Por Fábio Manzano
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Vários filmes em um. Essa é a impressão que o filme O Crítico (El Critico, 2013) de Hernán Guerschuny nos passa. É difícil enquadrar a obra em algum dos gêneros já canonizados por especialistas, é difícil, inclusive, entender porque um filme daqueles estava presente na Mostra Internacional de Cinema de São Paulo. É inesperado e destrói quase todas as expectativas de uma mostra.
O filme conta a história de um crítico de cinema, Telles (Rafael Spregelburd). Conhecido como cruel e rabugento intelectual, Telles faz sucesso destruindo a carreira de jovens cineastas e filmes de seu gênero mais odiado: a comédia romântica. O crítico é tão pedante que, em sua cabeça (e na narração em off), seus pensamentos são em francês porque “soa melhor”. É nesse ponto que se constrói uma das críticas desse temível profissional. C’est la maladie du cinéma. É a doença do cinema, ele diz, cansado de sempre ver as mesmas estórias “garoto encontra garota, garoto corre na chuva, mocinha beija no final”.
Não por acaso, o crítico começa a se ver dentro de uma comédia romântica, guilty pleasure do diretor. As cenas que antes achava irreais e estúpidas tomam seu cotidiano pós-divórcio quando ele encontra a garota. Sofia é interpretada por Dolores Fonzi e personifica a heroína de todos os filmes do gênero. Julia Roberts, Cameron Diaz e Jennifer Aniston encontram uma concorrente latina.
Os desencontros típicos de uma comédia romântica aparecem na película com um ar de paródia. Se destaca aí a atuação de Rafael, que consegue orbitar entre o papel de um crítico ferrenho e tedioso a um amante apaixonado em instantes. O roteiro de Guerschuny é divertido e prazeroso. Não é possível sair deste filme com indiferença, afinal, quem nunca se apaixonou? O filme vai tratar disso também, assim como qualquer comédia romântica – ainda que não se identifique como uma, o gênero está nele com uma função metalinguística.
Com ares alternativos em sua produção, ela é ambiciosa – e peca pela inconstância. O filme quer ser tudo em si: do indie à comédia romântica. Estreia do diretor, chega aos festivais de cinema pedindo espaço para as comédias – e quem disse que isso é errado?
O Crítico
Com o computador aberto, cumprindo a função de avaliar o filme para apresentar aos leitores do Cinéfilos argumentos recomendando ou não a película é um exercício dificílimo. Antes de começar a escrever, tive minhas dúvidas sobre como o faria. Fiquei me perguntando a todo momento em como escrever sobre um filme cujo personagem central é também um crítico.
É importante aí perceber que o universo da crítica é comum tanto ao diretor da obra, quanto ao seu produtor, Pablo Udenio. A dupla dirige há quase 19 anos a revista argentina Haciendo Cine (Fazendo Cinema), o que contribuiu para uma melhor inserção da personagem em seu ambiente – além é claro de ter havido um cuidado maior em relação à profissão, que não se apresenta de forma estereotipada.
A todo o momento o filme nos instiga a pensar que, assim como atrás de todos os críticos, há uma pessoa – movida por emoções, além da técnica -, é importante lembrar que, por trás de todo filme, há também uma equipe de pessoas. É como resumir um processo de anos dos diretores em zero ou cinco estrelas – no caso de Telles, cadeirinhas.
Não me assustarei se este filme estiver passando em breve em algum cinema perto de casa. Apesar de não se encaixar nessa atmosfera mais alternativa que se espera encontrar na Mostra, o filme com ares de blockbuster pode ser uma boa opção de lazer sem deixar de lado seu discurso crítico.