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‘Manhãs de Setembro’: a liberdade de ser quem se é

A nova produção amplia o arco de possibilidades de representação de minorias no audiovisual

Lançada no dia 25 de junho, na plataforma Amazon Prime Video, a série Manhãs de Setembro — de Josefina Trotta, Alice Marcone, Carla Meireles e Marcelo Montenegro — é composta por cinco episódios.  O Sala 33 teve acesso ao conteúdo antecipadamente e participou da coletiva de imprensa dessa novidade do catálogo de streaming, que marca a estreia da cantora Liniker como protagonista. A artista famosa pelo hit Zero interpreta Cassandra, uma mulher trans que batalha por sua independência e por seu sonho de cantar. Quando as coisas finalmente parecem se ajeitar na vida da personagem, que passa a ter sua própria residência, uma reviravolta acontece: uma mulher aparece com um suposto filho da heroína.

A mãe da criança de dez anos é Leide (Karine Teles). Junto do pequeno Gersinho (Gustavo Coelho), ela vende produtos no sinal e dorme em seu carro, na rua. A situação de fragilidade financeira dos dois é bastante explorada no enredo e sensibiliza quem assiste. Ao atender o desejo do menor, Leide o leva para conhecer o pai. No entanto, Cassandra não reage bem ao encontro, pois o delicado impasse surge justamente quando ela poderia caminhar com as próprias pernas e progredir na vida.

Por mais que Gersinho tentasse receber carinho de quem seria seu pai, Cassandra resiste em aproximar-se sentimentalmente. Em uma das cenas mais bonitas, o menino a vê cantando e tenta imitá-la. Ao se deparar com aquela visão, ela, pela primeira vez, chama a criança pelo nome — ao invés de moleque — e quando percebe a felicidade dele com esse fato, aproveita para ensinar como é indispensável que as pessoas sejam chamadas pelo que elas são de verdade. No caso dela, uma mulher.

A forma com a qual o cruzamento dos caminhos de Cassandra, Leide e Gersinho modifica a jornada dos três é o ponto alto do enredo. Mesmo tendo dificuldade de lidar com aquela nova situação, a protagonista acaba por deixar com que os dois vão adentrando sua vida aos poucos. Os amigos dela, o casal Décio (Paulo Miklos) e Aristides (Gero Camilo), se compadecem com a vulnerabilidade econômica de mãe e filho e tentam ajudá-los.

Sobre essa situação de pobreza de sua personagem, Karine Teles acrescenta: “Minha personagem reflete a realidade de milhões de brasileiros. Infelizmente, agora a gente retrocedeu nesse sentido, a gente tem mais pessoas desempregadas, morando na rua, sem ter possibilidade de ter um emprego formal. A própria estrutura do emprego formal está sendo ameaçada, a gente está vendo um desmonte dos direitos trabalhistas acontecendo. A Leide é uma pessoa que está ali como milhões de outras brasileiras, fazendo o possível para cuidar do filho dela num país que não tem o menor cuidado com o trabalho, com a moradia e com a dignidade das pessoas”.

Karine Teles, Gustavo Coelho e Liniker caracterizados e sentados em fila em cena de "Manhãs de Setembro".
[Imagem: Divulgação/Prime Video]
A questão da liberdade da personagem principal é abordada em vários momentos — como na necessidade de Cassandra de dormir sozinha em sua kitnet —, de modo a demonstrar a notoriedade dessa conquista, dado que ela saiu de sua cidade natal para poder ser quem é e correr atrás de seu maior desejo: tornar-se uma famosa cover de Vanusa. Outro aspecto tocante da vida dela é sua relação de amizade com Roberta (Clodd Dias) e Pedrita (Linn da Quebrada) e a de romance com Ivaldo (Thomas Aquino), seu namorado.

A admiração da motogirl e cantora pela dona da canção que dá nome à série — Manhãs de Setembro —, é uma peça-chave para a história. Em determinadas situações, ela “ouve” a voz de Vanusa a aconselhando, como se a famosa fosse sua amiga e mentora. As músicas da diva dos anos 70 estão em todos os episódios da produção e conversam precisamente com os enredos desenvolvidos em cada etapa da trajetória da estrela da história. Segundo a intérprete da protagonista, “a Vanusa não é só uma cantora para a Cassandra, ela é um porto seguro, ela é uma bússola. Então, acho que, nesse sentido, a personagem cria uma relação bastante familiar com a ídola”.

Questionada sobre o que mais a atraiu no roteiro, Liniker respondeu: “Eu acho que o que mais me atraiu no roteiro foi a possibilidade de criar um imaginário real sobre uma pessoa trans, tendo em vista o país que a gente vive, a sociedade que a gente vive e todas as formas de violência que pessoas trans e pessoas pretas passam. Então, acho que construir e criar uma personagem a partir do ponto de vista do afeto e da rede de afeto que ela tem foi uma das coisas que mais me emocionou quando eu peguei o roteiro pela primeira vez”.

Liniker e Thomas Aquino sentados em banco em cena da série.
[Imagem: Divulgação/Prime Video]
Assim, cabe elogiar Liniker, que em seu primeiro papel de destaque em uma série já entregou um trabalho excelente. Brilhou ao interpretar uma mulher real, que teve a coragem de lutar contra todos os desafios para viver uma vida de verdades e sonhos realizados. Suas cenas com Gustavo Coelho são sensíveis e repletas de delicadezas. A experiente Karine Teles realizou mais um grande papel, comovendo ao apresentar com maestria o sofrimento de uma mãe que, apesar de ter defeitos, colocava seu filho em primeiro lugar e lutava por um futuro melhor para ele. Também vale destacar as atuações de Paulo Miklos, Gero Camilo, Thomas Aquino, Isabela Ordoñez, Linn da Quebrada e Clodd Dias. A direção e a fotografia são outro ganho: propõem uma relação interessante entre a hostilidade da cidade grande e as angústias daqueles indivíduos.

Liniker canta, vestindo vestido dourado e na frente de um fundo com luzes neon
[Imagem: Divulgação/Prime Video]
Em suma, Manhãs de Setembro é um acerto do Amazon Prime Video, mais uma vez mostrando a qualidade das produções nacionais. Mesmo tratando de assuntos sérios e com reveses dramáticos, a série preza pela sutileza de sentimentos, o que cria uma ligação com o espectador e cativa. O cenário musical e a poderosa história de Cassandra criam um ambiente que reflete como a arte pode ser transformadora e instrumento de identidade. 

É extremamente relevante que no país que mais mata pessoas trans no mundo — segundo dados da ONU — haja uma protagonista trans conquistando seus objetivos e trilhando seu próprio rumo com coragem e carinho. A roteirista Alice Marcone é assertiva em dizer que “a gente precisa entender  importância de ter equipe e personagens trans, LGBTQIA+ e negras dentro de todas as produções e não tentar transformar a existência dessas pessoas nos temas das séries e acho que Manhãs de Setembro faz isso muito bem, é uma série sobre família, sobre afeto”. Dessa forma, Alice ressalta a pertinência de que essas minorias não sejam retratadas apenas do ponto de vista da dor, da violência e do sofrimento, mas, também, de maneira humanizada, com relacionamentos, vontades e diversidade temática.

*Imagem de capa: Divulgação/Prime Video

1 comentário em “‘Manhãs de Setembro’: a liberdade de ser quem se é”

  1. Concordo com a história de que a vida também da muitas voltas , para que possamos aperfeiçoar as nossas decisões de livre esolha levando em consideração o que já sabemos referente a desumana maneira quanto ao racismo e preconceito do ser humano e que possamos aprender e passar bons ensinamentos acreditar sempre na evolução do saber viver..
    Solon Ferreira dos Santos Filho

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