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‘Marighella’: memória de um tempo que não se pode esquecer

O filme resgata a história do líder revolucionário e expõe a face mais encoberta da ditadura militar brasileira em uma obra de grande qualidade artística

Quem entra no cinema para assistir Marighella (2021) encontra rostos conhecidos e uma história por muitos desconhecida. Inspirado no livro biográfico Marighella: O Guerrilheiro Que Incendiou o Mundo (Companhia das Letras, 2012), de Mário Magalhães, o filme reconta a história de Carlos Marighella, deputado, escritor e ativista revolucionário, durante a Ditadura Militar (1964-1985). Na liderança de uma guerrilha urbana, Marighella (Seu Jorge) se coloca na linha de frente de combate ao regime. 

O longa se compromete a mostrar, responsável e sinceramente, a face mais violenta da teia de perseguição e opressão militar que se instalou no país sob a justificativa de “combater a subversão, a corrupção e a infiltração comunista”. Ambientado em 1968, época em que o regime ainda tinha apoio de alguns setores da população e a imprensa estava bastante limitada pelos censuradores, a principal preocupação dos militantes, tidos como inimigos da nação, era mobilizar o povo contra os ataques institucionais a liberdades individuais e a direitos humanos. 

O golpe de 1964 representava a supressão de uma intensa mobilização sindical e da possibilidade de que uma reforma agrária ocorresse, pela primeira vez, no Brasil, que é até hoje marcado pelo contraste entre latifúndios improdutivos e pequenos produtores sem-terras. A partir daí, o então presidente João Goulart foi deposto, o Poder Legislativo suspenso e o Executivo militar passou a governar por meio de Atos Institucionais, decretos com poder de Constituição que legalizavam qualquer ato do Poder Executivo. Mas, obviamente, as engrenagens centrais que mantinham a ditadura — a perseguição mortal de opositores, a tortura e a manipulação factual — eram mantidas à força em segredo. Marighella é, sobretudo, um grito póstumo dos que foram amordaçados na narrativa histórica.

Marighella é descrito como terrorista em cartazes de busca policial. [Imagem: Reprodução/Instagram/@marighella_ofilme]
Marighella é descrito como terrorista em cartazes de busca policial. [Imagem: Reprodução/Instagram/@marighella_ofilme]
A obra é a estreia de Wagner Moura como diretor e deveria ter sido lançada em 2019, mesmo ano em que o então presidente ameaçou extinguir a Agência Nacional de Cinema (Ancine) caso não pudesse filtrar as produções audiovisuais brasileiras. Após dois anos de pedidos negados, o longa foi lançado em 4 de novembro de 2021, data que marca 52 anos da morte de Marighella. O diretor comentou ao Observatório do Cinema que não tem dúvidas de que o filme foi censurado.

Encenado por Bruno Gagliasso (Lúcio), Humberto Carrão (Humberto), Maria Marighella (Elza) — que é neta do ativista — e protagonizado por Seu Jorge, o elenco não deixa a desejar em atuação. Os personagens são explorados com sensibilidade e humanização, cometendo erros e acertos com boas e más intenções que os tornam muito mais reais. Outro artifício perspicaz é a manutenção do nome de alguns atores em seus personagens, que, assim, parecem pessoas já conhecidas pelo público.

Lúcio em sua sala na polícia. [Imagem: Reprodução/Instagram/@marighella_ofilme]
Lúcio é um policial e torturador no Departamento de Ordem Pública e Social (DOPS) em São Paulo. [Imagem: Reprodução/Instagram/@marighella_ofilme]
A potência dessa obra, nos tempos atuais, diz muito sobre o presente cenário sociopolítico. Às portas de eleições executivas e legislativas, além de compreender a trajetória dolorosamente empregada no passado para que esse direito de escolha fosse possível hoje, é válido questionar se patriotismo é vestir o verde-louro em uma camisa ou defender a soberania de recursos nacionais e a garantia de subsistência para todos os brasileiros. Embora isso ainda seja questionável, não existe patriotismo sem resgate à própria história e, assim, independentemente de opiniões políticas pessoais, assistir a Marighella é imergir em um período da nossa história que ecoa até os dias atuais.

A direção de fotografia, de Adrian Teijido, tem sucesso ao transmitir, em movimentos de câmera e enquadramentos, toda a aura de tensão que envolvia o enredo. O roteiro de Felipe Braga e Wagner Moura também acerta ao tecer um fio poético que amarra o início e o fim da trama, em uma jornada cheia de significados e referências. O último presente ao espectador é o encerramento, embalado pela voz de Elza Soares e letra de Gonzaguinha, que resume a obra em sua totalidade: 

Memória de um tempo onde lutar por seu direito é um defeito que mata”.

O filme está em cartaz nos cinemas brasileiros e estará disponível na plataforma Globoplay a partir de 4 de dezembro. Confira o trailer:

2 comentários em “‘Marighella’: memória de um tempo que não se pode esquecer”

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