Rodado em preto e branco, o longa Malcom & Marie (2021) do diretor americano Sam Levinson mostra uma briga entre o casal formado por Malcom (John David Washington) e Marie (Zendaya). Ele é um cineasta que acabou de escrever, dirigir e produzir um filme. Ela é uma ex-dependente química, que conseguiu mudar de vida com a ajuda de seu marido.
Tudo se passa em uma elegante casa isolada e os únicos personagens do filme são os dois. Isso já aponta para o fato de que não se pretende contar uma história universal sobre todos os casais. Ao contrário, o intuito aqui parece ser mergulhar na mente de cada personagem. Porém, como se verá, essa tarefa não é cumprida com qualidade.
No início de Malcom & Marie, vemos o casal voltando da festa de lançamento do novo filme de Malcom. Ele está feliz e põe uma música para comemorar a aclamação que o longa parece ter recebido. Já Marie aparenta estar incomodada, algo que passa despercebido por seu marido egoísta.
Logo em seguida, é revelado o motivo desse incômodo. No seu discurso de agradecimento, Malcom se esqueceu de agradecer Marie. A partir daí, ou seja, dos primeiros quinze minutos, acontece sempre a mesma coisa: Malcom ofende Marie. Ela dá o troco algum tempo depois. Eles se acalmam e parecem se amar. Até que a barragem se rompe, fazendo com que tudo recomece de novo.
No aspecto do conteúdo, as reflexões de Malcom até chegam a ser interessantes. Por exemplo, suas falas sobre o cinema americano. Ou então sobre o fato de a crítica considerar os seus filmes como um manifesto político apenas por ele ser um cineasta negro.
A forma como o conteúdo é exposto é que acaba sendo cansativa. Levinson quer tanto trazer dinamismo a essas cenas, através da gritaria e dos gestos extravagantes de Washington, que obtém o efeito oposto. O filme Malcom & Marie corre devagar e de maneira tediosa, até porque também não se vê nenhuma reviravolta. Em tese isso não é necessariamente ruim, mas aqui foi, visto que poderia ter dado ao enredo um pouco mais de vida.
Além disso, a sutileza, característica que vejo como essencial nas grandes obras cinematográficas, é posta de lado. É tão explícita a opinião de Malcom, que fica claro que, na realidade, ela é a de Levinson. É por isso que o filme não consegue penetrar com profundidade na mente do casal. A arrogância dessa exposição leva-nos a crer que o diretor é tão pedante quanto seu personagem. (Talvez seja essa a razão de Malcom menosprezar os críticos: Levinson já imaginava que não seria aclamado por eles e de maneira tenta desmerecê-los.)
A fotografia em preto e branco constitui um dos pontos positivos de Malcom & Marie, juntamente com a trilha sonora. Composta por músicas soul e R&B, ela é por si só envolvente. Chamo a atenção para seu uso em dois momentos, quando Malcom, e depois Marie, se valem de músicas para expressar o que sentem.
No final, podemos perceber que eles se amam, disso não há dúvida. Mas eles jamais estarão completamente juntos. Seja algo relacionado a eles próprios, seja algo do mundo externo, alguma coisa os impedirá de se fundirem um no outro.
Assim, ao fim e ao cabo, Malcom & Marie é um filme que vale a pena assistir, especialmente devido ao seu aspecto estético. Mas, a verdade é que falta uma história. Sam parece não ter visto Rain Man (1988) e Sleepers – A Vingança Adormecida (Sleepers, 1996), os principais filmes de seu pai, Barry Levinson. Pois ainda que ele não seja um gênio do cinema, ao menos sabe contar uma boa história.
Malcom & Marie está disponível aos assinantes da Netflix. Confira o trailer:
*Imagem de capa: Divulgação/IMDb