Com Lua Azul (Crai Nou, 2021), Alina Grigore é a segunda mulher, pelo segundo ano consecutivo, a receber o Concha de Ouro, prêmio máximo do Festival Internacional de Cinema de San Sebastián. Em 2020, foi a vez da georgiana Dea Kulumbegashvili, com Beggining (2020). Ambas as diretoras, além de serem novas expoentes do Leste Europeu, escolheram para seus longas estreantes histórias em comum: a jornada de mulheres reprimidas pelas comunidades religiosa-familiares em que vivem. Em Lua Azul, Irina (Ioana Chitu) é uma jovem de 22 anos que anseia sair do interior e estudar na capital, Bucareste, para fugir de sua família problemática. Após conhecer Tudor (Emil Mandanac), um ator mais velho, já casado e com filhos, ela vê em seu breve romance uma possibilidade de concretizar a fuga e deixar os parentes para trás.
Os primeiros instantes do filme antecedem qual será o ritmo da trama: frenético e inconstante. Irina acorda com Viki (Ioana Ilinca Neacsu), sua irmã, pulando em cima dela na cama. A agitação de Viki — personagem que, ao longo do filme, é mostrada como uma menina rebelde e malcriada — deve-se à chegada do pai para o almoço em família. Ela havia feito algo de errado e não queria que Irina contasse a ele. Com os pais separados, Irina e Viki ficaram sob os cuidados de tios, tias e primos, com quem também dividem as atividades do negócio da família, um hotel nas montanhas na zona rural da Romênia.
Seguindo o que Grigore chama de uma “jornada psicológica”, com um encadeamento muito mais emocional do que lógico, mesmo nas cenas das refeições em família — em que todos se unem em mesas postas, com toalhas brancas e guarda-sóis — a tensão é evidente, quase palpável no ar. Irina não é só a personagem central do longa, mas também a mediadora de todos os conflitos da família. Obrigada a acompanhar Liviu (Mircea Postelnicu), seu primo violento e descontrolado, nas negociações da empresa, ela sofre abusos recorrentes. Aqui, as atuações de Ioana Chitu e Mircea Postelnicu ganham intensidade com os movimentos de câmera que percorrem o ambiente e pelos close ups que evidenciam uma Irina ansiosa e em pânico.

Diante dos acontecimentos que movimentam essa “jornada psicológica”, o relacionamento de Irina e Tudor é apenas um acessório. Não fica claro se Tudor de fato teria condições de levá-la a Bucareste como ela queria e as próprias circunstâncias do primeiro contato do casal são incertas. As vontades de Irina, como a escolha do curso que faria na capital, também não são ditas, o que torna-a uma personagem rasa, que somente reage aos abusos da família.

Esse filme faz parte da 45ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo. Para mais resenhas do festival, clique na tag no final do texto. Confira o trailer:
*Imagem da capa: Divulgação/Patra Spanou Film