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Em 2005, o ‘Hala Madrid’ se tornou ‘Vamos Madrid’ com comando verde e amarelo

Há 20 anos, Vanderlei Luxemburgo se tornava, em uma curta passagem, o primeiro e único brasileiro a assumir o comando do Real Madrid
Arte de fotos e jornais do Vanderlei Luxemburgo no Real Madrid
Por Aline Noronha (alinenoronha@usp.br) e Luiz Dias (lhp.dias11973@usp.br)

Há duas décadas, Vanderlei Luxemburgo alcançava um marco inédito para o futebol brasileiro: o primeiro técnico do país a comandar o Real Madrid. Sob comando do elenco estrelado, os famosos Galácticos, o técnico enfrentou grandes desafios no ano de 2005 — durante as temporadas de 2004/05 e 2005/06 —, que marcaram sua breve, porém significativa, passagem pela Europa.

Primeiros momentos no clube

Luxemburgo teve sua contratação anunciada pelo Real Madrid em janeiro de 2005, em que assumiu o comando do clube até o primeiro semestre da próxima temporada. Em entrevista ao Arquibancada, Paulo Campos, assistente técnico da equipe de Luxemburgo no Real Madrid, afirmou as impressões iniciais da equipe brasileira, pela primeira vez no comando de um clube europeu: “Foi uma experiência maravilhosa. Imagina que estreia! Trabalhar com os Galácticos no Real Madrid”.

“É essencial para todo profissional (técnico) trabalhar na Europa. Há muita organização e estrutura profissional. Isso, aliado à qualidade técnica, engrandece nossa carreira”

Paulo Campos

De acordo com Campos, a experiência em um time europeu trazia uma dinâmica completamente diferente daquela presente nos campeonatos brasileiros. “O choque entre a forma de trabalho brasileira e a estrutura organizacional europeia foi um aprendizado.” 

Zidane e Roberto Carlos se abraçando

O elenco do clube, conhecido como Galácticos, incluía craques como Ronaldo Fenômeno, David Beckham, Zinédine Zidane, Roberto Carlos e Sérgio Ramos. [Reprodução/Instagram: @oficialrc3]

A filosofia de Luxemburgo no Real Madrid girava em torno de equilibrar o talento individual com o trabalho coletivo. Em um ambiente recheado de estrelas, ele foi responsável por algumas decisões marcantes, como a adaptação de Sérgio Ramos, contratado como lateral-direito, à posição de zagueiro central — uma mudança que ajudou a moldar um dos maiores defensores da história do futebol europeu.

A tarefa de manutenção desse grande elenco acabou por se mostrar desafiadora, como afirmado pelo ex-jogador Roberto Carlos, membro dos Galácticos, em entrevista ao Jornal O Dia. Havia um costume diferente de relação entre técnico e equipe, com muito mais liberdade para os jogadores, o que acabou entrando em choque com a filosofia de Luxa. Um dos exemplos levantados pelo ex-Galáctico foi a presença de bebidas alcoólicas antes dos jantares pré-jogo, um costume que tentou ser barganhado com o técnico, mas que foi cortado pouco tempo depois, levando a atritos entre Luxemburgo e a equipe.

Embora a passagem de Luxemburgo pelo Real Madrid não tenha resultado em títulos, ela foi marcada por momentos memoráveis que demonstraram o impacto de seu trabalho. Um dos destaques foi a vitória por 4×2 sobre o Barcelona no El Clásico. Sob o comando de Luxemburgo, o Real Madrid apresentou um futebol ofensivo e dominou um dos maiores rivais do clube, mostrando a força do elenco e a capacidade de seu treinador.

El Clásico entre Real Madrid e Barcelona

Rivalidade entre Real Madrid e Barcelona se estende para muito além do campo de futebol, sendo conhecida mundialmente como ‘El Clásico’ [Reprodução/Wikimedia Commons]

Rivalidade e desafios internos

Apesar dos esforços, Luxemburgo enfrentou dificuldades em traduzir sua visão em títulos. O ano de 2005 foi marcado pelo domínio do Barcelona — mesmo com a vitória de 4×2 —, liderado por Ronaldinho Gaúcho, que protagonizou atuações históricas contra o Real Madrid. Ainda assim, a passagem de Luxemburgo pelo clube trouxe importantes lições sobre a gestão em um dos maiores clubes do mundo.

Campos relembra outro enfrentamento do El Clásico, próximo à saída do Vanderlei, quando o  Barcelona venceu o Real Madrid em novembro de 2005 na luta pela liderança do campeonato espanhol. “A torcida do Real Madrid aplaudiu o Ronaldinho Gaúcho após aquela vitória do Barcelona. Não xingou a comissão técnica ou os atletas do Real, simplesmente valorizou ele de uma maneira sarcástica e o Barcelona, que é o principal adversário.”

Para ele, isso pode ter sido um dos principais pontos de pressão na estadia do brasileiro no clube, “não foi por falta de capacidade ou aceitação, mas aquela era uma rivalidade intensa”. Essa derrota, somada às rixas com o time e, em especial, às discussões com o presidente do clube, Florentino Pérez, acabaram se tornando pesos que levaram à demissão de Luxa.

Apesar desses fatores, Paulo Campos afirmou que não havia um sentimento de demissão iminente. “De repente, recebemos o comunicado de que ele estaria saindo do clube, foi uma surpresa para nós. Na minha opinião, talvez tenha sido porque não fomos campeões. Isso pode ter mexido com a cabeça deles, tentaram trazer outro treinador, talvez europeu.”

No entanto, mesmo com a notícia inesperada, o assistente técnico se mostrou contente com os resultados. “No futebol, não existe receita de bolo. Você pode ter os melhores jogadores do mundo, mas o adversário também tem qualidade e pode superar sua equipe.”

O diferencial para chegar no gigante europeu

A experiência na área técnica de Vanderlei Luxemburgo começou em 1981, mas seu contato com os gramados data de 1968, quando jogava na categoria de base do Botafogo como lateral esquerdo. Depois, foi para o Flamengo, onde estreou profissionalmente — também teve passagens pelo Internacional e retornou ao Botafogo. Após pouco tempo, com apenas 28 anos de idade, se aposentou devido a uma lesão no joelho. 

Vanderlei Luxemburgo na época de jogador, no Flamengo

Luxemburgo conquistou, como jogador, um campeonato gaúcho e três cariocas [Reprodução/Instagram: @luxaoficial]

Antes de se graduar em educação física, em 1983, pela Universidade Castelo Branco, foi auxiliar técnico do América-RJ e do Vasco da Gama; ao se formar, foi treinador do Campo Grande-RJ. Até chegar ao Real Madrid, além do futebol carioca, também teve passagens em times paulistas, como Bragantino, Ponte Preta, Palmeiras, Corinthians e Santos. 

Também treinou times do Sul, como o Paraná, e teve passagem pela seleção brasileira, onde conquistou a Copa América de 1999, mas após a eliminação brasileira nos Jogos Olímpicos de Sidney, na Austrália, e com uma forte pressão fora dos gramados, saiu do cargo. Antes do convite europeu, Luxemburgo já havia atuado no exterior, como técnico do Al-Shabab.

Comandar o Real Madrid, foi a primeira experiência na Europa tanto para o Luxemburgo quanto para Paulo Campos, que referencia a qualidade técnica individual e coletiva como marcante no futebol brasileiro e europeu. Apesar disso, destacou uma forte diferença: “A gente sempre viveu muito pela qualidade dos jogadores e pela técnica monstruosa, mas era importante também aprender como administrar, tanto no aspecto financeiro como de organização. Isso, na Europa, ajuda demais e traz uma experiência maravilhosa”.

Frente do Estádio Santiago Bernabéu

No fim de 2024, o Real Madrid trocou o nome de seu estádio, Santiago Bernabéu, para apenas Bernabéu,  por questões comerciais relacionadas ao marketing — apesar de não ter acontecido um anúncio oficial [Reprodução/Wikimedia Commons]

Após uma temporada pelo gigante europeu, o técnico brasileiro retornou ao Santos e, posteriormente, ao Palmeiras, clube em que foi mais vitorioso — conquistou dois campeonatos brasileiros, cinco paulistas e um torneio Rio-São Paulo. Desde então, somou passagens por times mineiros, como Cruzeiro e Atlético Mineiro, juntamente com outros do Sul, Rio de Janeiro e Pernambuco.

O último time que assumiu foi o Corinthians, por quatro meses, em 2023. Após uma passagem considerada reprovada, está livre no mercado da bola. No mês passado, em entrevista ao podcast Charla, o técnico fez um forte desabafo sobre os desrespeitos e críticas que ouviu após décadas dedicando sua vida no futebol, e concluiu dizendo que não gostaria que seu nome ficasse sendo repetido por pessoas que não conhecem o esporte e só querem o julgar.

“Eu poderia pensar, mas na realidade eu não quero voltar (a ser treinador). Não quero ser alvo, depois de tudo que fiz no futebol, para denegrir a minha imagem”

Vanderlei Luxemburgo

Vanderlei Luxemburgo com o elenco do Palmeiras (da época da Parmalat)

O último título que conquistou foi o Campeonato Paulista de 2020, com o Palmeiras, após vencer o Corinthians nos pênaltis, em sua quarta passagem pelo time alvi-verde [Reprodução/Instagram: @luxaoficial]

“Querer é poder, sonhar não é proibido”

Após vinte anos, Vanderlei Luxemburgo foi o único técnico brasileiro a assumir o Real Madrid e um dos poucos a conseguir um espaço na Europa, ao lado de nomes como Felipão, técnico da seleção portuguesa por pouco mais de cinco anos e do Chelsea, e Carlos Alberto Parreira, no Valencia. Para Paulo Campos, há uma facilidade e organização no continente para que os treinadores europeus trabalhem em países vizinhos por causa da proximidade cultural e linguística.

“Por muitos anos, os clubes buscavam treinadores do próprio continente, o que limitava as oportunidades para técnicos de outros lugares, como os brasileiros”

              Paulo Campos

Conforme o ex-auxiliar técnico, a ida do Luxemburgo para o Real Madrid foi um prêmio pelo seu trabalho no Brasil e uma grande conquista. “É muito importante para qualquer treinador, especialmente para quem não é europeu, trabalhar na Europa”, pontua o treinador, que também destaca o quão emocionante foi receber o convite para ser o auxiliar técnico do Luxemburgo no Real Madrid. Após passar pelo clube espanhol, Paulo Campos se destacou na Grécia na equipe Asteras Tripolis, onde ganhou o Campeonato Grego da Segunda Divisão em 2007.

Camisa do Real Madrid do ano de 2005

Após a saída do Luxemburgo, Paulo Campos afirma ter recebido uma proposta para treinar o time B do Real Madrid, mas recusou por não considerar certo permanecer depois que quem o levou até lá saiu [Reprodução/Instagram: @plcampos3]

Paulo Campos afirma que o maior legado da ida do Luxemburgo para o Real Madrid foi mostrar ao brasileiro que esse sonho era possível. “O Brasil tem um futebol impressionante. Hoje, temos treinadores europeus trabalhando aqui, e isso é uma grande conquista. O legado do Vanderlei foi abrir portas para que outros treinadores brasileiros também fossem para a Europa. Isso não tem preço”, diz.

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