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Festa em Jundiaí: há 20 anos, o Paulista sagrava-se campeão da Copa do Brasil

Relembre os destaques e a trajetória do Galo da Japi na edição de 2005 do torneio de mata-mata da CBF

Por Hellen Indrigo (hellenindrigoperez@usp.br) e Arthur Souza (thursouzs07@usp.br)

Em 2005, o Paulista Futebol Clube – mais conhecido como Paulista de Jundiaí – realizou um feito heróico que ficou marcado na história do futebol brasileiro. Apesar de não fazer parte da lista de grandes clubes do país, o time conseguiu avançar fase a fase na Copa do Brasil, derrotou diversas equipes da Série A até agarrar o troféu.

A história do Galo do Japi

No fim do século XIX, o investimento na construção de ferrovias no estado de São Paulo cresceu, principalmente por conta da necessidade de escoar o açúcar e o café que eram produzidos no estado até o Porto de Santos. A Companhia Paulista de Estradas de Ferro surgiu nesse contexto, quando um grupo de fazendeiros e capitalistas locais se uniu para ampliar o trecho ferroviário que existia de Jundiaí a Santos, levando-o até Campinas.

O Paulista de Jundiaí nasceu dentro da Companhia em 1909, e foi ligado à ela até meados da década de 40. “Os jogadores eram funcionários da Companhia. Naquela época, o futebol era amador e os jogadores não recebiam para praticar o esporte, então a Companhia Paulista ofertava empregos para poder tê-los no time”, afirma Ivan Gottardo, pesquisador da história do clube, em entrevista ao Arquibancada.

O Museu dos Ferroviários de Jundiaí exibe uma exposição sobre a importância das estradas de ferro para a região, inclusive sob a ótica do esporte [Imagem: Reprodução/Flickr]

Entre os anos de 1918 e 1957 a equipe mandou suas partidas em um estádio na Zona Central de Jundiaí, conhecido popularmente como Vila Leme. Apesar de existir um plano de ampliação do local, o crescimento rápido da região não deixou espaço para a obra e fez com que os responsáveis pelo clube precisassem encontrar outro terreno para a construção de sua nova casa. Assim surgiu o Jayme Cintra, que foi inaugurado em 1957 em vitória por 3 a 1 sobre o Palmeiras.

Imagem da última partida do Paulista no Estádio da Vila Leme, no dia 3 de dezembro de 1958 [Imagem: Reprodução/Wikimedia Commons]

O estádio ainda precisou de décadas de reformas para se tornar da forma como é conhecido nos dias atuais. “Na época só tinha o gramado cercado e as arquibancadas de terra. Os muros foram feitos para delimitar o terreno, e somente isso. As arquibancadas de concreto, a parte das cadeiras e a parte social foram sendo construídas durante 20 ou 30 anos, até chegar em como são hoje”, conta Ivan.

O Jayme Cintra, atualmente, é considerado o maior patrimônio do Paulista, mas já precisou ser penhorado devido a dificuldades financeiras enfrentadas pelo clube, que pioraram após o declínio das estradas de ferro. Segundo Ivan, um processo está sendo aberto no Conselho Municipal para tombar o estádio e garantir que sua memória seja preservada. Já o Vila Leme, antiga casa do clube, foi demolido e hoje dá lugar a um estacionamento e a ruas residenciais. 

O Galo enfrentou um começo difícil nas suas primeiras participações em campeonatos profissionais, pois ainda contava com uma estrutura praticamente amadora. Após se filiar à Federação Paulista de Futebol em 1933, o Paulista passou a participar das competições promovidas por ela, porém sem ter destaque. O primeiro acesso do clube à primeira divisão do Campeonato Estadual ocorreu somente em 1968.

Antes da classificação 

Em 1998, o Paulista se tornou um clube-empresa por meio de uma parceria com a Parmalat, chegando inclusive a alterar seu nome para “Etti Jundiaí”. A união surtiu efeito enquanto durou: o time subiu da Série A2 para a Série A1 do Campeonato Paulista, e abandonou a Série C do Campeonato Brasileiro para ocupar uma vaga na Série B.

A parceria terminou em 2002 em meio ao início do escândalo que terminou com a falência da Parmalat, e o Paulista retomou seu antigo nome. Sua campanha no Paulistão de 2003 não foi tão eficiente, mas essa realidade mudou no ano seguinte: o trabalho de captação de jogadores da base feito pela Parmalat permaneceu como uma consequência positiva para o time.

Na temporada seguinte, o Galo do Japi conquistou a maior oportunidade de sua história: como vice-campeão do Paulistão de 2004, o clube avançou direto para a lista de equipes que viriam a disputar a Copa do Brasil em 2005.

Chamada para a final do Paulistão de 2004 [Imagem: Reprodução/Youtube: Reisson Vilares]

O caminho rumo ao título

Um novato, Vagner Mancini

Pouco menos de um mês após o vice-campeonato estadual, o Paulista se despediu de Zetti, que realizou no clube sua primeira experiência como treinador profissional. Entusiasmada com o sucesso desportivo do clube sob o comando do ex-goleiro e ídolo do São Paulo, a diretoria do Galo decidiu que colocaria mais uma vez o cargo de treinador à disposição de técnicos emergentes. A oportunidade foi concedida a Vagner Mancini, que jogava pelo Ituano quando recebeu o convite da equipe jundiaiense. 

Ao fim de sua carreira como atleta, o então volante esteve em Jundiaí de 2001 a 2003, onde se tornou ídolo após a conquista da taça da Série C e o acesso ao segundo escalão do futebol nacional. Segundo Ivan, a identificação com a torcida e as boas relações que cultivou dentro do clube durante o período em que vestiu a camisa tricolor foram fundamentais para que Mancini aceitasse o desafio. “Mancini já conhecia o clube. Ele já conhecia os jogadores, às vezes treinavam juntos, já tinha uma amizade. Então isso foi importante, acho que a união e o entrosamento foram diferenciais para chegar ao título”, conta. 

Com a Série B em andamento, Vagner Mancini acumulou bons resultados, mas, devido aos critérios de desempate, não avançou à segunda fase da competição, na qual brigaria por uma vaga à primeira divisão. 

O esquadrão jundiaiense de 2005 

Para a temporada seguinte, o elenco foi reformulado e renovado com jovens atletas, alguns provenientes das categorias de base. Mancini armou o time em um “4-4-2 diamante”, esquema tático muito popular no Brasil a partir dos anos 90. A formação é notável por privilegiar talentos individuais, devido a sua difícil marcação e à liberdade que concede aos meio-campistas. 

Toda grande equipe começa por um bom goleiro, e com o Galo da Japi não seria diferente. Filho do treinador de goleiros do Paulista, o jovem Rafael Bracali foi criado na base do clube e rapidamente se tornou titular entre as traves, mas se destacou principalmente em 2005 pela segurança que trazia, mesmo em defesas difíceis. Na zaga, reinavam Dema e Anderson, mas o zagueiro Réver, de apenas 20 anos à época, era opção no banco de reservas e, uma vez ou outra, servia também como volante por ordem de Mancini.

Durante o jogo, a superioridade numérica no miolo das quatro linhas proporcionada pela organização em losango favorecia investidas verticais pelo centro do campo, enquanto os laterais Lucas e Julinho ficavam à cargo das ações ofensivas pelas margens, se movimentando de uma extremidade a outra. O diamante era composto pelo volante Ricardinho, recuado, pelos meias Cristian e Fábio Gomes, que protagonizavam a transição defesa-ataque, e pelo meia-armador Márcio Mossoró, um clássico camisa 10.

Em entrevista ao Arquibancada, Léo Aro, camisa nove do elenco de 2005 e natural de Jundiaí, destaca as transições ofensivas rápidas comandadas pelos meias: “A gente tinha a chegada de Cristian, Fábio Gomes e Amaral, volantes que faziam o ‘vai-vém’, iam até a área adversária e voltavam para recompor. Quando tínhamos a bola no pé, tocávamos muito bem e chegávamos com muita velocidade ao ataque”. 

À frente, a equipe dispunha de diversas opções para preencher as duas vagas de centroavantes, cada um com qualidades e funções diferentes. “Jogávamos com um centroavante fixo: Abraão, André Leonel ou Jéfferson. Já eu costumava cair pelas beiradas, correndo por todos os lados. Sempre fui um jogador muito voluntarioso, até ajudava na marcação. Mas também tínhamos o Mossoró que chegava por trás, como um terceiro atacante”, Léo analisa. 

A campanha na Copa do Brasil

Pela primeira fase da copa nacional, o Paulista enfrentou o Juventude. A partida de ida contra a equipe de Caxias do Sul foi no Estádio Jayme Cintra. O Galo chegou a abrir o placar ao início da partida, com um gol de rebote que Dema anotou, mas o assistente confirmou impedimento no lance. A sequência do jogo foi de domínio completo do Juventude, que testou constantemente o goleiro adversário, sem sucesso.

Nos acréscimos da etapa complementar, um pênalti foi marcado à favor do tricolor, após uma bola alta escorar no braço do zagueiro Jaconero. O cria da base e muito querido pela torcida Davi ficou frente à frente com o goleiro adversário, que mesmo adiantado, não conseguiu impedir a boa cobrança do atacante, na bochecha direita da rede. 

O jovem atraiu a atenção de outro tricolor: o do Morumbi. Antes do segundo jogo contra o Juventude, Davi já havia acenado positivamente para o São Paulo e não deu continuidade à boa campanha que construía junto ao Galo da Japi. 

“A saída mais traumática foi a do Davi. Ali foi preocupante. Pensamos: ‘E agora, quem é que vai ser o nove?”

Ivan Gottardo

Em noite de verão no Estádio Alfredo Jaconi, um gol de cabeça para cada lado selou o empate entre Juventude e Paulista, que garantiu a classificação do tricolor para a fase seguinte.  

A chave da Copa do Brasil levou o Paulista ao encontro do tradicional Botafogo. Em Jundiaí, nem mesmo o gramado ensopado foi capaz de atrapalhar o remate muito bem-endereçado de Márcio Mossoró para inaugurar o marcador. Pouco depois, em lance de impedimento discutível, a equipe visitante empatou com chute rasteiro de Alex Alves e encaminhou a decisão ao Rio.

Durante a partida de volta, o Paulista tomou a dianteira em duas ocasiões: a primeira, aos 3’, quando Léo emendou um chute de fora da área e o goleiro aceitou; e, aos 31’, quando Cristian cobrou uma falta na intermediária com força na perna destra e a bola subiu até tocar o topo da rede “véu de noiva”. No entanto, ambos os momentos de vantagem foram frustrados por falhas defensivas, seguidas por gols do Glorioso. 

Com o apito final e o placar agregado em 3 a 3, o Galo avançou às oitavas de final devido ao critério de gol qualificado.

Durante a construção do Estádio Olímpico Nilton Santos, o Engenhão, o Botafogo mandava seus jogos no Maracanã [Reprodução/Youtube/Paulista Futebol Clube]

Após demonstrar muita maturidade para controlar o jogo em pleno Maracanã, o elenco jundiaiense foi colocado frente à frente com o Internacional. Naquele ano, o Colorado contava com o esquadrão que viria a ser considerado um dos mais competitivos e marcantes dos anos 2000. 

No Beira-Rio, a equipe jundiaiense emplacou uma boa atuação, desde as defesas milagrosas de Rafael até os contra-ataques fulminantes que sempre passavam pelos pés de Márcio Mossoró. Após inúmeras chances desperdiçadas para os dois lados, o jogo de ida não prometia nada além de um empate sem gols. Quando os ponteiros se aproximavam dos cinco minutos finais, o zagueiro colorado Índio subiu ao ataque, fintou o primeiro marcador e deixou o segundo no chão quando foi interrompido por falta tática. Próxima à meia-lua, a cobrança de Jorge Wagner foi certeira: superou a barreira e dormiu no ângulo esquerdo do goleiro tricolor. No placar final, um para o Internacional e zero para o Paulista. 

Pouco depois da partida, especulações surgiram na imprensa acerca de uma possível saída de Ricardinho rumo ao Inter. De acordo com Mancini, o auxiliar de Muricy Ramalho, então técnico do Colorado, encontrou-se com ele ao fim do jogo e revelou o interesse do clube gaúcho pelo volante do Galo, dado seu desempenho animador no duelo de ida das oitavas de final. Sobre a transferência, Ivan comenta: “A verdade é que o Paulista sempre teve dificuldades financeiras, então era complicado segurar os atletas abordados por clubes maiores. Foi difícil, porque ele era um jogador importante para o time. Mas tivemos a sorte de o [Márcio] Mossoró crescer. No final das contas, não sentimos tanto essa falta, até porque veio o Juliano”. 

Juliano transferiu-se do Corinthians ao Paulista, foi rapidamente registrado no BID e relacionado de última hora à partida de volta contra o Internacional, devido à escassez de jogadores para completar o banco de reservas. No final da segunda etapa, o volante fez sua estreia e, aos 37’, recebeu a bola ajeitada na entrada da área e arrematou um foguete de perna direita que estufou as redes. 

O confronto terminou empatado em 1 a 1 e foi conduzido às penalidades. Com um pênalti defendido em uma ponte de Rafael e as quatro primeiras cobranças da equipe tricolor convertidas, o meia Perdigão, do Inter, partiu para a meta pressionado pelas arquibancadas do Jayme Cintra e sob urgência de conversão. A bola subiu, tocou o travessão, desceu e pingou sobre a linha do gol, sem entrar. Apesar do sufoco, Rafael tornou-se gigante na disputa por pênaltis e garantiu a classificação do Paulista.

A torcida empurrou e o time acreditava. Foi um jogão, um jogo aberto. Acho que foi a partida mais emocionante, até por ter sido contra um gigante”

Ivan Gottardo

Árbitro e assistentes ficam em dúvida sobre cobrança de Perdigão, mas a imagem é clara: sem gol [Reprodução/Youtube/Paulista Futebol Clube]

O adversário do Galo da Japi nas quartas de final foi o Figueirense, time tradicional que despontava na Série A do Campeonato Brasileiro. Em Florianópolis, o time jundiaiense desperdiçou oportunidades claras de gol e tomou um balde de água fria após falha bizarra da zaga e do goleiro: 1 a 0 Figueirense. 

O segundo embate foi mais acirrado, com a posse concentrada no meio-campo e sem grandes chances. Ainda assim, o Paulista achou um gol em seu último suspiro, quando o goleiro adversário afastou mal o cruzamento e a bola sobrou para o lateral-direito Lucas, que emendou um voleio rasteiro no canto do gol. Assim como no confronto anterior, o placar agregado foi selado em 1 a 1.

Na disputa por pênaltis, o Paulista largou à frente, com mais uma defesa de Rafael, mas logo teve sua vantagem anulada quando o goleiro adversário bloqueou a cobrança de Julinho. Os últimos dois cobradores lançaram suas cobranças por cima do gol e o Figueirense foi derrotado pelo tricolor jundiaiense. 

“Rafael foi um dos grandes destaques, com certeza. Se você for ver os melhores momentos dos jogos da Copa do Brasil, ele fez defesas importantes em todos”

Ivan Gottardo

Na semifinal, o Paulista encarou o Cruzeiro e fez o impensável: venceu o Cabuloso em casa por 3 a 1, com gols de Cristian, Mossoró e Jéfferson. O placar poderia ter sido ainda mais elástico, dado o volume de jogo do time, que aproveitou todas as oportunidades que teve para finalizar, mas ficou pelo caminho em boas defesas de um ainda jovem e promissor goleiro Fábio. O sonho de disputar uma final de Copa do Brasil estava a 90 minutos de distância. 

O camisa 18 Jéfferson marca contra o Cruzeiro e imita cupido para declarar sua paixão à torcida [Reprodução/Youtube/Hilhotta – Futebol Antigo]

Entretanto, no jogo de volta, o placar foi revertido com dois gols de Fred e o primeiro tempo foi encerrado com vitória do Cruzeiro por 3 a 0 em pleno Mineirão, resultado que eliminava o Paulista. A expectativa para o segundo tempo era de que o clube mineiro ampliasse o placar em uma goleada histórica. “Eles já tinham goleado outros times na Copa do Brasil”, menciona Ivan. Porém, o tricolor voltou à campo e, aos 2’ da etapa complementar, a equipe recebeu uma falta na entrada da área. Cristian, que já havia anotado um gol de bola parada na competição, partiu para a cobrança e bateu a bola rasteira, que passou pela perna aberta de um dos jogadores da barreira e morreu dentro do gol. 

Dois minutos depois, outra falta. À mesma distância, do mesmo lugar, com o mesmo batedor e a mesma batida, o desfecho não poderia ser diferente: gol. Inspirados no Milagre de Istambul, que ocorrera dias antes, o time transformou uma derrota por 4 a 3 em uma classificação pelo placar agregado de 5 a 4.

“Quando começou a Copa do Brasil, ninguém tinha expectativa. O time ia participar e se passasse da primeira fase já estava no lucro. Mas ao longo da competição, vimos que dava para chegar mais longe, principalmente porque os adversários não conseguiam jogar na nossa casa”, comenta Ivan. Ele completa: “Só comecei a acreditar no título depois da semifinal, quando tiramos o Cruzeiro. Para mim, o Cruzeiro era o melhor time do Brasil na época”.

Léo conta que a vitória sobre o Cabuloso também fez com que ele passasse a acreditar que o time poderia ser campeão: “Claro que sempre entramos em um campeonato com o sonho de vencer. A gente sabia que seria muito difícil, porque nós éramos um clube do interior que só iria encarar gigantes do futebol brasileiro. Mas é claro que na primeira, na segunda fase, a gente foi passando e sonhando com a próxima”.

Escalação para a primeira perna contra o Fluminense [Reprodução/Youtube/Paulista Futebol Clube]

A primeira partida da final contra o Fluminense foi disputada em Jundiaí. Diante de sua torcida, o Galo demonstrou superioridade em todos os setores do campo: o sistema defensivo aprendeu com as fragilidades acumuladas durante a campanha e Réver, ainda jovem, jogou como se tivesse anos de experiência; e os meias lutaram por cada lance, apoiavam a defesa e operavam a transição ofensiva com maestria, passes direcionados e velocidade. 

A primeira situação de gol se iniciou em um três contra três, quando Fábio Gomes tocou a bola para Léo, que fez o corta-luz, tirando dois zagueiros da jogada, e deixou Márcio Mossoró livre para o chute. O camisa oito recebeu de frente para o goleiro, se desvencilhou do marcador e estufou as redes. Aos 38’, um lançamento preciso de Fábio Vidal colocou Léo cara-a-cara com o gol. O centroavante quase deixou a bola escapar, mas chegou a tempo de encobrir o goleiro adiantado e consagrou-se com o segundo gol da grande vitória do Paulista. 

“Fazer um gol em uma final de Copa do Brasil é uma das maiores vitórias que eu tenho na minha vida. Na hora eu fiquei louco, acabei correndo para a torcida e subindo no alambrado e, quando voltei para o campo, o juíz me deu o cartão amarelo. Mas é indescritível. Profissionalmente, é o maior feito que eu tive na vida”, afirma Léo.

Em êxtase, Léo corre à torcida e se pendura no alambrado do Jayme Cintra, o resultado: recebe o terceiro cartão amarelo e fica de fora da partida de volta [Reprodução/Youtube/Paulista Futebol Clube]

“O primeiro jogo aqui foi um massacre. Foi 2 a 0 mas poderia ter sido cinco ou seis, fácil. E lá [no Rio], jogamos só para se defender, retrancado”

Ivan Gottardo

Devido às reformas no Maracanã para sediar os Jogos Pan-Americanos de 2007, o segundo jogo da decisão foi realocado em São Januário, a casa do Vasco da Gama.

Jogadores e comissão técnica do Galo relataram a hostilidade com que foram recebidos no Rio: rojões de madrugada em frente ao hotel e apedrejamento ao ônibus da equipe. Nada disso foi suficiente para interferir no desempenho do time dentro das quatro linhas. O Paulista entrou em campo compromissado com um jogo defensivo e permitiu que o Fluminense concentrasse a posse e as principais ações ofensivas da partida. 

A equipe de Vagner Mancini, talvez pela primeira vez naquela competição, jogou acuada, compenetrada a manter o resultado. Mais por incompetência do ataque adversário do que por sorte, o Paulista encerrou a partida sem sofrer um gol sequer e sagrou-se campeão da Copa do Brasil com placar agregado de 2 a 0 sobre o tricolor das Laranjeiras. 

Léo conta que a comemoração após a vitória foi incrível: “Sem palavras. A gente nem conseguiu dormir naquele dia no Rio, mas a volta para casa também foi mais do que especial: um pouco antes de chegar na Avenida Jundiaí já tinha um caminhão do Corpo de Bombeiros esperando, e fazer o trajeto andando pela cidade foi sensacional.” Ele completa dizendo que, por ter crescido em Jundiaí, viu muitas pessoas que participaram de sua infância ao longo do passeio pela cidade, o que foi uma alegria imensa.

A taça da Copa do Brasil de 2005 foi erguida pelo capitão do Paulista, o zagueiro Anderson “Batatais”, que recebeu este apelido por ser natural da cidade homônima [Reprodução/Instagram/@paulistafc]

A campanha histórica do Galo da Japi não voltou a acontecer desde então e dificilmente será reeditada, devido à elitização do futebol nacional que se reflete na Copa do Brasil, torneio que ainda é erroneamente tido por muitos como “democrático”. 

Noites de Copa Libertadores no Jayme Cintra

“Nem em campeonato de botão eu tinha pensado em ver um jogo de Libertadores no Jayme Cintra”

Ivan Gottardo

Nos minutos finais do empate por 0 a 0 contra o Fluminense, o narrador Jota Júnior, que realizou a transmissão oficial da partida, ao invés de enaltecer o título inédito do Galo jundiaiense, bradou: “O Paulista está na Libertadores da América de 2006”, tamanha a importância do feito para o clube modesto do interior de São Paulo. O tricolor se juntaria à Santo André, São Caetano e Guarani na lista de equipes paulistas fora do eixo São Paulo-Santos a participarem do principal torneio continental da América do Sul.

Na ocasião, a equipe dividiu o grupo com River Plate, da Argentina, Libertad, do Paraguai, e o equatoriano El Nacional. Em 14 de fevereiro de 2006, o Galo da Japi estreou na Copa Libertadores em Quito, com empate por 1 a 1 contra o El Nacional. 

Na sequência, o tricolor jundiaiense trouxe o Libertad ao Jayme Cintra, mas não fez valer o mando de campo e, em jogo duro, como um verdadeiro clássico sul-americano, empatou sem gols. Somados dois pontos em duas partidas, o time de Vagner Mancini começava a sentir a urgência de uma vitória. 

Já sem vários dos destaques do título da Copa do Brasil, como Léo, Mossoró, Anderson e Cristian, o Paulista não possuía profundidade em seu elenco, bem como qualidade e entrosamento muito inferiores se comparado à equipe do ano anterior. Ivan acredita que a diretoria falhou na captação de recursos financeiros para tornar a equipe mais competitiva, à exemplo da ausência de patrocinadores nos uniformes destinados ao torneio da CONMEBOL.

“A expectativa para a Libertadores era baixa, assim como quando entramos na Copa do Brasil. Saíram uns quatro ou cinco jogadores importantes, então o time para a Libertadores era um pouco abaixo. Faltou estrutura e planejamento para montar um elenco melhor”, explica.

Contra o River Plate, em pleno Monumental de Nuñez, o Paulista entrou em campo descompassado, inadequado ao ritmo imposto pela equipe adversária do início ao fim, e foi goleado por 4 a 1. 

Em Jundiaí, los millionarios sentiram a atmosfera do Jayme Cintra ainda no princípio do jogo e foram surpreendidos por bomba do volante Amaral, ainda na intermediária, que abriu o placar. Em seguida, Jaílson recebeu cruzamento perfeito de Lucas e subiu alto para cabecear contra o gol: 2 a 0 Paulista, com apenas 18 minutos de jogo.

Aos 19’, Patiño chutou fraco da entrada da área, e a bola passou por entre as pernas do zagueiro e rumou ao centro do gol, no contrapé de Rafael, que estava mal posicionado. Durante o restante do jogo, o River Plate, mesmo em fase ruim, mostrou porquê é um dos maiores times da América do Sul e pressionou o Galo jundiaiense, mas Rafael se manteve atento após a falha e somou seis defesas, suficientes para evitar o gol de empate adversário. A vitória por 2 a 1 sobre o time argentino foi o ponto alto da campanha na Libertadores e é, até hoje, motivo de orgulho para o clube e sua torcida. 

“Nosso título de Libertadores foi a vitória contra o River Plate”

Ivan Gottardo

A quinta rodada da fase de grupos deixou a classificação em aberto. O Paulista foi vencido pelo placar mínimo em Assunção, resultado que garantiu a liderança do grupo ao Libertad. Rumo à última rodada, os argentinos ocupavam a segunda colocação do grupo, com seis pontos, seguidos por El Nacional e Paulista, que disputariam uma possível vaga às oitavas de final na partida derradeira. 

Entretanto, a torcida que lotava as tribunas do Jayme Cintra teve o sonho de avançar ao mata-mata frustrado por mais um empate, que encerrou a participação do tricolor na Copa Libertadores. Devido aos critérios de desempate, o Galo foi o último colocado em seu grupo, com quatro gols marcados e sete sofridos. 

Os descensos consecutivos 

Após a participação histórica na Copa Libertadores, o Paulista foi de um quase acesso à Série A em 2006, quando amargou a quinta posição na tabela da segunda divisão, ao rebaixamento para a Série C em 2007. Nesse ano, o tricolor jundiaiense fechou parceria com o projeto internacional Campus Pelé, iniciativa financiada pelo Banco Fator que visava a captação e formação de jovens atletas. A gestão do programa deixou dívidas milionárias e com juros altos ao clube, que aumentaram ano a ano durante as duas últimas décadas. Também em 2007, ainda no início daquela que viria a ser a campanha do rebaixamento, Vagner Mancini se despediu do Paulista após receber proposta do Al-Nasr, dos Emirados Árabes Unidos – não confundir com o Al-Nassr, de Cristiano Ronaldo.

Em 2008, o Galo da Japi não se classificou em seu grupo da terceira divisão e teve de disputar a recém-instituída Série D do Campeonato Brasileiro no ano seguinte. Contra o Macaé, do Rio de Janeiro, o Paulista foi vencido por 3 a 1 e eliminado na primeira rodada de mata-mata da última divisão nacional. O clube jundiaiense ficou sem calendário nacional para a temporada de 2010 e, oficialmente, participou somente das competições da Federação Paulista de Futebol (FPF). 

Justamente nos torneios estaduais foi que a torcida tricolor teve lapsos de alegria, não vistos desde 2006, quando o Galo venceu dois títulos da Copa Paulista de forma consecutiva: o primeiro em 2010, sobre o Red Bull Brasil, e o segundo em 2011, sobre o Comercial de Ribeirão Preto. Entretanto, os triunfos na tradicional competição paulista mascararam o declínio da equipe, evidenciado após a queda para a Série A2 do Campeonato Paulista. “Foi legal ser campeão da Copa Paulista. Mas o clube já enfrentava dificuldades e quando caiu, em 2014, da [Série] A1 para a A2, desencadeou os rebaixamentos seguidos. Porque ali nós perdemos a maior fonte de renda”, explica Ivan.

Em 2017, o Paulista de Jundiaí chegou à quarta e última divisão do futebol estadual, hoje equivalente à Série A5 do Paulistão, de onde só foi capaz de sair dois anos depois, ao empatar com o forte MAC, de Marília, na final e conquistar a taça devido à melhor campanha.  Ivan relata que o elenco para a disputa da “Bêzinha” – como é popularmente conhecida a última divisão – foi montado dias antes do início do torneio e acredita que o título foi mais fruto da sorte, do que da competência do time. Não à toa, na temporada seguinte, o tricolor foi lanterna na Série B1, atual A3, e retornou ao fundo do poço.

“Quando você chega na ‘Bêzinha’, é difícil sair, porque tem a limitação de ser um torneio sub-23. Então não se consegue contratar um cara diferenciado, que garanta o acesso”

Ivan Gottardo

O Galo volta a cantar

Em 2022, o conselho administrativo do Galo aprovou por unanimidade o projeto de venda de 90% das ações do clube ao fundo de investimentos Exa Capital. Ao encaminhar a construção de uma SAF, a diretoria busca contar com apoio financeiro para começar do zero, dos níveis mais baixos ao topo do futebol nacional. No entanto, de acordo com Ivan, as dívidas acumuladas pelo clube embargam as negociações: “O Paulista ainda não virou SAF. Foi feita a proposta, mas o negócio ainda não foi acertado. O grande empecilho é a dívida com o Banco Fator. O clube tem um passivo muito grande, então a Exa [Capital] pretende analisar o tamanho da dívida e renegociá-la”.

Sociedade Anônima do Futebol ou não, o Galo fez ótima campanha na Segunda Divisão do Campeonato Paulista, a “Bezinha”, e escalou o primeiro degrau do futebol estadual ao golear o Colorado de Caieiras na final de 2024. Em 2025, o tricolor de Jundiaí chegou à decisão da Série A4 e foi derrotado pelo União Barbarense, mas garantiu o acesso à terceira divisão do Paulistão para a próxima temporada. 

“Até hoje, o Paulista segue com as próprias pernas, mesmo nesses dois acessos. Foi tudo graças à gestão do clube”, é assim que Ivan encara os louros que o Galo tem colhido. Segundo ele, os resultados desportivos estão diretamente relacionados ao melhor planejamento e maior sustentabilidade das últimas gestões. “Nós avançamos pelas divisões com a mentalidade de ser sustentável ao longo dos anos. Não queremos voltar para trás. Hoje, a gente prefere montar elencos com folha salarial menor, com pé no chão, do que aumentar a dívida do clube. É muito difícil, mas seguimos desse jeito, com pé no chão, passo a passo”, ele afirma. Acredita-se que a diretoria tenha feito tudo ao seu alcance para diminuir a dívida nos últimos anos, atualmente estimada em 50 milhões de reais.

Na atual temporada, o Paulista de Jundiaí ainda disputa a Copa Paulista, torneio que inaugurou com derrota para o time B do Guarani pelo placar de 2 a 1. Após três rodadas, o time acumulou três pontos e se encontra na quarta colocação do Grupo C. O torneio, reservado às equipes paulistas de menor expressão, pode ser importante ao Galo da Japi, uma vez que concede ao seu campeão uma escolha: uma vaga na Copa do Brasil ou uma participação na Série D nacional. 

Para Ivan, no entanto, as expectativas são baixas para a competição, uma vez que o time competirá com clubes de maior investimento, à exemplo do XV de Piracicaba e Primavera, ambos adversários do tricolor na primeira fase. Ele diz pensar inicialmente em passar pela fase de grupos, mas acredita na tradição do Paulista, maior campeão do torneio, com três taças, e não descarta a possibilidade de título: “Se formos campeões, vamos escolher jogar a Série D, porque queremos voltar ao cenário nacional e ter calendário para o ano todo. Para nós, é fundamental manter o estádio e a torcida vivos, com movimento”.

Foto de capa: Reprodução/Youtube: Arthur Soccer

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