Suzana Petropouleas
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No final dos anos 90, o ilustrador americano David Horvath empenhava-se em escrever cartas para sua futura esposa, Sun Min-Kim, que deixara os EUA quando seu visto venceu. Numa dessas cartas, Horvath fez os primeiros rabiscos de Wage, uma criatura laranja e dentuça que ilustrava o cantinho da carta e garantia Min-Kim que logo o casal estaria junto novamente. A moça gostou tanto do desenho que costurou o boneco e enviou a criatura para o namorado. Nascia ali os Uglydolls, premiada linha de bonecos de pelúcia que deu origem ao filme de 2019.
Empolgado, David mostrou o bonequinho para um amigo e dono de revista e loja de brinquedos, que encomendou uma fornada de novas pelúcias como aquele. Horvath e Min-Kim começaram a desenhar novos personagens e histórias. Há mais de uma década os bonecos Uglydolls fazem sucesso entre o público americano, mas o momento para criar um longa sobre criaturas fora dos padrões que buscam aceitação num mundo fascinado pela perfeição não poderia ser mais adequado – o que também explica o elenco estrelado da produção, com nomes como Kelly Clarkson, Janelle Monae, Pitbull, Bebe Rexha e Nick Jonas.
Cada vez numa idade média menor, crianças e adolescentes munidos de seus smartphones criam seus perfis em redes sociais como o Instagram. A pressão estética e narcisista por mais likes em cada selfie nunca foi tão grande – inclusive sobre os pequenos. Na contramão – e talvez justamente por isso – nunca se falou tanto sobre auto-aceitação e a importância de abraçar as diferenças. É a mensagem principal de Uglydolls (2019) – e seu maior trunfo. Em todos os outros aspectos, no entanto, a comédia musical peca pela falta de originalidade e composições musicais pra lá de esquecíveis.
Moxy (Kelly Clarson/Aline Wirley) a protagonista de otimismo imbatível em muito lembra Poppy, a heroína de Trolls (2016). Sua trupe (em muitos aspectos também parecida com a turminha de Poppy) embarca numa aventura direto de UglyVille – onde vivem brinquedos “feios” como Moxy – para o Instituto da Perfeição, centro de treinamento dos bonecos que, se aprovados, serão encaminhados para receber o amor de uma criança. Ali, o público conhece o clichê e entediante vilão Lou (Nick Jonas) e seu trio de espiãs perfeitinhas, Tuesday (Bebe Rexha), Kitty (Charlie XCX) e Lydia (Lizzo) – talvez o núcleo mais divertido do longa, recheado de tiradas de auto-sarcasmo. A doçura fica por conta de Mandy, personagem de Janelle Monáe que se torna amiga de Moxy e embarca em sua própria jornada de auto-aceitação ao longo do enredo.
A estética cheia de cores e o enredo simples agrada e é acessível para o público até 10 anos, mas algumas das referências talvez sejam captadas apenas pela turminha mais velha – em diversos momentos, a dublagem opta por manter termos originais em inglês, caso de piadas como “você é tão hater!” e do uso extensivo da palavra “ugly” (feio, em português), mantida no original em nomes como do personagem UglyDog, da cidade UglyVille e na música The Ugly Truth, em que se canta “U-G-L-Y, você é feio!”. Ponto positivo para os pequenos expandirem o vocabulário em inglês, mas que pode deixar os menores confusos. Apesar disso, o primeiro longa de animação produzido pela STX Entertainment entrega algumas boas risadas e uma mensagem sobre auto-aceitação relevante para públicos de todas as idades.
A animação estreia em 16 de maio no Brasil. Confira o trailer: