Entre a imagem editorial das revistas femininas e a fotografia enquanto arte, a presença da mulher nas imagens foi o tema central do primeiro dia da VII Semana de Fotojornalismo. Mediada pelo professor Wagner Souza e Silva, fotógrafo professor da Escola de Comunicações e Artes da USP (ECA-USP)também da ECA-USP, a mesa redonda intitulada “A Mulher e o Fotojornalismo” contou com a participação de Dulcília Buitoni, professora e pesquisadora também da ECA-USP, e a fotógrafa Inaê Coutinho.
Ao trazer ao público parte de sua pesquisa sobre a representação da mulher na imprensa feminina, Dulcília tentou responder uma pergunta essencial: “Existem mulheres de verdade nas revistas?”. Para ela, “as mulheres de verdade não estão nem nos jornais nem nas revistas”, pois foram ou subrepresentadas, com pouca diversidade de papeis sociais ou superrepresentada como um espetáculo ou imagem a ser imitada, em estilo publicitário. A história deste tipo de imprensa passa por várias transformações, que vão desde a mulher dona-de-casa e mãe do começo do século XX até chegar ao final dos anos 80 e início dos 90, nos quais um emergente mercado consumidor adolescente despontou e o ideal de mulher representado era a celebridade televisiva.
Segundo Dulcília, “ao longo do século passado, houve poucos registros nas revistas femininas que fossem mais realísticos ou mais jornalísticos das mulheres”. Porém, a maioria das imagens de mulher que aparecem nas revistas femininas é de um estilo publicitário, o que reflete a falta de mulheres “reais” representadas. Além disso, o padrão de beleza ainda é a mulher branca, de classe média ou alta, menos do que uma que pessoa, a mulher é mostrada enquanto corpo, que deve ser produzido, inclusive com próteses e alterações cirúrgicas. “O ideal de beleza passou a ser concentrado menos nos traços do rosto e passou muito para a produção da forma corporal; uma produção completamente artificial, mas que as revistas e jornais se encarregaram bastante de naturalizar”, conclui.
Filha de feminista, Inaê Coutinho mostrou um pouco mais de seu trabalho que fala de um universo dito feminino, através do recorte da luz e do tempo. Em uma produção intimista, que conserva a técnica e perspicácia, a fotógrafa procurou nas casas das pessoas “recuperar alguma sensação estética de quando era menina”. Ao mostrar o interior doméstico, Inaê acredita que “a luz e o silêncio entrando nas salas fala mais alto do que um discurso antropológico e arquitetônico do que é a casa brasileira”.
Construído cultural e socialmente como feminino, o doméstico é um espaço que ganha novos nuances através do olhar da fotógrafa. “É um trabalho silencioso, mas que tem uma delicadeza cromática que busco, para ter em uma coerência com as pessoas que moram na casa”, afirma Inaê. “Embora o que vá para a parede da exposição seja a casa dela, essa mulher me marcou profundamente”, explica ao se recordar de uma fotografada em especial.
Após as palestras, os espectadores tiveram a oportunidade de fazer perguntas para as palestras. Questionada sobre a presença da mulher na imprensa, Dulcília ainda vê que de um modo geral, a maioria dos fotógrafos e fotojornalistas ainda são homens. Em sua opinião, acredita que há uma diferença na representação na representação do fotógrafo e da fotógrafa sobre a mulher. “A representação dominante da mulher é muito mais proveniente de um olhar masculino do que um olhar feminino”, afirma, pois o ícone publicitário é fruto muito mais de uma visão masculina do que feminina.
Em pergunta sobre a cobertura fotojornalística de grupos como “Mídia NINJA” nas manifestações, Inaê respondeu que acredita que não é só um fenômeno brasileiro, mas que pode ser visto como um novo modelo de cobertura audiovisual, pois “os coletivos podem mostrar versões que não as estereotipadas e controladas”. Para Dulcília, por conta das mídias sociais, tais iniciativas estão conseguindo atingir e questionar o que é mostrado pela mídia tradicional, porém, mais exemplos como este poderiam aparecer.
Por Fernando Souza