da seleção ficou suspensa até segunda-feira (7), quando o time publicou que participaria da Copa.


Desfechos

No domingo (6), Caboclo foi afastado por 30 dias da presidência devido às denúncias de assédio. O prolongamento da medida contra o presidente, contudo, ainda não está estabelecido. Nesta semana, alguns times assinaram um comunicado solicitando à CBF a demissão efetiva de Rogério Caboclo, mas é possível que o dirigente retorne ao cargo após a sua suspensão. O que ficou certo é que a suspensão de Caboclo garantiu a permanência de Tite: a punição aconteceu antes que a promessa de demissão do técnico pudesse ser cumprida. 

Após esse desfecho, o assunto voltou a ser pautado na noite do dia 8, quando Tite e os jogadores soltaram um “manifesto” sobre a realização da Copa América no Brasil. O que aconteceu não agradou aqueles que esperavam o boicote ao campeonato. Com os dizeres “Quando nasce um brasileiro, nasce um torcedor”, a seleção afirmou que, independente da situação, não daria as costas ao time. No manifesto não é citada a negligência da pandemia no país ou os mais de 480 mil brasileiros que perderam suas vidas em razão disso. Também não há menção alguma a Caboclo e à CBF, que seriam os principais motivos da “revolta” dos jogadores. 

 

Tite e os jogadores durante treino [Imagem: Lucas Figueiredo/CBF]

Quanto à Copa América, hoje acontece o seu primeiro jogo em solo brasileiro. E assim, mesmo com a crise na instituição, a CBF alcançou seu objetivo inicial e as polêmicas foram jogadas embaixo do tapete — inclusive os mais de 480 mil brasileiros que não estarão aqui para assistir aos resultados.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Rolar para cima