Quando a primeira temporada de Love Death + Robots saiu em 2019, a série foi imediatamente comparada a Black Mirror (2011-). E não é à toa: ambas seguem o modelo de coletânea, trazendo uma narrativa nova a cada episódio, remontando a títulos como Além da Imaginação (Twilight Zone, 1959-64). Mas Love Death + Robots tem uma vantagem em relação a Black Mirror: por ser uma antologia de animações, conta com possibilidades ímpares de experimentação estética e mesmo narrativa, permitindo uma maior exploração do fantástico. E é através desses recursos de experimentação que a série constrói o que talvez seja sua proposta mais interessante: promover indagações.
O que mudou?
A nova temporada, lançada em 14 de maio de 2021, mantém a essência da primeira, mas com algumas mudanças marcantes. A mais chamativa é a redução no número de episódios: apenas oito, dez a menos que a temporada anterior. A mudança, que talvez busque um maior polimento para a série, implica numa variedade estética e narrativa menor.
Outra redução gritante na temporada é na quantidade de nudez e erotismo, que era uma característica marcante da primeira temporada e quase não aparece nessa. Essa redução no Love do título é acompanhada de uma diminuição nas mortes e, ainda que longe de desagradar a todos, decepciona quem gosta do estilo vulgar, até sujo, tão cativante na primeira temporada.
Alguns destaques
Se os episódios cômicos da temporada anterior perdiam espaço para os mais dramáticos, nessa o único episódio nesse estilo — o primeiro da temporada — é um dos mais memoráveis. Atendimento automático ao cliente nos oferece um robô doméstico de faxina repentinamente caçando sua proprietária. Tentando sobreviver, a protagonista tem que se submeter a um atendimento automático similar ao das empresas de telefonia, ao dos bancos e a diversos outros estabelecimentos conhecidos por abusar da boa vontade do consumidor.
Outro episódio memorável, O gigante afogado foge da ação comum aos outros episódios e encerra a temporada com uma pausa para a contemplação. Através da voz de um cientista, observamos como uma cidade responde ao aparecimento repentino de um gigante na praia. Belo como um herói de Homero, o ser colossal é progressivamente desumanizado pelo tratamento humano e pela decomposição natural.
Recheando esse sanduíche de episódios diferentes, temos um conjunto de episódios mais dramáticos. Gelo, o único episódio animado em 2D da temporada, faz analogias à xenofobia e ao capacitismo através de um planeta futurista distópico. Em Esquadrão de extermínio, um policial passa a questionar sua função: exterminar bebês para evitar a superpopulação em um mundo onde a imortalidade foi alcançada. Snow no deserto se passa em um ambiente que remete a nomes marcantes do sci-fi, como Duna, Mad Max e Star Wars, com direito a caçadores de recompensa e androids. A grama alta, o episódio menos interessante, mostra um passageiro que, numa parada emergencial, desce do trem em que estava e, com certeza, se arrepende. Pela casa nos mostra um Papai Noel um tanto diferente. Gaiola de sobrevivência é mais um episódio de problema com robôs, dessa vez com tons mais dramáticos do que o primeiro, com direito à atuação cativante de Michael B. Jordan.
Mas e aí, vale a pena?
Ainda que essa temporada não alcance o melhor da primeira, ela oferece episódios invariavelmente interessantes, com alguns destaques memoráveis. Se parte da beleza vulgar vista anteriormente é perdida, restam ainda alguns roteiros ótimos e artes de tirar o fôlego. Com menos que duas horas totais, vale uma maratona e — quem sabe? — retornos eventuais a episódios que deixam saudade. Podemos aguardar ansiosos a terceira temporada, que deve ser lançada em 2022.
*Imagem de capa: Reprodução/Twitter/@lovedeathrobots