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O cinema é para todos?

A primeira exibição cinematográfica ocorreu no ano de 1895, organizada pelos irmãos Lumière em um café em Paris. Na época, foi possível para o público geral assistir ao espetáculo por apenas um franco, valor bem abaixo do atual. A sétima arte deveria ser acessível para todos, mas basta passar em frente a um cinema para …

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(Imagem: Mariah Lollato/Comunicação Visual – Jornalismo Júnior)

A primeira exibição cinematográfica ocorreu no ano de 1895, organizada pelos irmãos Lumière em um café em Paris. Na época, foi possível para o público geral assistir ao espetáculo por apenas um franco, valor bem abaixo do atual. A sétima arte deveria ser acessível para todos, mas basta passar em frente a um cinema para perceber que essa não é a realidade. Os altos custos – envolvendo ingressos, alimentação, transporte, entre outros – têm afastado o público geral desse entretenimento.

Suponhamos que uma família constituída por dois adultos e duas crianças decida ir ao shopping Pátio Paulista em um fim de semana de folga. Caso utilizem carro, devem pagar o estacionamento (15 reais por duas horas com acréscimo de 4 reais às demais horas). Se optarem por metrô, gastarão 32 reais de passagens. As crianças, então, pedem para assistir uma nova animação no cinema, somando assim 102 reais de ingressos (34 inteira e 17 meia entrada). Não contentes apenas com o filme, decidem comprar também um balde de pipoca com refrigerante no valor de, aproximadamente, 36 reais. Aparentemente, nota-se um passeio curto e simples, mas que no final custou de 157 a 170 reais, um valor próximo de 16% do salário mínimo (R$954).

Sala de cinema do Espaço Itaú Frei Caneca (Imagem: Divulgação)

Na conjuntura atual em que vive o cidadão brasileiro, gastar um valor tão alto nem sempre é algo viável, pois há a necessidade de pagar contas, realizar as compras no supermercado, arcar com despesas da casa, enfim, deixando o lazer sempre em última posição. Em uma pesquisa feita pelo Cinéfilos com 182 pessoas, apenas 18% dessas consideraram o cinema como um programa acessível. Quando questionadas se compravam guloseimas para acompanhar o filme, 36 participantes afirmaram que não devido aos preços exagerados. Muitos comentaram que compram apenas em algumas situações, outros preferem comer antes ou depois da sessão e alguns disseram que adquirem produtos nas lojas de conveniência próximas e levam para a sala.

Mesmo sabendo da existência de promoções nos ingressos em dias da semana, como segundas e quartas-feiras, os entrevistados têm preferência por frequentar aos fins de semana, pois são os dias em que estão livres do trabalho, escola e demais compromissos. No entanto, sábados, domingos, feriados e o período noturno possuem os passes mais caros nas maiores redes, como o Cinemark. Essa rede, mesmo possuindo um dos maiores valores no mercado, continua a ter o maior público (87,9% dos entrevistados dizem frequentá-la), seguida pelo cinépolis (26,4%) e Kinoplex (17%).

Pesquisa feita com 182 pessoas. Os entrevistados podiam escolher mais de uma opção. (Imagem: Reprodução)

Apesar dos valores mencionados acima, o cinema não perdeu sua popularidade. Ele continua a ser segundo maior ponto de encontro cultural utilizado, perdendo apenas para a igreja. Isso pode ser explicado pelo fato de ainda ser uma atividade barata quando comparado a teatros, shows e viagens, sendo assim uma alternativa. O alto custo assusta à primeira vista, mas, infelizmente, tem também sua justificativa. As salas de cinema comerciais são de iniciativa privada e não é tão simples mantê-las. Há gastos com manutenção, alguns equipamentos não são encontrados no Brasil, as peças utilizadas são caras, entre vários outros motivos.

Mas se o preço não vai cair, qual é a alternativa para quem quer acompanhar os lançamentos e não tem condições? Felizmente existe o cinema popular e diversos projetos que democratizam o acesso às obras e tornam esse meio acessível e de todos. Sesc, Cinusp, Sessão Vitrine Petrobrás e Circuito SPCine são alguns desses. Para entender mais sobre o funcionamento e a importância do cinema, conversamos com Mauri Palos, diretor da Equipe Cine, responsáveis pela gestão do Circuito SPCine.

Tal projeto foi criado em 2015 com o intuito de levar salas públicas de cinema para o município de São Paulo e assim, atender comunidades que não tinham acesso a ele. Hoje, o Circuito é mantido pela Prefeitura de São Paulo e conta com parcerias com quinze CEU’’s (Centro Educacional Unificado) e quatro Centros Culturais, ligados à Secretaria da Cultura. Além dessas, Mauri comenta que a organização tem planos de expansão. Também complementa que no Brasil, este é o único projeto do tipo que é totalmente gratuito.

Algumas pessoas devem pensar que cinema popular traz em cartaz apenas filmes cults e desconhecidos, mas isso não é totalmente verdade. O Circuito possui contrato com grandes distribuidoras – como Sony, Warner e Disney – logo, seguem as tendências do mercado, mesmo que não seja algo simultâneo com o lançamento. “Você fala que vai levar um cinema para o meio da Brasilândia, as pessoas querem ver Homem-Aranha, Batman. E elas têm todo direito”, completa Palos.

Quando questionado sobre a importância do cinema, responde que é “abrir uma janela e deixar as pessoas conhecerem mundos e situações diferentes”. Também diz que o cinema não será vencido pelo Blu-ray, serviços de streaming ou televisão por assinatura pois esses não passam a sensação de imersão. O projeto procura proporcionar toda a experiência que é estar em uma sala de cinema, desde a parte de comprar um ingresso, entrar em uma sala organizada, até o fato de ter a experiência do coletivo. “Assistir e perceber que as pessoas riem da mesma coisa que você ri, choram pela mesma coisa que você chora, se emocionam com aquilo, sonham com aquilo como você… Coletivamente é uma experiência diferente. Isso faz muita diferença na vida das pessoas, que está cada vez mais individualizada”. Por fim, Mauri completa dizendo o quanto os filmes são importantes como formadores de opinião. Muitas pessoas escolhem suas profissões com base neles e chegam a diversas conclusões oferecidas por argumentos dos longas.

O cinema vai além da arte, ele é história, política, resistência. Apenas com políticas públicas seria possível democratizar de fato o acesso ao cinema. A manutenção de leis de incentivo, como a Lei Rouanet, também se faz necessária em cenários como o atual. Assistir filmes transporta, abre caminhos e coloca o mundo em uma tela. Isso é direito de todos.

por Carolina Fioratti
carolinafioratti@usp.br

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