Por Maria Beatriz Barros
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Este filme faz parte da 39ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo. Para conferir a programação completa clique aqui
Acho que todas as histórias são, de alguma maneira, universais.
– Rúnar Rúnarsson
Quando sua mãe muda para a África, Ari (Atli Oskar Fjalarsson), um típico adolescente de 16 anos, é obrigado a deixar Reykjavíc para morar com o pai, em um vilarejo de pescadores rodeado de montanhas, no norte da Islândia. O cenário estonteante, combinado com bem colocadas reviravoltas, situações problemáticas de necessária discussão e com a sensibilidade do diretor Rúnar Rúnarsson tira Pardais (Sparrows, 2015), a princípio só mais um drama familiar, da zona do clichê.
A relação entre pai e filho não é das melhores. Gunnar (Ingvar E. Sigurosoon), desde o divórcio, foi bastante omisso em relação a sua família. Enquanto Ari ficou sob os cuidados da mãe na movimentada capital da Terra do Fogo, o pai vivia um tipo de adolescência tardia em Westfjords, sempre bêbado em meio a festas e mulheres, as custas de sua mãe (Kristbjorg Kjelt), que mora na casa ao lado. Tal comportamento não muda com a presença do filho, cujo único conforto passa ser a avó e seu amor pelo canto lírico, para o qual mostra talento em três cenas musicais memoráveis.
Enquanto espera o início do ano letivo, Ari trabalha em uma fábrica de peixes. Lá, ele faz amizade com Bassi (Valgeir Skagfjord), e seu chefe e companheiro de trabalho Tomislav (Rade Serbedzija), que parece ser o único a entender um pouco o drama vivido pelo garoto. Perambulando pelo vilarejo, o menino reencontra amigos de infância definitivamente mudados. Entre eles, Lara (Rakel Björk Björnsdóttir), por quem desenvolve sentimentos, apesar de ela estar namorando o metido a valentão Einar (Benedikt Benediktsson).
Como em muitos dramas adolescentes, a vida de Ari passa por grandes mudanças, e vemos que o garoto transforma-se em um jovem adulto. Apesar de uma trajetória conhecida, alguns acontecimentos ressaltam a dureza da vida da sociedade machista. Por exemplo, a relação travada entre Ari e Lara nos momentos finais do filme, é comovente, ao mesmo tempo que deprimente, senão assustadora. Também, quando uma mulher mais velha tem relações sexuais com Ari, ficamos em dúvida se o ato foi mesmo consensual, ou se não foi uma espécie de estupro.
O cenário também é crucial na construção do enredo. “Tudo que se vê no cenário conta a história”, diz o diretor Rúnar Rúnarsson em entrevista após a exibição do filme na 39ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo. Segundo ele, a fotografia do filme foi montada sob tons claros, o que não acontece muito hoje em dia, na era da televisão, quando tudo tem que ser o mais chamativo possível. A intenção era transmitir a sensação de solidão, quase claustrofóbica sentida por quem habitava a locação, um “realismo poético”, afirma.
Ari é diminuído perante as montanhas que cercam a cidade, bem como seus sentimentos e angústias. O cenário natural também ajudar a afirmar a solidão do garoto, enclausurado entre o verde. É curioso também que, por se tratar do verão, o sol nunca se põe no vilarejo, o que contribuí para a sensação de que o tempo não passa, logo, as injúrias parecem mais duradouras.
Pardais (Sparrows, 2015) recebeu o prêmio máximo na 63ª edição do Festival de Cinema de San Sebastian, na Espanha, a Concha de Ouro. Além disso, é também o escolhido da Islândia para concorrer a uma vaga no Oscar de 2016.
Confira o trailer: