Quando crianças, muitos sonham em ser astronautas. Pouquíssimos conseguem, de fato, realizar esse sonho. Mais raro ainda é conseguir chegar à Lua. Neil Armstrong fez parte desse seleto grupo, que transformou a missão Apollo 11 em realidade palpável. Em O Primeiro Homem (First Man, 2018), Damien Chazelle é responsável por contar a história do homem que se tornou lenda.
O diretor é criativo em sua abordagem. No longa-metragem, tão denso e bem articulado, a chegada à Lua não é o momento mais marcante ‒ apesar de ser cinematograficamente esplêndido. A jornada pessoal de Neil (Ryan Gosling), seu caráter, seus traumas são os focos principais do filme, que inova ao escapar da velha história que todos já conhecemos. A narrativa inverte a icônica frase de Armstrong ao evidenciar primeiro o pequeno passo do homem, antes de chegar ao grande salto da Humanidade.
A obra começa já com o recurso que será abordado ao longo de grande parte das duas horas e meia de duração: o espectador é colocado dentro da cabine da espaçonave. O tremor da câmera, o barulho grosseiro digno de decolagens e pousos, a claustrofobia do traje do astronauta… todos esses elementos fazem com que nos sintamos como o próprio Neil. Esse recurso é muito bem explorado no longa, que o traz na medida certa para as telas.
Em seguida, somos introduzidos à vida pessoal de Armstrong, que ‒ como usualmente acontece com os grandes personagens da História ‒ não é conhecida por muitos. Um tumor é responsável por tirar a vida de sua filha, Karen. A partir de então, toda a família Armstrong sofre uma mudança, que faz com que o engenheiro aeronáutico tente o posto de astronauta na missão Gemini, prévia à Apollo.
Contrastando diretamente com a esposa Janet (Claire Foy), o astronauta é extremamente reservado. O espectador sabe que Karen está presente em sua mente a todo momento, mas esse fato quase nunca é verbalizado pelo próprio personagem. Assim, Janet é como uma âncora emocional para a trama. Embora seja coadjuvante, Foy brilha ao dar rosto e voz à esposa que apoia o marido, ao mesmo tempo que teme por seu destino.
Neil é apresentado como um homem compenetrado, acima de tudo. Sua ascensão a capitão da Apollo 11 é mostrada de forma sensível, mostrando ao espectador que a escalada ao topo é recheada de dificuldades ‒ mais do que de triunfos, na verdade. Falhas técnicas que resultam na perda de amigos próximos e a constante lembrança da filha fazem com que a tarefa de pilotar uma espaçonave até a Lua se torne ainda mais desafiadora. Em suas próprias palavras, o protagonista diz que seria ingenuidade acreditar que a morte de Karen não interferiria em suas atividades profissionais.
Essas dificuldades comprovam ainda mais a inovação dirigida por Chazelle. Apesar dos clichês ‒ a Terra vista pelo espaço sideral, a bandeira dos Estados Unidos na superfície lunar, a pegada de Armstrong ‒, vemos o lado menos glamouroso da vida de um astronauta. Como já citado, a perda de amigos próximos e a distância da família são alguns dos fatores de maior peso. Além disso, as adversidades envolvendo a ciência aeronáutica são parte do processo. Isso também serve para que a figura do protagonista como um herói seja reforçada. O espectador passa a entender mais aquele homem que teve que enfrentar o mundo para poder ir ao espaço.
A chegada à Lua, cena muito esperada em um filme com essa proposta, é marcante, apesar de apresentar cenários já conhecidos por conta de outras produções cinematográficas. Ainda assim, Chazelle oferece uma nova perspectiva ao tratar esse evento icônico. Ryan Gosling consegue resgatar com maestria o lado emocional do personagem, que não esquece da filha Karen, mesmo em seu momento de ápice profissional.
Assim, O Primeiro Homem é uma obra de destaque dentro dos longas biográficos. Ela se restringe a ser fiel, como deve ser. Não há uma desmistificação, tampouco uma supervalorização de Armstrong. Há apenas a história de um homem.
O filme estreia dia 18 de outubro nos cinemas. Confira o trailer:
por Maria Eduarda Nogueira
mariaeduardanogueira@usp.br