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“Esta Terra Selvagem”: um thriller sobre ódio

João, o protagonista do livro Esta terra selvagem, tem 32 anos, é jornalista de um grande jornal da cidade de São Paulo, já foi casado, e nasceu em Santos. Isso é tudo que nos é revelado sobre ele. No mais, aparenta ser mais um clichê do paulistano que ultrapassou os trinta anos sem muita esperança …

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João, o protagonista do livro Esta terra selvagem, tem 32 anos, é jornalista de um grande jornal da cidade de São Paulo, já foi casado, e nasceu em Santos. Isso é tudo que nos é revelado sobre ele. No mais, aparenta ser mais um clichê do paulistano que ultrapassou os trinta anos sem muita esperança ou expectativas, não alcançou muita coisa, e vive com isso.

A parte de trás da capa nos traz um trecho da história seguido pela frase: “Encenado numa São Paulo subitamente tomada pelos mais tenebrosos crimes de ódio, Esta terra selvagem é um thriller sangrento sobre um repórter no encalço de uma gangue racista e homofóbica”. Mas na metade do livro já percebemos que João, o repórter, não está muito no encalço de nada. Na verdade, o protagonista parece ter uma quantidade bem grande de azar – talvez destino? – que o atira sem perguntar diante de cenas sangrentas.

As tais cenas são estruturadas por um grupo de homens tatuados com suásticas das cores da bandeira do Brasil que assassinam negros, gays, lésbicas, imigrantes, judeus, e todos aqueles que considerarem impuros. João tem seu primeiro contato com um dos casos quando uma vítima decide lhe telefonar e pedir que ele vá conversar com ela. Ele vai e a menina conta detalhes do que aconteceu, logo antes de se matar na frente do jornalista. Depois disso, o repórter ainda testemunha outros ataques do grupo, tem acesso ao diário da menina através da avó dela e acaba envolvido no caso mesmo que parecesse não querer.

A história se passa na cidade de São Paulo, mas apesar do título, a cidade é só pano de fundo para as barbaridades do tal grupo e não faria falta caso fosse substituída por qualquer outra cidade. Existe, no entanto, a questão da identificação, não é difícil para o leitor paulistano enxergar a cena violenta que, além de descrita em detalhes, se passa em uma rua ou esquina nas quais já esteve tantas vezes. Para o leitor que se identifica com as vítimas, ainda, por ser homossexual, por exemplo, a leitura pode ser extremamente pesada e talvez não valha a pena.

Pode não ter sido intencional, mas o próprio João demonstra atitudes machistas e homofóbicas quando, por exemplo, sequer tenta entender as vítimas sobre as quais escreve. Isso fica claro em um trecho do livro em que o protagonista afirma, baseado em estereótipos, que a delegada é “gay” e, quando ela nega, ele não consegue conter o riso. A homofobia também está no não tentar desconstruir-se para entender os homossexuais. Ainda que em grau extremamente menor, esse tipo de atitude de João tem, na sociedade, a mesma raiz estrutural que os ataques do grupo neonazista.

Escrito por Isabel Moustakas, – um pseudônimo – o livro é enxuto e pode ser lido em uma única tarde. Para aqueles que se animam com um thriller policial, pode ser uma ótima forma de passar o tempo, pois ele sabe guiar o leitor em uma aventura rápida – talvez até rápida demais, que deixa escapar informações e nos deixa sem entender alguns momentos. Mas, como já dito, para aqueles que se identificam com as vítimas, a leitura, por exagerar nos detalhes violentos, pode funcionar como gatilho e, para os que militam em causas de minorias sociais, por exemplo, a única lição que podemos tirar dele deixa uma sensação de “mais do mesmo”: talvez o grupo não seja uma anormalidade, mas outra expressão da sociedade desta terra selvagem.

Por André Calderolli
andre.calderolli@gmail.com

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