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As raízes sociais da Fênix de Camaragibe, um clube que serve a sua comunidade

Ambicioso, multimilionário e de longo prazo: conheça o projeto do Retrô Futebol Clube, o atual campeão da Série D
Por Arthur Souza (thursouzs07@usp.br)

Em 2019, Laércio Guerra, presidente de um Retrô recém profissionalizado, expressou, com muita confiança em seu projeto ainda embrionário, a pretensão de que, em cinco anos, seu clube despontasse na Série B. Naturalmente, a expectativa ambiciosa não se cumpriu. Ao cabo dos cinco anos prometidos, a equipe finalmente superou o primeiro e mais vertiginoso degrau da escada que se propôs a subir: a conquista do título da quarta divisão nacional. 

A campanha histórica do Retrô em 2024, marcada pela frustração de favoritismos, rendeu ao clube a alcunha de equipe emergente no cenário do futebol nacional. Por mais que pouco deles se fale, os anos que precederam o título inédito foram cruciais para o planejamento contínuo e de longo prazo da diretoria, que trouxe resultados. 

O nascimento e ascensão da Fênix 

O Retrô Futebol Clube do Brasil surgiu em 2016, a partir do desejo do empresário Laércio Guerra, dono da UNIBRA e ex-dirigente do Sport Club do Recife, de tornar realidade o sonho de seus filhos: jogar bola profissionalmente. Desde então, a construção do clube tomou como princípio proporcionar também essa oportunidade para outros meninos da região metropolitana de Recife, do interior de Pernambuco ou de estados vizinhos. Por ser ainda uma equipe modesta, o Retrô era então encarado pela “molecada” como uma alternativa, visto que abria suas portas para jovens atletas que não tiveram chances em avaliações de times mais tradicionais da região, como o Sport e o Náutico. 

Em pouco tempo, formaram-se dentro do clube os esboços dos times que iriam compor as categorias de base. No ano seguinte à fundação, o presidente encaminhou à instituição um total de 492 mil reais em injeções de capital. O aporte financeiro, registrado na balança patrimonial do grupo como “doação de terceiros”, foi responsável por custear a taxa de filiação à Federação Pernambucana de Futebol (FPF) e teve também uma fração investida no cumprimento das primeiras etapas do processo de profissionalização do clube. Uma vez associada à entidade estadual, a equipe passou a disputar as competições de base locais, desenvolver seus jogadores e angariar fundos mínimos para cobrir pequenas despesas. 

Uniforme azul e amarelo, cores do Retrô
Uniforme do Retrô é inspirado em modelos da década de 30, popularizados na Europa e espalhados pelo mundo [Reprodução/Instagram/@Retrofcbrasil]

O ano de 2019 foi fundamental para a construção do Retrô FC, marcado por conquistas que impulsionaram o crescimento acelerado do time. Logo no início da temporada, o clube, por intermédio da FPF, firmou o contrato de profissionalização junto à CBF, que possibilitou a primeira participação da Fênix em um torneio de futebol profissional. O regulamento da federação previa que a equipe debutante seria inscrita na Série A2 do Campeonato Pernambucano, isto é, na segunda divisão estadual. A estreia, marcada para o dia 30 de julho na Arena de Pernambuco, foi consumada em um empate sem gols contra o Vera Cruz.

Apesar de ser o caçula entre as equipes concorrentes, o Retrô demonstrou vantagem significativa em relação aos demais participantes O clube passou invicto pela primeira e segunda fase do campeonato, e chegou à etapa final, em que quatro times se enfrentam e os dois melhores classificados avançam para disputar o título. 

A soma de quatro pontos em três jogos rendeu aos estreantes o segundo lugar no quadrangular, graças aos critérios de desempate, e, consequentemente, garantiu ao clube o acesso à primeira divisão do Campeonato Pernambucano. As chances de erguer a taça do torneio, entretanto, foram frustradas após empate no tempo regulamentar e derrota nas penalidades contra o Decisão, principal algoz da Fênix durante a competição. 

Para além dos resultados desportivos e institucionais alcançados, o grupo consolidou uma estrutura superior à de outros times em contextos semelhantes ao inaugurar seu centro de treinamento. À época, o investimento em infraestrutura de elite elevou as expectativas da mídia sobre o futuro do Retrô e colocou em evidência o projeto multimilionário que estava sendo conduzido dentro do grupo.

Com qualidade técnica e integridade física, tanto no profissional quanto na base, os atletas responderam positivamente às melhores condições de treino. Assim surgiram os primeiros medalhões da equipe e os jovens jogadores foram valorizados, muitos deles já envolvidos em empréstimos acertados pelo clube.

O volante João Vittor, conhecido como “Esquerdinha”, contou ao Arquibancada sua experiência com a infraestrutura da instituição: “O CT da Fênix é coisa de outro mundo. A estrutura que eles oferecem aos atletas é um diferencial enorme para o desenvolvimento de cada um”. O jogador formou-se no sub 20 do Retrô, e hoje atua profissionalmente pelo time, emprestado ao Treze, da Paraíba.

Após sofrer ampliações ao longo dos anos, hoje o CT de 16 hectares é avaliado em 60 milhões de reais e conta com tecnologia de ponta nas principais instalações designadas. A estrutura apresenta ainda nove campos de futebol, dentre os quais cinco obedecem às dimensões oficiais estabelecidas pela FIFA. 

Também em entrevista concedida ao Arquibancada, Allan Brito, jornalista da Band e criador do perfil de futebol Última Divisão, analisou o plano da diretoria: “O projeto do Retrô é muito interessante, principalmente pela visão que o Laércio tem sobre estrutura. É uma coisa que até hoje muitos clubes não têm, porque preferem investir em jogadores, folha salarial”.

A primeira SAF do nordeste

“O projeto esportivo do Retrô tem uma complicação: a centralização no Laércio”

Allan Brito

Quem viu Laércio Guerra e seus subjugados aprovarem a implementação de uma Sociedade Anônima do Futebol poucas semanas após Cruzeiro e Botafogo adotarem o mesmo modelo, certamente pensou que a movimentação do grupo de Camaragibe havia sido inspirada pelos clubes de maior tradição. Ao contrário do imaginado, o curto intervalo entre esses eventos, que marcaram o passado recente do futebol brasileiro, leva a crer que a transformação do Retrô em clube-empresa já constava no planejamento da diretoria. 

Com o plano de atrair investidores estrangeiros, o grupo lançaria 40% de suas ações ao mercado, ao passo que o presidente permaneceria sendo o proprietário majoritário. Segundo Allan, Guerra trabalha bem à frente da instituição, mas sua predominância pode ser um tiro pela culatra: “Ele [Laércio Guerra] é um cara que tem uma boa visão, principalmente uma visão ambiciosa. Mas também é um cara que centraliza demais todas as decisões nele e isso pode gerar alguns problemas para o clube, até acredito que já gerou”. Ele acrescentou: “Seria importante que o Laércio tivesse mais dirigentes, braços direitos e dividisse mais as decisões, até para o futuro do clube”. 

 Apesar de ter sido coroada a primeira equipe nordestina a tornar-se SAF somente em janeiro de 2022, na prática, o Retrô foi administrado corporativamente desde seu surgimento. Nesse sentido, a aplicação da Lei nº14.193, de agosto de 2021, que instituiu a SAF no Brasil, somente facilitou a institucionalização da gestão empresarial do clube. 

“Aqui é futebol raíz”: o trabalho de base do Retrô

Embora as categorias de base da Fênix já viessem conquistando destaque devido aos pesados investimentos na formação de jovens jogadores, foi somente em 2022 que a equipe sub-20 do Retrô veio a participar da Copa São Paulo de Futebol Júnior, a “Copinha”, principal torneio de base do Brasil. 

Na ocasião, o time pernambucano dividiu o grupo com Cruzeiro, Itapirense e Palmas. Em sua estreia, a equipe pernambucana empatou por 1 a 1 com o Itapirense, que sediava em sua casa os jogos do grupo. Na rodada seguinte, o Retrô foi derrotado pelo Cruzeiro, líder invicto do grupo, e chegou à derradeira partida sob a urgência de uma vitória contra o Palmas, que somava somente um ponto, para conquistar a classificação.

Após vencer o time tocantinense por 3 a 0, a Fênix avançou à fase de mata-mata da competição para enfrentar a equipe sub-20 do ABC, de Natal. Contra a tradicional equipe potiguar, nem mesmo um gol adversário tardio foi capaz de frustrar o êxito dos crias de Camaragibe, que souberam administrar o resultado por diferença mínima de 2 a 1. Na terceira fase, porém, o clube reencontrou o Cruzeiro, carrasco da fase de grupos, e teve sua primeira empreitada no torneio encerrada. A campanha de estreia do Retrô na Copinha permanece sendo, até hoje, o melhor resultado do clube entre as suas quatro participações.

Na última edição, disputada em janeiro de 2025, a frustração dos atletas foi ainda maior. Apesar de não existirem grupos fáceis na Copinha, dado que partidas de categorias de base exigem mais resistência física do que refinamento técnico, a corrida por uma vaga no mata-mata contra Vitória, São José e Comercial, de Ribeirão Preto, não deveria ser desafiadora para o Retrô. Contudo, a equipe foi despachada logo na primeira fase, quando, sem nenhuma vitória e apenas um empate, amargou a quarta e última colocação do grupo. 

O destino dos jogadores revelados pelo Retrô em competições de base é, preferencialmente, o redirecionamento para outros clubes. Porém, alguns desses jovens são integrados ao time principal para compor um elenco cada vez mais sólido e profundo, que garanta consistência à equipe e possibilite a sobrevivência do clube em diversas competições. 

Camaragibe-PE, ponte para o Brasil e o mundo

As participações da Fênix na Copinha serviram de vitrine ao clube, que expandiu sua marca e estabeleceu relações com outras equipes. A crescente relevância do empreendimento de Laércio Guerra no cenário nacional possibilitou que a instituição, além de emprestar seus jogadores para times de todo o Brasil, também fosse destino de jovens atletas enviados à empréstimo por times de alto escalão. As parcerias regionais para desenvolvimento mútuo de jogadores ainda prevalecem, a exemplo da grande cumplicidade que o Retrô mantém com o Vera Cruz, porém acordos com equipes mais tradicionais revelam a ampliação do mercado a ser explorado pelo clube pernambucano. 

A percepção de Allan sobre o encaminhamento de jovens é muito positiva: “Eu acho legal esse redirecionamento que o Retrô faz com os jovens, emprestando-os para clubes maiores. Isso é interessante principalmente porque nas divisões de acesso, especialmente Série D e Série C, é difícil você aproveitar jogadores jovens. São jogos muito físicos e os clubes acabam tendo dificuldade para fazer com que esses atletas se destaquem”. Mas alerta: “O Retrô tem que tomar cuidado com isso para que, caso consiga acessos, não acabe ficando sem jovens talentosos. Na Série B, por exemplo, que é uma competição de maior visibilidade, com transmissões maiores, se o clube tiver jovens jogadores, eles podem se tornar importantes financeiramente”. 

O Palmeiras foi o primeiro grande clube a reconhecer o potencial em infraestrutura e formação de juniores do Retrô Futebol Clube. Em agosto de 2022, a Academia de Futebol alviverde firmou um acordo com a Direção de Futebol da Fênix, em busca do compartilhamento de metodologias para o trabalho de base. 

A proximidade com a equipe – então campeã da Copinha com investimentos anuais nas categorias de base estimados em 30 milhões de reais – também fomentou o intercâmbio de medalhões do juvenil entre os times. Desde então, a conexão entre os clubes se fortaleceu e, atualmente, o Palmeiras é a principal aposta do Retrô para o redirecionamento de suas jovens promessas. 

O centroavante de 17 anos Antônio Marcos realizou a ponte Camaragibe-São Paulo no início do ano passado, e hoje conta com uma multa rescisória de 100 milhões de euros para protegê-lo dos olhos de olheiros europeus. Convocado pela Seleção Brasileira Sub-17 e considerado uma das mais promissoras joias da base palmeirense, o atleta é exemplo irrefutável do proveito que ambas as instituições fazem dessa parceria.

Na visão dos jogadores, Esquerdinha encara com otimismo as oportunidades que jovens atletas recebem durante empréstimos: “É uma forma muito inteligente de lidar com o desenvolvimento dos atletas. A questão de atrapalhar a evolução depende de como cada um olha para a sua situação. Mas, em geral, é muito bom minutar bem e conquistar coisas por outros clubes”, afirma o atleta.

Após adquirir, também em 2022, o Certificado de Clube Formador da CBF, o Retrô se consolidou como pilar na revelação de jovens atletas no futebol brasileiro e atraiu atenção internacional. O clube assinou, junto ao Sporting de Lisboa, um contrato de cooperação técnica que permite o monitoramento de jogadores sub-18 da Fênix pelo staff do time português. A construção de uma rede de transferências intercontinental, apesar de caminhar lentamente, é um objetivo que a diretoria pretende cumprir a fim de proporcionar maiores oportunidades de mercado e elencar a base do clube entre as melhores do Brasil.

O êxito nacional e o título da Série D

À princípio, a fatídica derrota do Retrô para o Sport pelo placar agregado de 4 a 1 na final do Campeonato Pernambucano de 2023 aparentava ser apenas mais um episódio de má sorte da Fênix de Camaragibe: o time chegava à sua segunda decisão estadual consecutiva e, novamente, não sagrava-se campeã. Entretanto, não fosse pelo vice-campeonato, a equipe não se classificaria para a disputa da Série D no ano seguinte. 

Em março de 2024, cerca de um mês antes da rodada de abertura da quarta divisão do Campeonato Brasileiro, o Retrô anunciou a contratação do técnico Itamar Schülle, que vinha de uma boa fase no Santa Cruz. A transferência foi recebida com estranheza, pois a decisão do treinador de abdicar do projeto promissor que construía no time rival aparentava ser absurda. Para apaziguar o escândalo, Itamar alegou que aceitou o desafio de disputar a Série D pelo Retrô devido à ausência de calendário para o restante da temporada no Santa Cruz,  e prometeu que retornaria ao tricolor no fim da competição, coincidente com o término de seu contrato. 

Sob o comando do novo técnico, o Retrô realizou um razoável começo de campeonato e encerrou o primeiro turno da fase de grupos com três vitórias, dois empates e duas derrotas. A esperança de que o clube brigaria pelo acesso ao mata-mata se confirmou no ótimo segundo turno protagonizado pela equipe, com direito a goleada por cinco gols sobre o Sergipe, dos quais quatro foram marcados pelo atacante Franklin Mascote, que viria a ser o artilheiro da Fênix na competição. O time pernambucano igualou a campanha de 26 pontos do Itabaiana, o líder do grupo, mas, com um gol a menos no saldo de gols, teve de se contentar com o segundo lugar. 

Na segunda fase, a primeira das etapas eliminatórias, o Retrô foi colocado frente a frente com o tradicional América, de Natal, que no ano anterior havia sido rebaixado à quarta divisão. Com empates nos jogos de ida e volta, a decisão foi levada aos pênaltis. O América tomou a dianteira, de forma que, para que o alvirrubro potiguar avançasse, bastava converter a quinta e última cobrança regular. 

No pênalti derradeiro, o goleiro Darley, que já havia defendido uma cobrança, acertou o canto, se esticou e alcançou o chute displicente de Marcos Ytalo, lateral adversário, postergando a decisão para as penalidades alternadas. Em plena Arena de Pernambucano, o camisa 1 do Retrô consagrou-se com uma terceira defesa, responsável pela classificação dos mandantes para as oitavas-de-final. 

“O Retrô, em anos anteriores, teve desempenhos ruins nas decisões por pênaltis. Já estava até ficando famoso por isso. Mas, dessa vez, conseguiu, com o Darley pegando diversos pênaltis”.

Allan Brito

A chegada às oitavas-de-final fez ressurgir na equipe o fantasma da eliminação na edição anterior da Série D, quando, nessa mesma etapa, a Fênix de Camaragibe foi derrotada nos pênaltis pelo Maranhão. A chance de superar a campanha realizada em 2023 estava em jogo. O adversário da vez seria o Manauara, que não só era dono da melhor campanha na fase de grupos, como também estava invicto na competição e já era tido por muitos como o favorito ao título naquele ano. 

O Retrô mandou o jogo de ida em casa, onde venceu por 2 a 0, ao demonstrar solidez defensiva e contrariar as expectativas dos torcedores e da mídia especializada. Na semana seguinte, em Manaus, o Retrô esteve sob pressão durante todo o jogo de volta. Após marcar dois gols, bem anulados pela arbitragem, e outro aos 70’, para abrir o placar, o Manauara empatou o placar agregado com um gol de pênalti no apagar das luzes. Nas penalidades, Darley defendeu outra cobrança e contou com a batida para fora de um cobrador do Manauara, erros que selaram o triunfo do Retrô nos pênaltis, por 4 a 1. 

Goleiro Darley em campo pelo Retrô
O goleiro Darley, de 35 anos, foi revelado pelo Atlético-MG e teve passagem pelo Feyenoord de Ronald Koeman, na temporada 2012/13 [Reprodução/Instagram/@Retrofcbrasil]

Em seguida, o Retrô disputou as quartas-de-final contra o Brasiliense, outro grande favorito na briga pela taça e o segundo melhor pontuador durante a fase de grupos. Mais uma vez o clube pernambucano venceu em casa, dessa vez pelo placar mínimo, e teve a vantagem anulada como visitante, ao perder também por 1 a 0 em Brasília. 

Pela terceira vez em uma disputa de pênaltis no mata-mata daquela edição da Série D, o Retrô manteve o bom retrospecto e garantiu a classificação, com mais uma cobrança defendida por Darley. Uma vez classificado para as semifinais, o Retrô conquistou a promoção para a Série C de 2025, feito histórico para um time de pouca tradição e essencial para o plano de metas da diretoria. Depois de deixar tantas equipes consideradas favoritas pelo caminho, o clube e sua torcida incipiente passaram a acreditar em uma possível disputa pelo título.

Em reencontro com o Itabaiana, que venceu o time de Itamar Schülle por duas ocasiões durante a fase de grupos, o Retrô foi derrotado dentro de casa, pelo jogo de ida das semifinais. Até então, a equipe sergipana havia se mostrado imbatível diante da Fênix, o que tornou ainda mais difícil a recuperação necessária na partida de volta. 

Em Sergipe, a equipe soube explorar as vantagens do 3-5-2 armado pelo treinador para minar a exposição defensiva sem comprometer o ataque, abastecido de contra-ataques bem articulados. Sobre essa análise, Allan observa: “Com certeza, o diferencial do Retrô na Série D de 2024 foi a defesa. […] Foi uma das melhores defesas da primeira fase. No mata-mata, teve também alguns duelos em que conseguiu ficar praticamente ilesa. O trabalho do Itamar Schülle foi muito importante”. 

A tática rendeu ao time um gol do camisa 9, Giva, aos 82’, que encaminhou o Retrô para mais um duelo por penalidades. Com Alex Reinaldo e Júnior errando suas cobranças, o Retrô esteve atrás na disputa duas vezes e chegou ao pênalti derradeiro sob a urgência de um milagre para evitar a eliminação. 

Àquele ponto, Darley já tinha plenas condições de entrar para a história do clube pela campanha que fez, pegasse ou não aquela bola que partiria dos pés de Chiquinho Alagoano, limiar entre o êxtase da final e o amargo gosto do “quase”. O goleiro da Fênix pulou no canto esquerdo, alcançou a bola, e impediu o êxito adversário, mesmo que momentâneamente. O Retrô saiu na frente e converteu a primeira cobrança alternada, enquanto o Itabaiana parou mais uma vez em Darley, que, ao longo das disputas de pênalti no mata-mata do campeonato, somou oito defesas. 

A primeira perna da final contra o Anápolis foi disputada em Goiás e terminou com um resultado desanimador para a Fênix, que foi derrotada por 2 a 1. Seria então necessária uma última reviravolta no caminho do Retrô, rumo ao título do campeonato. O palco seria mais uma vez a Arena de Pernambuco, onde foi disputada a primeira partida profissional do Retrô Futebol Clube do Brasil.

Uma vez em desvantagem, Itamar Schülle optou por transformar o esquema tático usual, o 3-5-2, em um 4-4-2, prezando pela ofensividade. Os frutos vieram logo aos 13’, quando o centroavante Júnior Fialho abriu o placar para os mandantes. A faísca da remontada, reacendida pelo gol inicial, foi rapidamente apagada por um gol de jogada ensaiada do time adversário, que colocava novamente o Anápolis à frente na final. 

Ainda na volta do intervalo, Mascote cabeceia e marca o segundo gol do Retrô na partida, empatando o placar agregado em 3 a 3 e encaminhando o clube pernambucano para o que aparentava ser mais uma decisão por penalidades. O gol do título veio na metade do segundo tempo, quando João Lucas, meia aberto pela esquerda, recebeu um passe na entrada da área e, com muita força e confiança na perna canhota, bateu de chapa no ângulo esquerdo do goleiro. 

Em 29 de setembro de 2024, junto de uma torcida que só tende a crescer e com apoio de torcedores pernambucanos que enxergam simpatia no clube, a equipe do Retrô levantou a taça de campeã nacional. Ali, o grupo cumpriu o primeiro dos muitos objetivos almejados em sua fundação, ao escrever um roteiro que ficará eternizado na história do torneio. 

O que esperar do Retrô na atual temporada?

O Retrô se despediu de Itamar Schülle em outubro de 2024, mas o técnico certamente deixou seu nome assinado no projeto desportivo do clube.

Segundo Laércio Guerra, em entrevista concedida ao perfil Última Divisão, o técnico gostaria de prosseguir com seu trabalho na Fênix, mas decidiu manter a palavra acertada com a diretoria do Santa Cruz. A fim de substituí-lo, o presidente apostou em Humberto “Dico” Wooley para ocupar o cargo. 

Jovem, o novo treinador estava presente no ambiente interno da equipe desde 2020 – quando treinou a categoria sub-17 do Retrô – e já havia sido técnico do time principal em 2021. O inseguro começo de Campeonato Pernambucano do time orquestrado por Dico, marcado pela derrota na estreia diante do Maguary e por uma vitória tímida sobre o Afogados, foi suficiente para que o professor fosse demitido. 

A responsabilidade pela equipe no restante da competição recaiu sobre Evaristo Piza, que vinha de uma passagem ruim pela Portuguesa. O time desempenhou abaixo do esperado na primeira fase do campeonato estadual: despontou em sexto lugar e garantiu a última vaga ao mata-mata, com três vitórias, três empates e três derrotas. Enquanto isso, com Schülle à frente, o Santa Cruz surpreendeu e terminou a fase de liga na primeira posição. 

Após assegurar a classificação para a segunda fase da Copa do Brasil ao vencer o Jequié por 2 a 1, a diretoria assinou a demissão de Evaristo e encerrou a passagem do segundo técnico em pouco mais de um mês. O clube decidiu manter no cargo o técnico interino Wires José de Souza, para tentar reverter os resultados ruins e, consequentemente, disputar o título do Campeonato Pernambucano. No mata-mata, o Retrô eliminou o Náutico nos pênaltis pelas quartas de final, o Maguary, com vitórias por 2 a 1 na ida e na volta da semifinal, e chegou à sua terceira final estadual, para encarar o Sport. 

Na decisão de 2022, o clube foi derrotado nos pênaltis pelo Náutico e, em 2023, perdeu para o Sport por 4 a 1. Ao ser derrotada em casa por 3 a 2 no jogo de ida, parecia que a Fênix acabaria na segunda colocação mais uma vez. Na volta, entretanto, o time venceu e igualou o placar agregado, com belo gol de falta do atacante Fernandinho, ex-São Paulo e Grêmio, para levar a decisão às penalidades. 

Na disputa por pênaltis, Diego Guerra, o filho do presidente, motivo pelo qual o Retrô Futebol Clube foi fundado, desperdiçou a cobrança e sacramentou o título do Sport, momento que reforçou a fama de vice-campeão da equipe de Camaragibe. Em abril, o jovem de 18 anos foi enviado a Lisboa, para ser testado pelo Sporting. 

Antes de ser removido do cargo, Wires José de Souza foi responsável por levar o Retrô à terceira fase da Copa do Brasil, com uma vitória sobre o Atlético Goianiense. Para o início da campanha na Série C, principal competição a ser disputada pela equipe na atual temporada, o clube repatriou Milton Mendes, técnico experiente, que passou por Vasco, Sport e pelo próprio Retrô.

Apesar de conquistar um empate importante contra o Fortaleza no jogo de ida da terceira fase da Copa do Brasil, a mais recente passagem do treinador pela Fênix ficou marcada pelo péssimo desempenho na terceira divisão do Campeonato Brasileiro: com apenas uma vitória nos cinco primeiros jogos, a equipe ficou à beira da zona de rebaixamento. Após derrota de virada para o Caxias, Milton Mendes foi demitido e Wires José retornou ao cargo, ao menos temporariamente. Em seus primeiros jogos, venceu o Itabaiana e perdeu para o Botafogo da Paraíba, resultados que mantiveram o Retrô em décimo quinto lugar na Série C, com sete pontos conquistados em oito partidas.

No entanto, o trabalho do técnico interino encontrou respaldo na Copa do Brasil, quando, no dia 21 de maio, a Fênix de Camaragibe venceu o Fortaleza nos pênaltis, em plena Arena Castelão, após repetir o empate por 1 a 1 no tempo regulamentar. Com o resultado, o Retrô faz justiça à derrota que o eliminou na edição anterior da Copa do Brasil e avança para as oitavas-de-final da competição, pela primeira vez na história do clube. 

Foto oficial do elenco do Retrô para a partida
Elenco do Retrô para o confronto contra o Fortaleza, pela segunda fase da Copa do Brasil, em 2024. A Fênix foi eliminada após empate por 0 a 0 [Reprodução/X/@Retrofcbrasil]

Ainda em 2025, a diretoria pretende adquirir um terreno previamente selecionado e iniciar objetivamente a construção do estádio próprio do Retrô, com capacidade para comportar cerca de 12 mil pessoas. Segundo o presidente, as relações com a gestão municipal foram estreitadas após as eleições de 2024, fator que facilitaria o trâmite das obras. 

O projeto do estádio utiliza como referência os moldes dos stadiums de clubes tradicionais ingleses, ao mesclar a estética antiga com a tecnologia de ponta. Socialmente, Laércio Guerra pretende construir uma relação entre o estádio e a população local, semelhante ao que ocorre nos bairros argentinos, sobretudo em Buenos Aires, onde se desenvolvem conexões íntimas entre os moradores da região e o clube do coração. A estratégia busca criar, nos residentes de Camaragibe, uma identificação com o Retrô. 

Torcida chegando à Arena de Pernambuco para assistir à decisão da Série D, em 2024 [Reprodução/Instagram/@Retrofcbrasil]

Sobre as expectativas para os resultados do Retrô em 2025, Allan Brito expõe seu balanço: “Eu costumo dizer que é difícil um time subir da Série D, para a Série C, para a Série B, de maneira consecutiva. […] Os times às vezes precisam se adaptar a muitas questões de regulamento, formação de elenco, folhas salariais”. Para ele, a boa condição financeira do clube garante vantagens em relação às demais equipes da terceira divisão, sobretudo no tocante aos orçamentos salariais. 

“Na Série C não tem mata-mata. O Retrô se destacou, ano passado, no mata-mata. Então, eu não apostaria no acesso do Retrô, mas acho que é um time que tem condições para ser competitivo e passar para a segunda fase”,  completa. Na medida em que o clube avança às divisões superiores do futebol nacional, é natural que novos e mais desafiadores obstáculos surjam pelo caminho, mas se há um time preparado para superá-los, é o Retrô Futebol Clube do Brasil.

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