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A sobrevivência da cultura na pandemia

Entre uma atriz, um músico, uma produtora cultural, uma administradora do setor e o diretor regional do Sesc-SP, o denominador comum: já estava ruim, agora piorou

Essa crise é “a cereja do bolo”, “a gota d’água”. Essa pandemia “escancara a barbárie”. A “sujeira veio pra fora do tapete”. A “classe tomou uma porrada”, “foi uma avalanche”, “tá todo mundo passando necessidade”, “tá um desafio pra todo mundo”.

Essas foram algumas definições que os entrevistados deram para a crise do coronavírus. A pandemia, que levou à implantação da quarentena em São Paulo no dia 24 de março, há 98 dias, já havia atingido o setor cultural desde o começo daquele mês. O impacto do vírus no setor começou desde o aumento dos números de casos no Brasil e irá perdurar até que a população se sinta segura para se reunir em casas de show, cinemas, espaços culturais e teatros. A cultura foi a primeira infectada e será a última a receber a cura do vírus.

O tamanho da crise do coronavírus, considerada pela OMS como “a maior crise mundial da nossa época”, nós já estamos cansados de saber. No estado de São Paulo, de acordo com a Secretaria de Cultura e Economia Criativa, a perda econômica provocada pela pandemia será da ordem de R$ 34,5 bilhões, ou seja, metade da receita prevista para o setor cultural no ano inteiro. Qual é então o tamanho desse setor que encara a sua maior crise das últimas décadas?

 

O tamanho da cultura em São Paulo


A sobrevivência dos artistas

 

[na música]

Na linha de frente da cultura, os artistas viram sua fonte de rendimento desaparecer em questão de dias. Ed Woiski, músico multi-instrumentista, compositor e arranjador, tinha nos shows a sua principal fonte de sustento. Mas, com a pandemia, ele disse que “os trampos caíram como dominós”.

Ed conta que, a partir do momento que começou o isolamento, ele teve que se virar para procurar mais alunos para dar aula. Ele já dava aulas em uma escola de música, mas teve que “atirar pra todo lado” para conseguir se sustentar.  

“Eu tenho amigos que preferem dar mais aulas, são mais seletivos com relação a gig, qual trampo escolhem pra sair de casa, preferem uma estabilidade financeira dando aula, essa galera foi menos afetada. Mas foi um pouco, porque sempre tem aqueles alunos que preferem não ter aula à distância. Mas assim, a classe tomou uma porrada, tá todo mundo passando dificuldade mesmo.”

Além das aulas à distância, Ed recebe o auxílio emergencial do governo, no valor de R$ 600,00. Como maneira de expandir sua rede de alcance, Ed lançou projetos de gravação colaborativa e à distância pelo seu instagram. Ele conta que esses projetos partiram de uma vontade de unir diversos músicos que, assim como ele, estão sem poder se apresentar. Dessa forma, outros músicos podem gravar das suas casas, apenas com seus celulares, suas vozes e instrumentos, e assim realizar parcerias que são postadas pelo Ed em seu instagram. “Foi a maneira mais democrática que eu encontrei de fazer todos os músicos conseguirem tocar junto”.   

 

 

Ver essa foto no Instagram

 

Esse projeto está alcançando lugares que não poderia imaginar! . Essa é uma gravação colaborativa feita com muito carinho. Muitas pessoas já participaram e ainda cabe muito mais =) . Colaborações: Vozes – @mayananeiva e @luisacaetano_ Violão e Cavaquinho – @kikowoiski Synths e Pads – @dgrajew Guitarras – @diego.beirao e @ed_woiski Percussões – @dominiqwe_ Mixagem – @ed_woiski . Muito obrigado gente, que resultado inesperado e bem vindo! . Valeu @mayananeiva pela sugestão e voz, arrasou! . Valru @luisacaetano_ pela contribuição de tão longe 🙂 . Quem quiser participar vem falar comigo que eu mando as bases dessa e das outras músicas pra vcs gravarem. . Fiquem em casa ❤️ que tem mais música vindo!

Uma publicação compartilhada por Ed Woiski (@ed_woiski) em

Ed também é membro da banda do bloco Tarado Ni Você, que arrasta multidões todos os anos no Carnaval de São Paulo. Enquanto aglomerações como essas estão suspensas, alternativas digitais, como as gravações colaborativas, surgem como novas maneiras de se conectar em tempos de Covid, por outro lado, de acordo com o Ed, esses projetos ainda não chegam nem perto de substituir financeiramente os shows ao vivo.

 

[no teatro]

Em outra faceta da cultura, o teatro também encara um desafio enorme. Andrea Tedesco, que é atriz e arte-educadora, teve um começo de ano puxado, com três estreias e reestreias de trabalhos e dois projetos do Prêmio Zé Renato, edital municipal de fomento à produção teatral, em andamento.

Com apresentações lotadas no começo do ano, o público começou a diminuir a partir de março. Andrea recebeu os recursos de um dos projetos do edital Zé Renato na manhã do dia 13 de março, sendo que esse edital, diferente da maioria, tem seu pagamento realizado no início do projeto em uma parcela única. Esse foi o mesmo dia em que o governo decretou o adiamento dos eventos promovidos pela Secretaria Municipal de Cultura: “Foi uma avalanche”.

Palco vazio do Teatro Décio de Almeida Prado, no Centro Cultural da Diversidade, em São Paulo
Palco vazio do Teatro Décio de Almeida Prado, no Centro Cultural da Diversidade, em São Paulo [Imagem: Tomás Novaes]
Andrea recebe o pagamento dos dois projetos do edital Zé Renato, o que a coloca em uma situação mais segura, pelo menos por alguns meses. Uma crise súbita e inesperada como essa tem impactos muito diferentes em cada grupo, em cada setor. Isso se complica quando se fala de editais e chamamentos públicos, já que alguém pode ter a sorte de, assim como a Andrea, receber o valor total do seu projeto logo antes da crise, enquanto outra pessoa pode ter o azar de seu projeto ser interrompido no processo de finalização, portanto sem possibilidade de encerrá-lo no prazo e receber as últimas parcelas.

A Coordenação de Fomentos da Secretaria Municipal de Cultura (SMC), por meio de contato direto com os fomentados, esclareceu que os projetos contratados e que estão em execução possuem seus pagamentos garantidos para esse ano. Além disso, a Coordenação também orientou que seja feito um esforço para que os projetos em andamento sejam realizados “o mais próximo possível” do que foi inicialmente previsto, assim submetendo à Secretaria as alterações propostas. Para Andrea, essa orientação é difícil de ser seguida em alguns casos, mas o canal de comunicação com a SMC existe e a discussão está sendo feita.

Além disso, Andrea conta que o teatro possui uma característica “anacrônica”: a necessidade da presença física. O isolamento social provoca então uma crise sem precedentes na forma de se fazer teatro, o que o torna um dos setores mais vulneráveis da cultura neste momento. E esse fator dificulta ainda mais a garantia de renda dos trabalhadores do teatro, já que sua fonte de sustento não possui a mesma flexibilidade de outros setores das artes, como a música, que transita por diferentes plataformas sem maiores dificuldades.

Andrea também chama a atenção para outra crise, essa mais antiga, mas que foi escancarada pela pandemia em todos os seus efeitos: a falta de políticas públicas para a cultura.

“O cobertor é sempre curto, né. Na hora de destruir é rapidinho, então são 20 anos criando, tentando não perder as coisas, muda governo, você se segura ali, tenta não sucatear, tenta alguma conquista, vai aos trancos e barrancos, e aí a destruição é sempre muito rápida. Seja por vontade política estratégica de destruição, o que a gente tem visto também, seja por uma pandemia, que não era esperada por ninguém.”

Sendo assim, Andrea acredita que o mundo pós-pandemia, e especialmente o setor teatral, “vai estar pior”. Para ela, essa crise clama por um momento de reflexão por parte de todos, pois os problemas que o coronavírus ressaltou não somem sozinhos, mas sim através de ações concretas. 

A incorporação do teatro no mundo digital é um desafio que, se não houver apoio público a esses artistas neste momento, será questão de sobrevivência. Sobre isso, em uma reunião com outros trabalhadores do ramo, Andrea conta uma frase que ouviu: “Não vou virar influencer agora, eu não tinha nem Instagram até semana passada!”.

Seja pelo surgimento de “influencers teatrais” ou pelo tão necessário e urgente suporte público ao setor, que precisa ir além das cestas básicas, Andrea relembra que, apesar de tudo, o teatro atravessou milênios na história humana. Para ela, “o teatro não vai acabar, porque quem faz teatro o ama como a própria vida”.

 

A sobrevivência dos produtores e administradores

 

[as casas de show]

Dentro do setor cultural, um universo que encara um desafio enorme é o das casas de show. Sem público e sem previsão de retorno à atividade, os pequenos e médios estabelecimentos culturais vivem uma crise grave por tempo indefinido. 

Manuela Fagundes, administradora do Bona, casa de música na Zona Oeste de São Paulo, conta que a pandemia levou à redução do faturamento da casa em mais de 90%. 

Fachada do Bona, em tempos de Covid: porta fechada, cadeiras vazias
Fachada do Bona, em tempos de Covid: porta fechada, cadeiras vazias [Imagem: Tomás Novaes]
O Bona, além de ter se tornado um dos mais importantes cenários do mundo musical em São Paulo, também atua como restaurante. Com a frente dos espetáculos em suspensão, a casa hoje funciona através do delivery. Manuela conta que, com o início da quarentena, as primeiras medidas foram dar férias para a maioria dos funcionários e aportar dinheiro. “A gente tá colocando dinheiro porque o delivery realmente não dá conta.”

Apesar de ter conseguido renegociar o aluguel e de seguir com o delivery, Manuela diz que já começou a pensar em fechar o estabelecimento, pelo menos enquanto a pandemia perdurar. Essa é a realidade de grande parte dos bares e restaurantes de São Paulo, já que, de acordo com pesquisa realizada pela Abrasel (Associação Brasileira de Bares e Restaurantes), 40% desses estabelecimentos fecharão suas portas na cidade.

Sem nenhum auxílio do governo e sem previsão de retomada, a manutenção de uma casa de show como o Bona se torna inviável, dificultando ainda mais a sua sobrevivência em um mercado já normalmente desafiador. Manuela conta que, por razão dos shows, o público consome menos da cozinha e permanece nas mesas por muito mais tempo do que em um restaurante comum. Essa é uma das razões pelas quais muitas casas de show de tamanho médio e pequeno fecham, principalmente em São Paulo. Nos últimos anos, casas como o Tom Jazz, Tupi or not Tupi e Studio SP fecharam as portas após anos de atividade.

“E isso acontecia muito em alguns shows, com pessoas mais jovens, a casa lotada e um faturamento mínimo. E não dá pra você brigar tanto com isso, porque a música é em primeiro lugar. Então é um super desafio, assim, nós estamos calmos, mas considerando a possibilidade de não continuar mais.”

Além do delivery, o Bona também se mantém vivo na cena musical através do instagram. Com pelo menos quatro lives por semana, as cadeiras e o palco do Bona seguem ocupados, mantendo o espaço conquistado pela casa no mercado de shows da cidade, por onde já passaram artistas como Dani Black, Cesar Camargo Mariano e André Abujamra.

 

[a produção cultural]

Atuando nos bastidores, a produção cultural ocupa uma posição estratégica na cultura. Essa profissão, que envolve desde a gestão das carreiras de artistas até a viabilização de projetos culturais, tem a prática como instrumento essencial. O produtor cultural é aquele que materializa, que realiza, que resolve. E resolver, em tempos de Covid, ficou ainda mais difícil.

Ciça Pereira, produtora cultural e sócia-proprietária da Zeferina Produções, que trabalha com artistas periféricos, buscou realizar projetos através das redes sociais que fortalecessem empreendedores e artistas negros durante essa crise. Através da rede de empreendedores Afrotrampos, que abarca 30 mil pessoas, e em parceira com a ONG Desabafo Social, foi criado o Xepa Festival, um festival de cultura que ocorreu nas plataformas digitais em todos os domingos de maio e que arrecadou fundos para dez empreendedores periféricos selecionados.

Ciça Pereira no Festival do Clube da Criação, em 2019
Ciça Pereira no Festival do Clube da Criação, em 2019 [Imagem: Eugênio Goulart]
Ciça conta que a ideia da sua produtora é “promover impacto sociocultural através da arte, da cultura e da música”. O festival nas redes sociais foi uma das ações pensadas para, neste momento de isolamento, oferecer suporte a quem precisa e também impulsionar a rede dos artistas da produtora, que perderam sua principal fonte de remuneração: os shows.

“Neste momento, como produtores, a gente acaba se aliando como amigos também, além da relação profissional. Quando a gente lida com humano, se essa pessoa não tá bem, não tem como você fazer música, não tem como você fazer projeto, então cuidar do humano também faz parte do nosso trabalho.”

Para Ciça, com a digitalização da cultura provocada pela pandemia, a competitividade do público ficou mais acirrada. Com diversos artistas do meio mainstream se apresentando frequentemente na mesma plataforma que os demais, o mercado ficou mais disputado. Mas, para ela, a única saída desse impasse é fomentar o engajamento do público nas redes, a fim de que, quando a pandemia terminar, os artistas estejam fortalecidos.

Ciça, que é formada em Gestão de Políticas Públicas, acredita que o governo, seja estadual, municipal ou federal, “ainda não compreendeu o impacto da cultura”. Para ela, o sucateamento das políticas públicas para o setor é um processo em andamento e, neste momento de pandemia, essa negligência “veio pra fora do tapete”. Com isso, ela percebe que o setor está mais atento, mencionando como exemplo o caso recente em que a cantora Anitta movimentou um debate e provocou a retirada de uma emenda do deputado Felipe Carreras (PSB-PE) que atentava contra os direitos autorais.

No município de São Paulo, de acordo com dados do IBGE de 2018, a porcentagem da população preta ou parda ocupada no setor cultural não chega a 30%, o que demonstra o quanto o setor é desigual – desigualdade essa só intensificada pelo vírus. O trabalho de Ciça Pereira, que já geriu carreiras de artistas como Luedji Luna e As Bahias e a Cozinha Mineira, hoje está focado em artistas periféricos e independentes, que são justamente os mais afetados pela crise. 

Além do Xepa Festival, a Zeferina Produções buscou inscrever seus artistas em editais da prefeitura voltados para artistas periféricos e também continuar a divulgação de conteúdos já produzidos antes da pandemia.

 

[o Sesc]

O Sesc Pinheiros, em São Paulo, que está com as atividades suspensas durante a pandemia
O Sesc Pinheiros, em São Paulo, que está com as atividades suspensas durante a pandemia [Imagem: Tomás Novaes]
Entre os dias 21 e 22 de maio, cerca de 60 funcionários da área cultural do Sesi, Serviço Social da Indústria, no estado de São Paulo foram demitidos. Durante a mesma semana, o presidente do STF, Dias Toffoli, derrubou uma liminar que suspendia a Medida Provisória 932, que diminui as contribuições ao Sistema S em 50%. 

O Sistema S foi criado ainda no governo de Getúlio Vargas e a sua existência hoje se ampara no artigo 149 da Constituição Brasileira de 1988, que prevê a existência de uma classe de “contribuição de interesse das categorias profissionais ou econômicas”. Essas contribuições, que são impostos pagos compulsoriamente pelas empresas, são repassadas para nove entidades, entre elas o Sesc e o Sesi, que são instituições privadas mas que promovem serviços de interesse público e tem seu funcionamento regulamentado pelo Estado.

Danilo Santos de Miranda, diretor regional do Sesc-SP desde 1984, afirmou que “sem dúvida nenhuma” a crise do coronavírus é o maior desafio que ele enfrentou no cargo. “Nós enfrentamos uma situação como nunca enfrentamos antes”.

Até o dia 28 de junho, o Sesc-SP não havia tido nenhuma baixa em seu quadro de funcionários e nem fechado definitivamente nenhuma unidade. A programação cultural segue funcionando através de lives nas redes sociais, mas que também servem para impulsionar a função social da entidade, através do programa Mesa Brasil, que conecta doadores de alimentos com entidades que os distribuem para pessoas carentes.

Danilo Santos de Miranda, diretor regional do Sesc-SP
Danilo Santos de Miranda, diretor regional do Sesc-SP [Imagem: Carolina Mendonça]
Sobre as políticas públicas para a área da cultura, Danilo ressaltou a importância do setor e a necessidade de se apoiar os seus trabalhadores. Para ele, por um lado a cultura existe independentemente do governo, existe nos hábitos e na história de um país. Por outro lado, os artistas precisam de suporte através de uma política nacional de cultura, de valorização, de incentivo desse setor. O diretor também comentou a aprovação da Lei Aldir Blanc na Câmara dos Deputados, dizendo que a proposta “é um caminho”, mas que ele espera que ela “evolua” para mais ações.

“Isso é quase um atendimento a um grito de socorro, estamos morrendo, estamos afundando, estamos perdendo nossa base, estamos nos afogando, então por favor jogue uma boia. Uma boia, uma pequena boia que pode nos ajudar um pouco, mas que tem a necessidade de ser mais desenvolvida, ampliada e melhorada.”

Para Danilo, que estudou Filosofia e Ciências Sociais, além de ter recebido dezenas de prêmios por sua atuação à frente do Sesc, o mais importante nesse momento é a instituição continuar cumprindo sua missão. As palavras que ele usa para definir o momento são “imprevisibilidade total”, ou seja, não se sabe quais serão as exigências de um novo Sesc, mas ao mesmo tempo a única previsão que pode ser feita é que mudanças irão acontecer. Seja na quantidade de assentos nos teatros ou na forma de se fazer filmes, ele acredita que essa crise pode “mudar tudo”.

Danilo se considera “sempre um otimista, apesar de toda a situação”. Com os planos de expansão do Sesc-SP suspensos por tempo indeterminado, além do corte temporário da contribuição das empresas para a entidade e a deliberada vontade do ministro Paulo Guedes de “meter a faca” definitivamente no Sistema S, Danilo ainda enxerga o futuro com a esperança que lhe é cabível. 

O Brasil sempre foi um país que atraiu muito mais do que expeliu, ultimamente a gente tem expelido mais que atraído, e eu espero que o Brasil volte a atrair mais do que expelir pessoas pra outras partes do mundo.”

 

As medidas do governo

Roque de Sá/Agência Senado
Fachada do Congresso Nacional [Imagem: Roque de Sá/Agência Senado]

[Esfera Federal]

 

Legislativo

No âmbito federal, a principal medida já implementada pelo governo é o auxílio emergencial. O auxílio abarca os desempregados, os trabalhadores informais e os microempreendedores individuais, acompanhados de algumas especificidades que podem ser conferidas no site da Caixa Econômica Federal

Aprovada no Senado por unanimidade, a PL 873/2020, proposta pelo senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) tentou incluir no auxílio emergencial os trabalhadores das artes e da cultura. Porém, no dia 15 de maio, Jair Bolsonaro vetou a maioria das mudanças propostas pela PL, sob a justificativa de tais alterações ferirem o princípio da isonomia, contrariarem o interesse público e não indicarem a fonte dos novos custos propostos.

Foi sancionado ontem (29) pelo presidente Jair Bolsonaro o projeto de lei 1075/2020, conhecido como Lei Aldir Blanc. Esse PL é resultado da fusão de cinco projetos de diversos parlamentares, e a relatora é a deputada Jandira Feghali (PCdoB). Esse programa, também chamado de Lei de Emergência Cultural, propõe um plano de fomento direto e indireto para o setor cultural atingido pela pandemia. 

O fomento direto envolve o repasse de R$ 3.6 bilhões para estados e municípios implementarem três ações: 1) uma renda básica emergencial aos trabalhadores da cultura; 2) um subsídio mensal para manutenção de espaços, instituições e organizações culturais; 3) a realização de chamadas públicas e editais voltados à manutenção de espaços, iniciativas, cursos, produções e atividades que possam ser disponibilizadas nas plataformas digitais.

Já o fomento indireto envolve diversas medidas, como a abertura de linhas de crédito, a prorrogação dos prazos de aplicação e de prestação de contas para projetos culturais já aprovados em programas federais de cultura, a proibição do corte de serviços essenciais, incluindo internet, e a suspensão da cobrança de certos impostos federais para os trabalhadores da cultura, até o término do estado de calamidade pública.

O projeto ainda busca priorizar projetos culturais que possam ser realizados por vias digitais, além de definir uma contrapartida aos espaços que receberem o subsídio do governo. Por fim, a lei define que as fontes dos recursos do repasse seriam valores do Fundo Nacional da Cultura, recursos do Tesouro Nacional e também da arrecadação das loterias federais.

 

Executivo

Em relação à Secretaria Especial da Cultura, a postura foi tímida. As primeiras medidas foram divulgadas através das Instruções Normativas No 5 e No 6, divulgadas nos dias 22 e 30 de abril, respectivamente, quando Regina Duarte ainda ocupava o cargo de secretária. As instruções normativas estabelecem novos procedimentos para a captação, execução e prestação de contas e para a avaliação de projetos culturais abarcados no Pronac (Programa Nacional de Apoio à Cultura), facilitando a liberação dos recursos e a modificação dos projetos, aumentando os prazos e também possibilitando a suspensão do pagamento das parcelas.

No dia 19 de junho foi nomeado o novo secretário, o ator Mário Frias. A última medida foi tomada no último dia 24 pelo Comitê Gestor do Fundo Setorial do Audiovisual (FSA), e consiste na abertura de linhas de crédito no valor total de R$ 400 milhões para o setor audiovisual, um socorro imediato de R$ 8,5 milhões aos pequenos exibidores e a suspensão de prazos e pagamentos relacionados a programas da Ancine e ao próprio FSA.

 

[Esfera Estadual]

 

Legislativo

No âmbito estadual, o principal projeto é o PL 253/2020, de autoria de sete parlamentares, entre eles a deputada Isa Penna (PSOL). Esse projeto muito se assemelha ao PL 1075, criando assim um “Programa de Auxílio Emergencial para trabalhadores do setor cultural e para Espaços Culturais”. Esse programa propõe um auxílio emergencial aos trabalhadores do setor cultural de R$ 1.163,55 (um salário mínimo estadual) e um subsídio mensal aos espaços culturais no valor de R$ 3.500,00. Além disso, o projeto também veda o corte dos serviços essenciais e de telecomunicações para os trabalhadores culturais que estiverem em dívida com as concessionárias de tais serviços.

Por fim, o projeto, assim como o PL 1075, define uma contrapartida para os espaços culturais beneficiados com o subsídio e especifica as fontes dos recursos como sendo principalmente o Fundo Estadual da Cultura e o orçamento da Secretaria do Estado de Cultura.

 

Executivo

Também existem as ações relacionadas ao executivo estadual. Através do banco DesenvolveSP e do Banco do Povo, em parceria com o Sebrae, foram disponibilizados R$ 650 milhões em oferta de crédito, sendo que, desse montante, R$ 150 milhões são voltados especificamente para microempreendedores e R$ 275 milhões exclusivamente para o setor cultural e para a economia criativa. A Secretaria de Cultura e Economia Criativa de SP também flexibilizou algumas condições e prazos para projetos abarcados pelo ProAC Editais, além de lançar o festival #CulturaEmCasa, com 60 apresentações gratuitas e disponibilizadas em uma plataforma de streaming da Secretaria. O festival tem orçamento de 1 milhão de reais, recursos esses remanejados de “projetos de difusão que foram suspensos devido à pandemia do coronavírus e que visavam os mesmos objetivos”, de acordo com nota do governo.


[Esfera Municipal]

 

Legislativo

Na esfera municipal, a situação é mais complexa. Na Câmara Municipal de São Paulo existe o PL 227, de autoria do vereador Toninho Vespoli (PSOL), que cria um benefício mensal de valor de um salário mínimo para os trabalhadores autônomos do setor cultural que perderam sua fonte de renda com a pandemia. Esse PL também propõe a suspensão da cobrança dos tributos municipais sobre espaços culturais e empresas do setor, desde que mantenham seu quadro de funcionários. 

Também existe o PL 343, de autoria dos vereadores Alfredinho (PT), Antonio Donato (PT) e Juliana Cardoso (PT). Esse projeto prevê o apoio emergencial para três frentes do setor da cultura: aos trabalhadores, às organizações e aos equipamentos comunitários. O auxílio aos trabalhadores seria de R$ 600,00, enquanto para as organizações e equipamentos culturais seriam R$ 3.000,00 e R$ 1.500,00, respectivamente. Os três auxílios seriam mensais e se estenderiam por 3 meses, atendendo cerca de 50.000 trabalhadores, 7.000 organizações e 2.000 espaços.


Executivo

Em relação ao poder executivo, a Secretaria vem agindo por meio de chamamentos e editais, seja pela criação de novos ou pela prorrogação dos prazos de editais já existentes. 

No dia 19 de maio, o edital Teatros e Centros Culturais na Rede, que definia a contratação de artistas, no valor de R$ 700,00 cada um, a fim de realizarem eventos culturais nas redes sociais da Secretaria Municipal de Cultura, foi suspenso pela Justiça. A suspensão foi motivada por uma ação popular de um produtor cultural, que, no documento, questiona o caráter emergencial da proposta e afirma que “as apresentações deveriam se dar de forma voluntária, sem qualquer custo ao contribuinte”. A Secretaria, em nota à imprensa, afirmou que a suspensão “impactou a contratação de 51 artistas, previstas até 26 de maio, com o custo total de R$ 35.700,00” e que “os recursos destinados ao Chamado são provenientes de dotação orçamentária própria, aprovada na LOA (Lei Orçamentária Anual) para atividades fim, e já seriam destinados para contratações artísticas.” A SMC também esclareceu que já teve recursos realocados para a área da Saúde.

Além disso, a Secretaria também lançou o programa Cidade Solidária, que transforma os espaços culturais da cidade em pontos de coleta de doações de cestas básicas. 

 

5 comentários em “A sobrevivência da cultura na pandemia”

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