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‘Frankenstein’: quando a invenção se revolta contra o inventor

Trama publicada há dois séculos retrata a solidão e a ciência de forma perturbadora
Capa, marcador de livro e brinde da edição nova de Frankenstein
Por Maria Luiza Negrão (marialuizacnegrao@usp.br)

“Como eu, uma garota jovem na ocasião, fui pensar e desenvolver uma ideia tão abominável?” Questionamentos como esse eram comuns a Mary Shelley, que, aos 18 anos de idade, escreveu Frankenstein: ou o Prometeu Moderno (Aleph, 2024). Nesta nova edição da obra de 1818, textos extras contam mais sobre o contexto em que foi criada uma história atemporal — que ainda inspira adaptações desde os quadrinhos até as telas de cinema.

Apesar da ficção científica ser atualmente um campo predominantemente masculino, histórias como Duna (Aleph, 2017) e O Guia do Mochileiro das Galáxias (Arqueiro, 2007) só puderam existir devido ao pioneirismo de Mary Shelley. Com uma narrativa fluida que interliga os aspectos emocionais dos personagens aos fatores científicos da invenção, Frankenstein é considerado o primeiro livro a abordar a ciência como parte essencial de uma obra fictícia.

Victor Frankenstein

O ano de 1816 ficou conhecido como o “ano sem verão” após a erupção de um vulcão na Indonésia lançar cinzas que bloquearam o sol por meses. Nessa situação, Mary e seu marido — Percy Shelley, também escritor — passaram uma temporada na casa do poeta Lord Byron, na Suíça. Para se entreter durante todo o tempo enclausurados, os escritores decidiram criar histórias de terror, ponto de partida para o arrebatador Frankenstein.

A obra, dividida em três partes, se inicia com cartas do marinheiro Robert Walton, que relatava  à sua irmã uma ambiciosa viagem de descoberta ao redor do mundo. A narrativa se desdobra realmente quando a tripulação do navio resgata um homem fraco e devastado de uma parte congelada do oceano. A partir daí, este desconhecido se torna o protagonista da trama, e passa a narrar os acontecimentos sob sua perspectiva.

A história acompanha o jovem Victor Frankenstein, cientista suíço que, desde criança, nutria ambições enormes. Durante sua infância abastada em Genebra, Victor descobriu obras de alquimistas, que plantaram nele o interesse pela ciência e a ideia — de jerico — de criar uma vida. Chegando à idade adulta, Victor é enviado para a faculdade na Alemanha, onde inicia seu grande projeto. 

Mas, quando o resultado de sua mania de grandeza se materializa em um monstro abominável de proporções gigantescas, o inventor foge do laboratório com medo de enfrentar as consequências dos próprios atos.

Como posso descrever minhas emoções com essa catástrofe, ou como dar contornos ao infeliz que, com sofrimento e cuidado infinitos, eu tinha me esforçado para formar?

Victor Frankenstein, p. 81

O Prometeu moderno

O subtítulo do livro faz referência ao mito de Prometeu. Na mitologia grega, Prometeu foi um titã que roubou o fogo de Zeus para dá-lo de presente à humanidade. Quando Zeus descobriu, condenou Prometeu a ser amarrado em uma montanha e ter o seu fígado bicado por uma águia durante o dia e regenerado pela noite, por toda a eternidade. 

Já em Frankenstein, Victor tentou presentear a humanidade com a capacidade de criar vida. Porém, a sequência de tragédias que castiga a ambição do personagem não chega por meio de intervenção divina, mas sim pela reação da criatura às ações egoístas de seu criador.

Eu estava sozinho. Lembrei-me das súplicas de Adão ao Criador; mas onde estava o meu?

A criatura, p. 184

Frankenstein é obsessivo com a maioria, senão todas as coisas que o circundam, da prima-irmã-pretendente Elizabeth até sua fome pelo poder da criação. Não surpreende, portanto, que seu “filho” — renegado, mas tecnicamente aparentado — tenha herdado essa característica, evidenciada quando a criatura vai em busca de vingança.

Para Victor, o monstro é abominável por sua feição repulsiva, mas se ele fosse coerente em sua crítica deveria perceber que quem criou tal feição foi ele próprio. Abominável, então, seria sua falta de destreza e toque artístico que culminou na ausência de beleza da criatura. Além disso, a feiura física do monstro é reflexo das atitudes condenáveis de seu inventor, que chegou a roubar partes de cadáveres apenas para satisfazer seu desejo de ser grande. Tudo isso para, no fim, abandonar aquilo que, de certa forma, seria seu filho recém-nascido, o que é bem mais repulsivo do que uma aparência desagradável.

Oscar Isaac em nova adaptação cinematográfica de Frankenstein

Nova adaptação cinematográfica da obra, dirigida pelo premiado Guillermo del Toro, está prevista para sair em novembro deste ano. No filme, Oscar Isaac, que participou da série ‘Cavaleiro da Lua’ e de ‘Duna’, interpretará Victor [Imagem: Reprodução/X/@netflix]

Lembre-se de que sou sua criatura: eu deveria ser seu Adão; mas sou na verdade o anjo caído, que você afasta da felicidade mesmo sem ter cometido nenhum erro.

A criatura, p. 142

Dos fãs fervorosos de ficção científica àqueles que ainda estão iniciando suas leituras nesse gênero literário, Frankenstein promete ser uma história cativante ao leitor.

*Imagem de capa: Acervo Pessoal/Maria Luiza Negrão

1 comentário em “‘Frankenstein’: quando a invenção se revolta contra o inventor”

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