O tema do último dia da VI Semana de Fotojornalismo da Jornalismo Júnior foi Sutilezas do caos. Por cerca de duas horas, os fotojornalistas Evandro Teixeira e Victor Moriyama contaram suas experiências em meio a situações de tensão e conflito, e suas percepções ao registrar imagens delicadas em momentos caóticos.
“O planeta está em caos permanente”
O primeiro palestrante a falar foi Victor Moriyama. Formado em Rádio e TV pela faculdade Cásper Líbero, hoje atua como editor de fotografia para o site O Eco, fotógrafo stringer da agência France Press (AFP) e no jornal O Vale, da cidade de São José dos Campos (SP).
Ele busca situações extremas para serem registradas. Foi o caso, por exemplo, da ocupação do Complexo do Alemão pela Polícia Carioca em 2010. Lá, ele também comprovou a subjetividade do caos. “O que me chamou a atenção é que para as pessoas que vivem esse dia-a-dia, isso é normal. A gente acaba criando um clima de caos e boa parte da população não está preocupada com isso, não se sente atingida. Pra mim pode ser caótico, mas não pra eles”.
Em meio a tanques e fuzis, viu uma cena inusitada: uma mãe carregando um grande bolo pela rua, para a festa de quinze anos de sua filha. Nem mesmo a situação conturbada a sua volta a impediu de comemorar o aniversário da garota: “Acho incrível como para essas pessoas, a vida anda”, comenta.
O fotojornalista afirma que o mundo nunca está em equilíbrio. “O caos está presente a todo instante se a gente for procurar. E o fotógrafo sempre procura uma situação que contraste com isso”. Foi o que ele fez ao registrar imagens do Haiti – pós terremoto de 2010. De lá ele trouxe fotografias que mostram a busca humana de normalidade frente a completa desestabilidade – como a de uma missa realizada fora de uma Igreja em ruínas.
Para Moriyama, há também o que ele chama de “caos existencial”. É o conceito que se tira da sua experiência na Cracolândia, em 2011: “As pessoas não tem mais referências. Elas perderam valores essenciais”.
“Senhor presidente, me desculpe, é uma questão de edição”
Após o jovem Victor Moryiama, foi a vez de uma lenda do fotojornalismo brasileiro. Evandro Teixeira se consolidou na área enquanto trabalhava no Jornal do Brasil, e presenteou a plateia com muitas histórias, sem perder o bom humor nem ao relembrar-se de momentos críticos – como quando foi preso: “Peguei uma semana de cana lá na Vila Militar. Mas era divertido”. E as duas vezes que foi repreendido pelo presidente Costa e Silva: uma por conta da legenda de uma imagem e outra pela fotografia que estava na capa do jornal – decisões de responsabilidade dos editores do jornal. “Questão de edição”, ele dizia ao general.
Teixeira registrou toda a ditadura militar brasileira. “Assim que revelávamos uma imagem, fazíamos uma duplicata dela e guardávamos”. Era a maneira de preservar os registros fotográficos da destruição da censura.
Ele sempre teve a noção da importância do que suas lentes captavam e não media esforços para proteger seu material. Em uma ocasião, seus filmes foram salvos por uma moça caridosa – que os escondeu na calcinha. As soluções para que fatos como A Passeata dos 100 mil não caíssem para sempre no esquecimento, deveriam ser criativas, já que os fotógrafos não eram tratados com nenhuma cortesia: “Você tinha que correr. Quando você não era massacrado, você tinha que ter pernas. E eu tinha pernas. Nem tudo foi salvo. Mas o que foi, está aí, contando a história pra vocês”.
A prioridade de Teixeira sempre foi fotografar. Fosse quando entrava com câmeras silenciosas em quartos de generais doentes, ou quando presenciou um momento de extrema dor: a da morte do poeta chileno Pablo Neruda. Ele foi o único fotógrafo a cobrir o fato: o Chile passava por sua própria ditadura militar e a mídia local foi impedida de acessar o enterro – o qual Teixeira não deixou de registrar, apesar de tudo: “Chorei pra burro. Mas continuei fotografando”.
Odhara Rodrigues
rodrigues.odhara@gmail.com
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