Por Jean Silva (jeansilva@usp.br)
Publicado na Revista Latino-Americana de Enfermagem, a pesquisa desenvolvida pela Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (USP), Universidade de Rio Verde (UniRV), em Goiás, e Universidade Federal do Maranhão (UFMA) trouxe à tona a associação entre trauma na infância e depressão pós-parto. A pesquisa, conduzida por Elton Brás Camargo Júnior, analisou dados sobre a saúde mental de mulheres no período perinatal.
As mulheres participantes foram convidadas a integrar a pesquisa no momento em que receberam alta hospitalar em uma maternidade pública de referência no interior de Goiás. Os critérios de inclusão foram ser maior de 18 anos e ter um filho nascido vivo. Constatou-se que o risco de depressão aumenta em seis vezes quando identificado algum abuso emocional na infância. Foram avaliadas ocorrências de abuso emocional, físico, sexual e negligência emocional ou física nas mães.
“Todos os tipos de traumas que avaliamos mostraram-se significativos para desenvolvimento da depressão pós-parto”, afirma Camargo Júnior. “As mulheres que sofreram algum tipo de abuso emocional, físico, sexual e negligência emocional ou física tiveram maiores chances de ter depressão pós-parto. Isso mesmo controlando os fatores de confusão, como situação conjugal”.

[Imagem: Elton Brás Camargo Júnior/Acervo pessoal]
Mulheres estão sofrendo
“Infelizmente, pessoas que sofrem um tipo de abuso emocional têm maior risco de sofrer outros tipos de abuso”, detalha o profissional para explicar o porquê do abuso emocional ter aumentado tanto o risco de depressão pós-parto. “A falta de apoio para crianças e adolescentes com vivências traumáticas emocionais também pode explicar o impacto desse tipo de trauma”.
Além disso, a alta prevalência de mulheres com depressão pós-parto chamou a atenção dos pesquisadores. “Notamos uma prevalência de quase 37%. Na população geral, a prevalência de depressão costuma ser em torno de 15% a 18% da população mundial”, explica o enfermeiro.
“As mulheres estão sofrendo mentalmente” Elton Brás Camargo Júnior
“Não é só no período pós-parto. Isso influencia em tudo. Se ela [a mulher] está apresentando sintomas de depressão, como ela cuida do seu filho de forma adequada?”, questiona o pesquisador. Ele ainda lamenta que o conservadorismo muitas vezes impede a educação sexual, que poderia evitar esse tipo de sofrimento.

[Imagem: Reprodução/FreePik]
“Se falamos de educação sexual em casa, as pessoas pensam que estamos estimulando as crianças a se envolverem em atividades sexuais, o que é completamente absurdo. Na verdade, a educação sexual é uma ferramenta de prevenção, especialmente contra o abuso”, conta.
Esses resultados também ressaltam a importância da preparação adequada da equipe médica e de enfermaria para lidar com esses casos. Identificar traumas na infância pode ajudar profissionais de saúde a antecipar casos de depressão pós-parto durante o pré-natal.
Maria Neyrian Fernandes, pesquisadora da UFMA e coautora do estudo, destaca a importância dessa informação para a saúde mental materna: “O estudo sugere uma forma diferente de olhar para o atendimento pré-natal. Além da genética, deve-se considerar as experiências de vida da mulher gestante — e como essas vivências podem transformar essa mulher e, consequentemente, seus filhos.”
*Imagem de capa: KIEFER PIX/Pexels