Em 1887, dois indianos da cidade de Agra são convidados a ir ao Reino Unido em nome da Rainha Vitória (Judi Dench), imperatriz da Índia. Abdul Karim (Ali Fazal) e Mohammed (Adeel Akhtar) possuem a missão de presentear a rainha com um mohur – moeda proveniente da Índia – em um jantar que conta com a presença de toda a corte britânica, no qual foram instruídos a não fazer contato visual com a rainha. Foi na quebra dessa regra que Abdul conquistou o interesse de Vitória, o que é tema do filme Victoria e Abdul – O confidente da rainha (2017).

O longa de direção de Stephen Frears é baseado em fatos reais de acordo com o que é relatado no diário da rainha e de Abdul, sendo esse último descoberto apenas em 2010. Nem todas as dramatizações, porém, estão fundamentadas na realidade, como é dito no início do filme. Por esse motivo, é difícil que o espectador tenha uma base sólida caso queira conhecer detalhes reais da relação entre ambos.

A Rainha Vitória subiu ao trono britânico em 1837, no qual governou por 64 anos até o dia de sua morte. O período de seu reinado é conhecido como Era Vitoriana, famoso por grandes acontecimentos e conquistas, como a incorporação de possessões na Índia ao Império Britânico. Já com 81 anos, a rainha é representada como excêntrica e cansada de assuntos da coroa, o que leva à sua aproximação com Abdul, o qual aos poucos vai ascendendo sua posição ao lado de Vitória.
Em diversos momentos é apresentada a divergência entre as opiniões de Abdul e Mohammed. Enquanto Abdul é devoto à rainha e vê a oportunidade de servi-la como uma grande honra, Mohammed enxerga o Império Britânico como explorador de seu país, desrespeitoso e bárbaro. Enquanto Abdul quer permanecer na Inglaterra pelo maior período de tempo possível, Mohammed anseia para voltar para seu país, mas está preso como servo devido ao afeto de Vitória por Karim, o que faz com que ela insista que ambos permaneçam lá.
Abdul e Mohammed podem ser encarados como personificações da Grã-Bretanha e da Índia, respectivamente. A ascensão do primeiro se dá às custas do outro. Mohammed não se acostuma ao clima frio do local e aos poucos fica doente e com a aparência cada vez mais abatida. Abdul, por outro lado, torna-se mais íntimo da rainha com o passar do tempo, recebendo o título de Munshi – uma espécie de educador – e passando a dar aulas particulares de urdu à Vitória, uma das mais de mil línguas faladas na Índia. Essa comparação entre os personagens e os países é interessante pois ao longo do filme Abdul revela à rainha algumas das injustiças que os soldados britânicos realizam na Índia, enquanto ele próprio se mostra injusto com o amigo.

Os personagens são construídos de forma que gostemos deles. Esse é outro impasse que nos impede de fazer julgamentos sobre o caso verídico. Sabemos que a corte fez o máximo para afastar Abdul da rainha, mas não sabemos se isso se dá apenas por racismo e preconceito – como afirma a própria Vitória – ou se há outros motivos por trás, pois há relatos que mostram que o indiano seria tão excêntrico quanto a rainha.
Victoria e Abdul é uma história que merecia ser contada. Apesar das alterações típicas de qualquer filme baseado em fatos reais, a obra se mantém fiel à essência da relação entre ambos. A amizade entre dois membros tão distintos da sociedade – ainda mais naquele tempo – é um tema que se encaixa em todas as épocas. O filme é capaz de fazer rir e também de emocionar, fazendo valer a pena conhecer o caso de aproximação entre uma das maiores monarcas da história e um jovem indiano.
Victoria e Abdul – O confidente da rainha estreia dia 16 de novembro nos cinemas. Assista ao trailer:
por Maria Clara Rossini
mariaclararossini@usp.br