O peso de uma coroa. De um país constantemente instável. Da necessidade de escolher um marido para validar seu reinado. Dessa escolha ter de vir, justamente, daquilo que ela mais despreza: a Seleção. A princípio nada convenceria Eadlyn de que seria vantajoso para si colocar um bando de garotos, provenientes de seu povo, em sua casa e esperar que, dali, surgisse uma paixão. Ela o faria, como a princesa que foi criada para ser, em devoção a Illéa e em respeito ao desejo dos pais, Maxon e America, o casal inabalável que protagoniza os três primeiros livros da série A Seleção, de Kiera Cass.
America participara da seleção do, até então, princípe Maxon pelo menos 20 anos antes. Não quisera estar ali, tinha a plena certeza de que seu coração já pertencia ao rapaz que deixara em sua cidade e expusera isso no primeiro encontro com Maxon. Ela ficaria até quando pudesse no castelo, pela comida e pelo dinheiro enviado a sua família, mas não tinha o menor interesse pela coroa. O próprio rei não suportava a presença da jovem, proveniente da quinta casta e cujos comentários rebeldes eram inadequados a conduta de uma futura rainha. Somente o príncipe não conseguia deixá-la partir.
Quando os pais são mortos por rebeldes, em A Escolha, não resta a Maxon opção senão subir ao trono tomando, finalmente, a mão de America, nesse ponto, já convencida de que ele era seu amor verdadeiro. Juntos, os dois promovem o fim das castas: divididas em oito, elas eram nominadas por número e a cada uma eram atribuídos determinados trabalhos e status. Economicamente falando, quanto maior fosse o número, mais pobre era a família. Funcionava como uma herança genética que submetia as pessoas a um eterno modo de vida, a não ser para a mulher que se casasse com alguém de classe mais alta. A extinção desse sistema deveria acalmar os ânimos dos rebeldes e alcançar um período relativamente longo de paz, o que não aconteceu.
Poucos anos depois, ameaça de novas rebeliões levam o casal, com pesar, a oferecer a mão de sua filha em uma seleção. Em A Herdeira, o quarto livro da série, Eadlyn conhece os rapazes dentre os quais deve estar seu futuro noivo e acaba se surpreendendo com o quão única é essa experiência que dá nome a série e que permite a alguém criado dentro dos muros de um castelo, conhecer rostos verdadeiros do país que comandará no futuro.
A Coroa é o quinto e último livro. Traz o amadurecimento claro de Eadlyn desde o anterior. A personagem não perde de nenhuma forma sua independência e incisividade, mas começa a entender que não necessariamente uma princesa precisa ser isenta de emoção para ser respeitada. Finalmente, a assistimos destruir seus próprios muros e se permitir doar àqueles que realmente conquistaram partes inimagináveis de seu ser.
De forma alguma a obra fica atrás das demais da série, pelo contrário: ultrapassa o campo amoroso, comprometida não com o final feliz da protagonista, mas com o desfecho que merece seu povo. Acaba focando principalmente nas circunstâncias que acabarão por levar a princesa ao trono e nos desafios em fazer o melhor para seus súditos, quando eles, aparentemente, lhe odeiam. Mais do que da pose da garota, se ressentem da monarquia pela falta de iniciativa quanto ao preconceito e sofrimento remanescente após a extinção das castas. A situação só tende a se agravar pela cobertura de um dos personagens principais: a imprensa, responsável também pela cobrança constante de uma aparência do que é feito, meio em que não consegue se enxergar a óbvia solução.
Rodeada de exemplos de como o amor verdadeiro é capaz de tornar uma pessoa mais forte diante das circunstâncias, ainda que seja necessário enfrentar a maior decepção da vida ou carregar o peso de um país nas costas, a princesa passa a questionar seu medo tão grande de se apaixonar. Seu coração, então, finalmente se entrega, ainda que não a quem se espera. Se lançar assim ao futuro, sem garantias de um “felizes para sempre”, já seria um passo enorme mesmo que você não fosse desde o berço prometida ao seu país, não?
Por Aline Melo
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